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28/03/2012

Educação superior e inovação tecnológica nos Estados Unidos

Por Reginaldo C. Moraes*

O livro de Mowery e Rosenberg (M&R), Technology and the Pursuit of Economic Growth, Cambridge University Press, 1995, traz ao leitor muitos achados e instigantes informações a respeito desse tema: a relação entre tecnologia e busca de desenvolvimento econômico. Os exemplos e relatos históricos que explora dizem respeito, sobretudo, ao sistema de inovação, pesquisa e desenvolvimento dos Estados Unidos. Contudo, são muito sugestivos para quem quer avaliar os caminhos que se abrem para os chamados países em desenvolvimento, ou emergentes.

Uma das inferências do estudo de M&R, a partir desse balanço histórico, é que um grande número de atividades essenciais para a conquista do desenvolvimento depende do que chamam de “capacitação básica de pesquisa, mesmo quando esta capacitação não desempenha papel direto na resolução de problemas industriais”. É desta capacitação que dependem outras, mais diretas e pragmáticas, como a de identificar situações e objetos para pesquisas aplicadas. Ou para avaliar os resultados e implicações de tais pesquisas aplicadas, inclusive para monitorar e avaliar investigações conduzidas por terceiros. Desse modo, uma firma que “compra” pesquisa precisa ter, internamente, gente capacitada para formular ao pesquisador-fornecedor aquilo que pretende ter, bem como para avaliar os resultados do que lhe é entregue.

Mas isto não vale apenas nesse nível micro-econômico, o nível da empresa. Vale também para países. M&R citam estudo de Caves e Uekusa (1976), notando que as “firmas japonesas investiram pesadamente em pesquisa, no pós-guerra, como um meio de absorver ou modificar tecnologias vindas de fontes externas”. Só assim podiam identificar o que estava disponível na ‘prateleira’ das ofertas tecno-científicas, escolher o que era mais adequado ao caso em tela e, em seguida, proceder às adaptações necessárias.

Olhando atentamente para o caso norte-americano, M&R localizam um fator-chave para o sucesso: um sistema de educação superior descentralizado, diversificado e com um forte componente vocacional, ao lado das universidades de pesquisa. Repare nos dois extremos do sistema, altamente hierarquizado: um deles, as 100 universidades de pesquisa, que concentram 70% dos doutorados e das verbas de pesquisa; o outro extremo, uma rede extensa de ‘community colleges’, escolas de nível superior com cursos de dois anos, primeira porta (porta aberta, sem vestibular) para o ingresso nesse mundo. No meio, um grande contingente de colleges mais sofisticados e universidades estaduais, com grande carga de ensino de graduação, profissional e mestrados e especializações profissionais.

A capacidade de responder a necessidades dos negócios e da indústria, em especial, não estava apenas confinado ao lado-pesquisa desse sistema de ensino. O alto grau de acessibilidade teve um papel fundamental. Uma iniciativa inovadora já se notava na relação do ensino superior com a agricultura, através dos land-grant colleges e das estações experimentais, no século XIX. E se prolongava com a mulplicação de descolas superiores voltadas à formação de professores (teachers colleges), os junior colleges e as instituições locais e estaduais que democratizavam e capilarizavam o acesso.

M&R destacam que a “crescente utilização dos métodos e conhecimentos científicos na indústria era amplamente acelerada por uma expansão de pessoal tecnicamente treinado – especialmente engenheiros1. M&R reconhecem que o treinamento desses engenheiros “era com frequência de natureza elementar e não preparava os engenheiros para trabalhar na fronteira da ciência”. Mas asseveram que este era o tipo de conhecimento necessário ao aparato industrial em expansão, e não apenas a ‘frontier science”.

Os engenheiros são vistos, por M&R, como “mensageiros” ou “portadores” do conhecimento científico, de modo que o número de pessoas lidando com conhecimentos e métodos científicos, nas atividades produtivas, era bem maior do que aquilo que a sociedade costumava rotular de “cientistas”. E não foi apenas o investimento público (federal, estadual, local) em pesquisa, notadamente nas universidades e laboratórios nacionais, que produziu essa decolagem. Depois da Segunda Guerra Mundial, o governo federal lançou grande número de programas para ampliar e mesmo massificar o ensino superior. A começar pela legislação apelida de GI Bill, que apoiava significativamente o ingresso (e permanência) dos militaresn desmobilizados em programas de nível superior. O programa inflou as escolas – a ponto de, no final dos anos 1940, cerca de metade dos estudantes de ensino superior ser constituído de beneficiários dessa ajuda2. Outros programas vitaminaram os cursos de pós-graduação e formação profissional. A Comissão de Energia Atômica (que depois seria absorvida pelo novo Depto. de Energia) e a National Science Foundation financiaram bolsas de pós-graduação. O National Institutes of Health lançava programas de treinamento e especialização, a cada vez que se criava um novo instituto. Quando os norte-americanos foram surpreendidos pelo Sputnik, reagiram, um tanto assustados, com o National Defense Education Act, ampliando o apoio federal à educação em ciências e engenharia.

(*) Reginaldo C. Moraes é professor da Unicamp e do INCT/Ineu (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos)


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