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14/12/2022

Um profissional fundamental ao planejamento e gestão sustentáveis da atividade pesqueira

Soraya Misleh/Comunicação SEESP

 

No País cuja extensão aproximada da costa litorânea é de 8.500km, e um a cada 200 brasileiros é pescador, ganha absoluta relevância uma profissão: Engenharia de Pesca. Os dados são da Associação Rare do Brasil, organização não governamental que atua na promoção sustentável do setor de pesca artesanal, responsável por mais da metade da produção nacional, que concentra a maioria dos que vivem da atividade (90%).

 

A profissão se mostra fundamental para que se cumpram prioridades definidas pela Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), que designou 2022 como o “Ano Internacional da Pesca e a Aquicultura Artesanais”. A resolução aprovada endossa a “transformação azul” concebida como marco estratégico à sustentabilidade no setor pela agência da ONU para a alimentação e a agricultura (FAO) para 2022-2031.

 

Jadson Pinheiro Santos, engenheiro de pesca. Fotos: Acervo pessoal 

Seus pilares consistem na “ampliação da aquicultura, melhora da ordenação pesqueira e inovação das cadeias produtivas”. Assim, a “transformação azul” propugna por se “colocar em marcha ou acelerar nos próximos anos medidas ousadas e orientadas ao futuro”, em consonância com a Agenda 2030 da ONU, ao que estão elencados 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

 

Diante desses desafios e da potencialidade do País, abrem-se oportunidades ao engenheiro de pesca, cuja data comemorativa é 14 de dezembro. Instituída no calendário oficial pela Lei 12.820/2013 em alusão ao dia da colação de grau da primeira turma do Brasil, no ano de 1974, a homenagem abarca hoje apenas 2.136 profissionais da área, dos quais 1.489 homens e 647 mulheres, conforme estatísticas do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea). No Estado de São Paulo, são somente 25 engenheiros de pesca, sendo 18 do gênero masculino e sete, feminino.

 

 

Conforme descrito no Mapa da Profissão elaborado pela área de Oportunidades na Engenharia do SEESP, o “Conselho Federal de Educação publicou a Resolução nº 1, de 17 de março de 1982, estabelecendo o currículo dos diplomados em Engenharia de Pesca. A partir disso, o Confea aprovou a Resolução nº 279, de 15 de junho de 1983, onde discrimina as atividades desses profissionais referentes ao aproveitamento dos recursos naturais aquícolas, à cultura e utilização da riqueza biológica dos mares, ambientes estuarinos, lagos e cursos d'água; à pesca e ao beneficiamento do pescado, seus serviços afins e correlatos. O art. 2º da resolução estabelece que os engenheiros de pesca integrarão o grupo ou categoria da Agronomia [...].”

 

Esses profissionais são responsáveis, ainda segundo o Mapa da Profissão, por planejar, coordenar, executar e fiscalizar “atividades agrossilvipecuárias e o uso de recursos naturais renováveis e ambientais”. Além disso, suas atribuições incluem a promoção da extensão rural, orientando produtores nos vários aspectos dessas atividades e elaboração de documentação técnica e científica. “Podem prestar assistência e consultoria técnicas”, aponta o levantamento.

 

 

Em celebração ao Dia Nacional do Engenheiro de Pesca, o SEESP entrevistou Jadson Pinheiro Santos, professor da graduação na Universidade Estadual do Maranhão (Uema), formado na modalidade em 2011, mestre em Biotecnologia em Recursos Naturais e doutorando em Biodiversidade e Biotecnologia.

 

Ao falar sobre sua trajetória, áreas de atuação, mercado de trabalho e perspectivas, ele é enfático em colocar a sustentabilidade no centro da profissão. Confira a seguir:

 

O que o levou a escolher a profissão de engenheiro de pesca?

Minha ligação com a Engenharia de Pesca vem desde a infância. Um dos meus irmãos sempre gostou muito de aquarismo, e um tio trabalhava na estação de piscicultura da Codevasf [Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba], que faz o repovoamento de rios. Nasci em Aracaju e passava as férias na cidade de Propriá, em Sergipe, onde a família é originária. Meu tio me levava ao seu trabalho e sempre me interessei pela logística de manter os peixes vivos e repovoar. Cresci com aquilo na cabeça, e a curiosidade de trabalhar com peixes chamou mais minha atenção, acabei optando pelo curso de Engenharia de Pesca na Universidade Federal de Sergipe (UFS). Me formei em janeiro de 2011 e logo em seguida entrei no mestrado em Biotecnologia em Recursos Naturais. Desde 2017 sou docente no curso de graduação da Uema.

 

 

Conte um pouco sobre sua trajetória profissional.

Em 2013, passei a trabalhar como supervisor técnico do projeto de monitoramento participativo do desembarque pesqueiro na costa de Sergipe e extremo norte da Bahia da Fundação de Apoio à Pesquisa e Extensão de Sergipe (Fapese), financiado pela Petrobras por conta de exigência do Ibama [Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis], como condicionante para a continuidade do processo de exploração de petróleo e gás na região. Em seguida, migrei para o Ministério da Pesca, sendo superintendente regional e atuando na avaliação da aplicabilidade do Plano Safra da Pesca e da Aquicultura [linha de crédito para o setor], onde fiquei até 2014. Em janeiro de 2015 retornei ao projeto da Fapese, ficando até 2016. Passei no concurso público da Uema e em 2017 assumi como docente.

 

Quais as áreas de atuação ao Engenheiro de Pesca?

Este é o único curso multidisciplinar, que une engenharia e ciências agrárias, ou seja, tanto a parte de cálculos e estrutura quanto manejo de espécies e beneficiamento do pescado. A Engenharia de Pesca está inserida dentro dessa cadeia produtiva, garantindo mais qualificação. Além do trabalho na atividade, o profissional pode atuar no estudo e dinâmica da população pesqueira, na aquicultura com cultivo de ampla gama de espécies como camarões, ostras, piscicultura, no beneficiamento ou processamento, que abrange cortes, manipulação e preparação do prato, no uso de maquinário para o processamento da carne de pescado, na projeção de unidades de beneficiamento ou entrepostos pesqueiros, na capacitação, na assistência técnica e gerencial principalmente a pequenos produtores, assim como na consultoria. Tem também trabalho em outras entidades e em secretarias municipais. E também em instituições de ensino e pesquisa, técnicas federais e universidades públicas. Hoje há aproximadamente 25 cursos no Brasil, a maioria no Nordeste, só um em universidade particular. O mercado de trabalho varia de acordo com a região. No Maranhão e Pará, por exemplo, o crescimento se dá na aquicultura, principalmente piscicultura.

 

 

Quais as oportunidades e perspectivas ao profissional da área?

É uma profissão ainda em ascensão e um pouco desconhecida. O engenheiro de pesca é o profissional mais qualificado ao conhecer todas as etapas do sistema produtivo. Existe demanda do setor pesqueiro ao processamento. Diversos engenheiros de pesca estão sendo contratados pelo Senar [Serviço Nacional de Aprendizagem Rural] para atuar na assistência técnica e gerencial a pequenos produtores de várias regiões. Oportunidades podem também ser criadas, com vagas novas, uma vez que muitas prefeituras não têm profissional qualificado na área, e o engenheiro de pesca garante otimização e melhoria do sistema produtivo pesqueiro. Pode atuar como consultor, na elaboração de projetos, licenciamento ambiental, estrutura de cultivo. A produção a partir da pesca artesanal constitui a maior parte do mercado, mas não tem crescido. O cultivo (aquicultura) é a principal área ao engenheiro de pesca, no sistema de produção, com trabalho voltado a suprir as necessidades de proteína animal, em meio à demanda por alimentos de qualidade e redução de impactos ambientais. A sustentabilidade está no centro da nossa atividade. Por exemplo, tem o período do defeso [em que as atividades são vetadas ou controladas, por conta da reprodução das espécies], o qual tem flutuado, e o engenheiro de pesca é o mais capacitado para buscar as melhores alternativas, na gestão municipal, estadual, federal. Tem também mercado junto à pesca industrial, por exemplo vinculada a atuns no Sul e uma pequena parte no Norte, além de Sudeste.

 

A flutuação no período de defeso está vinculada às mudanças climáticas? Qual a importância do engenheiro de pesca em meio a esse cenário?

Com certeza. Os seres respondem de acordo com o ambiente. Algumas espécies têm tido a reprodução antes do tempo previsto, amadurecem muito antes, já que os indivíduos maiores [que se alimentam desses peixes e dependem deles] estão sendo capturados ao extremo. É uma reação em cadeia, a partir da alteração ambiental. O trabalho do engenheiro de pesca no sistema de cultivo com sustentabilidade é uma forma de reduzir a pressão sobre os estoques naturais. Pode ter atuação importante em entidades representativas e colônias de pescadores, na conscientização e no planejamento de estoque pesqueiro.

 

 

Quais as recomendações ao profissional para que garanta diferencial ao mercado de trabalho?

Há diversos cursos complementares, práticos e teóricos. O engenheiro de pesca precisa conhecer a legislação profissional e ambiental em cada região e atividade, acompanhar os ajustes. Também obter aprofundamento tecnológico, no sistema de gerenciamento e de informatização. Existem empresas que estão mecanizando o sistema produtivo, tem geotecnologia via satélites e drones. A busca de novas tecnologias é um diferencial muito grande para o mercado, o conhecimento técnico torna o profissional quase único. Além disso, conhecer outro idioma abre muitas oportunidades fora do Brasil, já que há uma internacionalização dos sistemas pesqueiros. Sou diretor de assuntos trabalhistas da Federação Nacional dos Engenheiros de Pesca do Brasil, e nosso próximo congresso brasileiro acontece em Porto de Galinhas [PE], em agosto de 2023. Estamos discutindo atualização e alternativas para abertura de mercado de trabalho. Também sou membro de núcleos de pesquisa e ensino para sugerir ajustes nos cursos [sob essa perspectiva]. O profissional pode suprir as necessidades em determinados órgãos ou instituições públicas, estamos atentos e buscando formas de inserir vagas ao engenheiro de pesca em concursos.

 

Clique aqui e conheça mais sobre a profissão no Guia das Engenharias do SEESP (páginas 78 a 81)

 

 

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