Foi a primeira vez que a população brasileira foi às urnas para decidir sobre a criação de um Estado. A derrota da proposta separatista foi anunciada pouco mais de duas horas depois do fim do plebiscito, por volta das 19h no horário local, uma hora a menos que Brasília.
A maioria dos eleitores do Pará rejeitou a divisão do Estado para a criação dos Estados de Carajás e Tapajós, em plebiscito realizado neste domingo. Com 100% dos votos apurados, 66,60% dos eleitores votaram contra a divisão estadual e 33,40% a favor. A abstenção foi de 25,71%, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Votos em branco somaram 0,41% dos votos e nulos 1,05%.
Na capital paraense, 94,87% votaram contra a criação de Carajás e 92,92% contra Tapajós, de acordo com os dados disponíveis até as 23h24, quando haviam sido apuradas 99,96%. Em Belém, a abstenção foi de 19,22%
Nas cidades que seriam as capitais dos novos Estados, o resultado foi o oposto: quase todos os eleitores votaram pela criação das duas unidades federativas. Em Santarém, cidade prevista para ser a capital do Tapajós, a apuração foi finalizada com 98,63% dos votos favoráveis à criação de Tapajós e 96,95%, à de Carajás. A abstenção foi de 21,79%.
Em Marabá, que seria a capital de Carajás, 93,28% aprovaram a criação de Tapajós e 93,26% votaram a favor de Carajás. A abstenção foi de 25,10%, segundo os dados divulgados até as 23h24, quando 70,5% das urnas haviam sido apuradas na cidade.
De acordo com o presidente do TSE, ministro Ricardo Lewandowski, não houve nenhum incidente e nenhuma prisão durante o plebiscito. Para o ministro, o sistema eleitoral brasileiro chegou perto da "perfeição" na consulta popular. " De 18 mil urnas, tivemos problemas em apenas 28. Não tivemos nenhum voto em papel", disse. Apesar de não haver tumultos, houve apreensão de materiais ilegais de campanha em Belém, das duas frentes. O caso deve ser investigado pela Polícia Federal.
O índice de abstenção, de um quarto do eleitorado, está "dentro da normalidade", segundo o presidente do TSE. Na eleição de 2010, o índice foi de 21,17% no Estado no primeiro turno. Segundo o ministro Lewandowski, a média nacional na eleição presidencial passada foi de 20%.
O presidente da frente contrária à criação de Carajás, deputado federal Zenaldo Coutinho (PSDB), disse que o resultado "foi o melhor possível". "Isso confirma o desejo de manter o Pará unido", afirmou.
Os projetos de criação de Carajás e Tapajós previam que o Pará remanescente ficasse com apenas 17% do território e 64% da população. Nos dois novos Estados ficariam concentradas as riquezas paraenses. A região do que seria o Estado de Carajás, ao sul, tem a maior reserva de ferro do mundo, os principais investimentos da Vale, o maior rebanho de gado do Estado e a hidrelétrica de Tucuruí. Já em Tapajós, a oeste, estão a obra da hidrelétrica de Belo Monte, grandes áreas de vegetação nativa preservadas e um porto, usado para o escoamento de grãos do Centro-Oeste para a Europa. O solo dessa região também é rico em minérios.
Derrotado, o presidente da frente pró-Carajás, deputado estadual João Salame (PPS), disse que o resultado era previsível, mas afirmou que os mais de 1,17 milhão de votos pela divisão estadual "não podem ser desprezados". "Temos o compromisso de continuar essa luta", afirmou. "Estamos convencidos de que o Estado não tem como dar conta das demandas da sociedade", disse Salame.
A derrota nas urnas enterra a proposta de divisão do Estado, mas não acaba com as desavenças entre a população do interior e da capital. O governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), contrário à divisão, disse ter preocupação com a possível animosidade da população do interior separatista. "É meu objeto de preocupação. Sempre me preocupei não com o plebiscito, mas com o dia seguinte", comentou na noite deste domingo.
Jatene disse também que não pretende mudar as ações de seu governo para reforçar o atendimento ao interior. "Não se trata de inventar a roda, mas sim de intensificar as ações. Mesmo se todos os recursos forem investidos em uma só região as chances de superar os limites impostos de desigualdade são muito pequenas", disse o governador. "Não vamos mudar tudo por causa do plebiscito."
Para o presidente do TSE, a experiência do plebiscito pode se repetir com mais frequência. Nas próximas eleições, segundo Lewandowski, a Justiça Eleitoral já teria condições de combinar a escolha dos candidatos majoritários e um plebiscito sobre a reforma política, por exemplo. O ministro afirmou que o "ideal" seria fazer o plebiscito sempre com as eleições majoritárias para "baratear o processo".
(Valor Econômico)
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