Deborah Moreira
Comunicação SEESP
Plano São Paulo do governo estadual, teve início a flexibilização da quarentena paulista e o retorno ao trabalho, desde a semana passada, em alguns setores, como o comércio, nas localidades que deixaram a classificação de fase vermelha (mais crítica) para laranja (com menos restrições). Nessa segunda categoria, foi enquadrada a cidade de São Paulo, onde um aspecto fundamental é o transporte público, considerado um dos principais locais de contágio.
Com o anúncio do
Assim, o problema da superlotação nos coletivos voltou a ser objeto de discussão e acendeu o sinal vermelho no setor, que coleciona antigos problemas de infraestrutura. O SEESP ouviu especialistas para saber se as medidas tomadas pelas administrações públicas garantem condições sanitárias e de distanciamento entre os usuários.
A preocupação se acirra diante dos números de casos e óbitos registrados que crescem a cada dia. Nesta quarta-feira (17/6), pelo segundo dia consecutivo, o Estado registrou recorde no número de óbitos por Covid-19 - 389 -, chegando a 11.521 mortes e 191 mil casos confirmados.
Para reduzir o número de pessoas nos ônibus, a Prefeitura Municipal de São Paulo (PMSP), em conjunto com o Governo do Estado e associações de comércio, determinou um escalonamento de horário das jornadas de trabalho, além de que os ônibus realizem viagens com lotação de banco, sem passageiros em pé. O que não surtiu muito efeito, principalmente na periferia, onde os veículos são menores. O fato acabou levando à demissão do secretário de Transportes, Edson Caram, na sexta-feira (12/6).
Segundo o Boletim Diário de Mobilidade e Transportes do município, desde segunda-feira (15/6), 1,3 milhão de pessoas estão sendo transportadas diariamente em 11.828 ônibus - 92,31% da frota. O número apresentado pelas empresas é maior, pouco menos de 3 milhões de passageiros por dia. Elas afirmam que houve queda de 50% da lotação plena registrada antes da pandemia, que era de 6 milhões, realizando cerca de 9 milhões de viagens.
“Quando a Prefeitura diz que quer que circule com lotação de banco, isso reduz a oferta de transporte em 60%. Se esse for o modelo daqui para a frente, terá que haver um redimensionamento da frota, e o total de 12.800 veículos deverá subir. Se for lotação plena, deverá subir para 21 mil ônibus”, detalhou Francisco Christovam, assessor especial do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss).
Ele informa que, na lotação plena, a oferta é de 1 milhão e 60 mil lugares. Só com lotação de banco, cai para 417 mil lugares. Um ônibus articulado de 23 metros, um dos maiores em circulação, leva 174 passageiros, sendo 54 sentados e 120 em pé.
Com a pandemia, tanto os trens da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) quanto os da Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) tiveram uma queda de pelo menos 70% no número de passageiros transportados. Segundo o Governo do Estado, nos horários de pico a oferta de trens chega a 100% em algumas linhas para manter a meta de até duas pessoas por metro quadrado.
Uma resolução da Secretaria dos Transportes Metropolitanos, publicada na terça-feira (16/6), determina que o sistema de transporte público de trens e ônibus das Regiões Metropolitanas do Estado de São Paulo deverá disponibilizar toda a frota necessária ao atendimento da demanda, podendo chegar a 100% da capacidade total da operação para contribuir com as medidas de enfrentamento à pandemia.
Higienização
Já a higienização vem sendo intensificada tanto nas estações, banheiros, quanto nos vagões. Na CPTM, além das limpezas feitas no encerramento da operação, os trens também são higienizados no final de cada ponta da linha. O Metrô conta com 1.600 funcionários por dia espalhados em 62 estações e quatro pátios, que incorporaram novos produtos de limpeza como álcool 70% e uma solução composta por quaternário de amônia, que tem ação residual de duas horas. Entre cada viagem, é realizada a higienização dos vagões, entre 9h e 16h, e ao final do dia. A cabine também passa por uma limpeza a cada troca de operador.
Mais recentemente, nas duas empresas metroferroviárias foi testada a esterilização com raios ultravioletas e com um robô que pulveriza uma névoa com minúsculas gotículas ionizadas de desinfetantes. A solução sanitizante usada nesse sistema higieniza e elimina micro-organismos e partículas em suspensão, como bactérias, germes e vírus. O equipamento foi doado pela empresa BioGuard, e o robô leva oito minutos para limpar cada vagão.
“Muitas das novas medidas começaram a ser usadas na CPTM primeiro, como a solução de quaternário e o robô, que já vem sendo usado nos trens há alguns dias”, explica o engenheiro eletricista Antonio Marcio Barros Silva, gerente de operações do Metrô.
Outra novidade são os túneis sanitizantes nas linhas 11-Coral e 12-Safira, além das estações Tatuapé, Vila Olímpia, Paraíso, Sé e Itaquera. Em breve, outras 21 estações receberão as instalações que são uma espécie de cabine, com cerca de três metros, em que um sensor é acionado quando uma pessoa passa, acionando borrifadores com clorexidina, solução hidroalcoólica que higieniza as roupas, sendo muito mais eficaz que o álcool.
Segundo a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU), as operadoras das linhas de ônibus intermunicipais intensificaram a limpeza dos veículos nas garagens e ampliaram a higienização no término das viagens. Os funcionários encarregados da tarefa receberam roupas especiais de proteção e estão usando produtos considerados mais eficazes que os utilizados anteriormente. Aos motoristas foram distribuídas máscaras de proteção e álcool em gel.
Falhas de infraestrutura em evidência
Especialistas ouvidos lembram que as medidas na Capital são as mesmas adotadas em todo o mundo, que seguem orientações das autoridades da saúde. Para os dirigentes do SEESP, a pandemia evidencia as falhas de infraestrutura que a cidade já tinha.
Uma das soluções apontadas é a criação de novas centralidades, com investimento no desenvolvimento das regiões periféricas, abrindo postos de trabalho mais próximos aos bairros com maior densidade demográfica. “Sempre defendemos no sindicato que o planejamento de uso e ocupação do solo deve estar conectado com o plano de mobilidade. Isso é uma falha na nossa infraestrutura, que a pandemia está evidenciando”, afirma Edilson Reis, diretor do SEESP, que atua na área do transporte municipal de ônibus da capital paulista há cerca de 40 anos.
Ele lembra que os compartimentos fechados do ônibus, do metrô e do trem são similares aos ambientes hospitalares, incluindo o uso de ar-condicionado também nos ônibus, reivindicação atendida nos últimos anos, mas que agora, com os riscos de contaminação, se tornou um problema para usuários e tripulação: “O transporte público só perde para o ambiente hospitalar como local de maior transmissão do vírus. Lembrando também que a tripulação do ônibus é a segunda categoria profissional com maior probabilidade de contrair”, completa Reis.
Outro diretor do sindicato, Emiliano Stanislau Affonso, lembra que a crise pode ser uma oportunidade para colocar em prática as novas centralidades. Para ele, a pandemia vai mudar completamente a visão sobre mobilidade, e erros do passado poderão ser corrigidos.
“Quando planejamos a Linha 3-Vermelha do Metrô, que chega a ter dez passageiros por metro quadrado, programamos com seis passageiros por metro quadrado. A Europa planeja com quatro. Agora, na pandemia, estamos tentando segurar dois”, comenta.
Para Affonso, além do uso e ocupação do solo, citado por Reis, a receita para alcançar sustentabilidade no transporte passa por outros três passos: priorizar o sistema público, adotar políticas de circulação e controle de veículos (estacionados e em movimento) e gerar novas fontes de receita a partir do desenvolvimento local criado pelo próprio transporte público a partir das novas centralidades.
“Ao distribuir melhor o fluxo da rede, têm-se viagens menores. Atualmente, em todo o mundo, 80% dos recursos vêm de outras fontes de arrecadação, como comércio local”, acrescenta Affonso.
Ele observa que a crise está acelerando a chamada Revolução 4.0, com teletrabalho e intensificação do sistema de entrega em domicílio, o que reduz o número de passageiros ainda mais. Antes da pandemia, o sistema já vinha sofrendo queda na arrecadação, com a popularização dos serviços de aplicativos de transporte.
Já o consultor da SPUrbanuss acrescenta que para alcançar saúde, educação e segurança de qualidade, será preciso investir no sistema viário e repensar políticas que priorizem o uso do transporte coletivo, como a criação de taxas sobre o combustível ou mesmo a taxação do transporte individual, o chamado pedágio urbano adotado em muitos países desenvolvidos. “O que falta para São Paulo é infraestrutura. Não adianta duplicar ou triplicar a frota que ela vai ficar parada no congestionamento. E a pandemia deu uma grande oportunidade para as autoridades reconhecerem que sem o transporte não se viabilizam outros serviços com qualidade, como educação, saúde e segurança”, pondera Christovam.
Ele lembra que nas últimas gestões municipais quase nada foi feito. Dos 17 mil quilômetros de vias da cidade, os ônibus circulam em 4.500 quilômetros. Destes, apenas 500 são faixas exclusivas e 130 são corredores. Além de ampliar essa estrutura, ele cita o uso de tecnologias como semáforos inteligentes que priorizem os ônibus para que, com a mesma frota, sejam feitas mais viagens, proporcionando mais lugares sentados.
Sustentabilidade
Um dos investimentos de peso feito na Capital nos últimos anos foi a implantação de quase 500 quilômetros de ciclovias, o que equivale a 2,6% dos 17 mil quilômetros do viário da cidade. Mas ainda é insuficiente para receber um número maior de usuários do sistema tradicional.
“Deveríamos aproveitar este momento, com menos passageiros, para criar mais faixas exclusivas de ônibus, mais corredores e mais ciclovias, com campanhas para incentivar o uso de bicicletas, recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como o transporte mais seguro neste momento”, explica Sergio Avelleda, diretor da WRI Ross Center for Sustainable Cities, organização não governamental nos Estados Unidos, onde mora atualmente.
Avelleda, que foi secretário municipal de Mobilidade e Transportes na gestão João Doria e presidente do Metrô durante o governo de Geraldo Alckmin, acrescenta que as cidades europeias que já retornaram com atividades econômicas, como França, Inglaterra e Itália estão investindo maciçamente em ciclovias: “Além da construção de mais faixas exclusivas, a França está dando dinheiro para as pessoas comprarem bicicletas novas ou consertarem suas antigas e também está dando dinheiro na mão do usuário que for trabalhar de bicicleta.”
O diretor do SEESP, José Augusto de Moraes, que atua na CPTM, lamenta o sucateamento das ferrovias que poderiam contribuir com a sustentabilidade das cidades, inclusive do ponto de vista ambiental: “Estamos na contramão do mundo, que evoluiu muito em termos de mobilidade, com ferrovias modernas. Nós ficamos aqui cuidando de uma estrada de ferrovia feita por ingleses, em 1867.”
Ele lembra que é preciso redobrar os cuidados com higiene nos vagões, que levam pessoas que trafegam entre as diversas cidades da Grande São Paulo. “A ferrovia é um dos vetores que mais contamina a população. Se hoje temos varias cidades do Estado com o vírus é porque ele foi levado pelas pessoas que estão usando o trem”, completa o engenheiro de manutenção, que acompanha com preocupação a reabertura das atividades. “Temos que estar atentos às medidas de higienização para o transporte seguro de passageiros”, reitera.
O que o usuário pode e deve fazer
- usar máscara e álcool gel 70%;
- Manter uma distância segura de pelo menos um metro de outras pessoas, sempre que isso for possível;
- Não tocar nos olhos, nariz e boca com as mãos não lavadas;
- Cobrir boca e nariz ao tossir ou espirrar com o braço, nunca com as mãos;
- Evitar conversar com outras pessoas no transporte;
-Evitar usar o celular ou outros objetos que possam se contaminar no ambiente;
- Limpar com álcool objetos tocados frequentemente nesses meios.