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25/03/2013

O Brasil é o país do futuro das transformações urbanas

Wigley-MarkdentroNova York está acabada, sentencia Mark Wigley [foto ao lado]. Um dos principais pensadores do futuro das cidades, o arquiteto neozelandês e diretor da Escola de Arquitetura, Planejamento e Preservação da Universidade de Columbia defende que a cidade americana onde mora e que por muito tempo foi o centro do mundo é hoje como o seu avô: “Você o ama, ele é cheio de sabedoria, mas não é o futuro”.

Para Wigley, curador da histórica exposição “Deconstructivist architecture”, em 1988 (leia mais aqui), é na América Latina, mais precisamente no Brasil, que residem as grandes transformações urbanas.

É por isso que há pelo menos uma década Wigley vem com frequência ao Rio. Nesta semana, passou pela cidade para visitar o Studio-X, braço da escola de Columbia que ele fundou na Praça Tiradentes há dois anos. Lá, arquitetos do mundo inteiro e outros profissionais são convidados a discutir o que é a cidade do futuro. Wigley também se reuniu com o governador Sérgio Cabral e seguiria para São Paulo, onde planeja criar um laboratório do Studio-X.

A rede de arquitetos, projeto que inventou em 2008, começou em Nova York, depois foi a Pequim, Amã, Mumbai, Rio e, neste ano, inaugura sedes em Joanesburgo, Istambul e Moscou. A filial carioca, porém, é a que ele considera a mais vibrante. Em entrevista ao GLOBO, Wigley falou das diferenças entre Rio e São Paulo — comparando-as a um casal antigo, que conhece as fraquezas do companheiro —, disse que as duas serão uma só, numa das megalópoles que o mundo verá surgir até 2050, e que o grande desafio será lidar com as pessoas mais velhas.

O senhor é um dos grandes pensadores do futuro das cidades. O que já concluiu?
O futuro das cidades não está na Europa ou nos Estados Unidos, mas na América Latina, no Leste Asiático, no Oriente Médio e na África. As grandes cidades se transformaram em laboratórios de mudanças. Em 2050, teremos 7 bilhões de pessoas vivendo em cidades, 9,3 bilhões ao todo no mundo. Estamos falando de algo daqui a duas gerações, a cidade dos nossos netos. E ninguém sabe o que isso significa. É o maior experimento da história da Humanidade.

Foi por isso que Columbia veio ao Rio?
Se quero entender o que está acontecendo nas cidades, preciso estar na América Latina. Em qual país? Que país vive sonho e realidade? o Brasil. Mas Rio ou São Paulo? Não tinha certeza, mas acreditava no Rio. Não posso esquecer São Paulo, é claro. Como esquecer uma cidade de 20 milhões de pessoas (número de habitantes da região metropolitana)? De qualquer forma, Rio e São Paulo vão em breve ser uma cidade só, uma única megalópole. Estando no Rio, podemos pensar em São Paulo. Se tivesse instalado o Studio-X em São Paulo, será que poderíamos pensar no Rio? Acredito que não.

Por que não?
Geograficamente, o Rio é como Nova York, como Mumbai, uma cidade no limite do continente, que é sempre um lugar de trocas. E o Rio sempre foi experimental. As cidades são um tipo de organismo biológico que cresce incrivelmente rápido. Acredito, por exemplo, que sabemos melhor o que significa viver em Marte do que o que é viver em cidades. E a cidade do futuro está vindo na nossa direção rapidamente. Se quero entender isso, preciso olhar para a América Latina, para Rio, Mumbai, Pequim.

E as grandes cidades como Nova York?
Nova York está acabada. É uma cidade bonita, mas, se há cem anos era um modelo cosmopolita, de uma nova forma de vida, hoje, já não é. Nova York é agora como seu avô: você o ama, ele é cheio de sabedoria e experiência, mas ele não é o futuro. Provavelmente Mumbai e Rio são hoje para o mundo o que Nova York foi há cem, 200 anos. Mumbai parece impossível e, há cem anos, Nova York te fazia perguntar: como é possível ter tanta gente, tantos sonhos, tantos idiomas? Na América Latina, vive-se hoje esse tipo de transformação.

Quando optou pelo Rio para abrir o laboratório da Universidade de Columbia no país, já sabia da “rivalidade” entre Rio e São Paulo?
O que aprendi sobre Rio e São Paulo é que são como um casal que está junto há muito tempo. Eles podem explicar os problemas de seus parceiros muito, muito bem. Rio diz que São Paulo pensa que é o centro do universo, que tudo é dinheiro e poder. É verdade, aliás. São Paulo diz que Rio é muito praiana, tem prazer demais. É verdade também. Rio e São Paulo criticam a si mesmas, mas como um casal antigo, eles não podem imaginar a vida um sem o outro.

E o que o senhor acha sobre as duas?
Entre elas, criou-se um bom sistema. Uma (o Rio) realmente dá ênfase à criatividade, o que é típico de sua geografia. Cidades às margens da água, onde novas pessoas, novas ideias e materiais sempre chegam, são espécies de laboratórios onde novos conceitos urbanos se desenvolvem. No começo do século XX, Nova York agiu como um modelo brilhante e hiperinfluente de uma vida baseada em estruturas horizontais e verticais. Esse lugar agora é do Rio. Quando se vive no centro da Terra, como em São Paulo, você precisa criar a imagem de que você é o mundo. Acho que essa combinação de vocações de Rio e de São Paulo é ótima.

O senhor defende que as duas vão virar uma cidade só. Como isso vai ocorrer?
Sim, em 2050, provavelmente Rio e São Paulo serão uma só. Isso não é uma metáfora. Se você olhar o crescimento das duas cidades, verá que estão se aproximando. Teremos infraestrutura urbana contínua entre ambas. Esse velho casal será uma única megalópole. Nesse momento, será ainda mais incrível estar no Rio. Estaremos no centro de uma das grandes formações urbanas da Humanidade.

O que e como serão as megalópoles?
Nos últimos 50 anos, especialistas em cidades vêm discutindo o que é e quando virá essa megalópole. E ela vai se tornar uma realidade provavelmente aqui. Talvez também em partes da China, em Boston e Washington... Teremos seis ou sete espaços com 50 milhões de pessoas. Lembre-se de que hoje, na China, uma cidade de 1 milhão de pessoas em cinco anos, passa a ter 10 milhões de pessoas e, em 20, chega a 25 milhões.

Que problemas teremos nessa cidade do futuro?
Considerando que a expectativa de vida das pessoas vai em direção aos cem anos, até mesmo no Brasil, quer dizer que, em 2050, 2 bilhões de pessoas vivendo em cidades terão mais de 60 anos. Se olharmos nossas ruas, verá que não pensamos a cidade para pessoas mais velhas. Pensamos nos jovens? Também não. A cidade foi desenhada para pessoas que trabalham, para a idade de trabalho, entre 22, 25 anos até os 65 anos. Então, eu diria que questões como envelhecer e ter saúde serão mais críticas.

E como solucioná-las?
Não sabemos ainda, mas isso é estimulante. Odeio o conceito de “cidade sustentável”. É uma contradição. Quando se diz isso, é como dizer: vamos criar cidades que não causem problemas. Mas os arquitetos são treinados para ver nesses problemas oportunidades. Uma cidade é um lugar para se reclamar.

O que o senhor achou da vitória do arquiteto japonês Toyo Ito no Pritzker Prize, no último domingo?
Acredito que Ito é uma escolha maravilhosa para o prêmio. Sempre que ele faz um prédio, joga fora ideias velhas. Ele nos faz ver através de novos olhos. Ele não abandona o Modernismo, mas o reinventa. Ele nos faz pensar, e essa é a maior responsabilidade do arquiteto.


Imprensa – SEESP
Fonte: O Globo Online – 22/03/2013




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