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24/04/2014

Marco Civil influencia debates sobre governança global da internet

O Marco Civil da Internet no Brasil, aprovado e já sancionado pela presidente Dilma Rousseff, na quarta-feira (23/4), durante o “NET Mundial - Encontro Multissetorial Global Sobre o Futuro da Governança da Internet”, que ocorre em São Paulo (SP), está influenciando todos os debates sobre o futuro da rede. Na noite de quarta, no Arena NET Mundial, o engenheiro britânico Tim Berners-Lee, inventor da World Wide Web (WWW), lembrou dos riscos que corremos em um ambiente virtual onde não haja um consenso global sobre os princípios fundamentais para a rede, como está definido no Marco Civil brasileiro.


Foto: Deborah Moreira
debate arena deborah
Participantes da atividade que debateu construção de uma carta magna para a internet


"O perigo é não termos um conjunto de princípios fortes, que garantam que a Internet seja como deve ser”, declarou Berners-Lee. Ele lembrou o quanto foi difícil o processo de discussão no Brasil e que “será muito mais difícil ter essa conversa em outros países” e globalmente. No entanto, ele ressaltou que para que haja o global é preciso haver debates locais, tendo em vista que a internet não está relacionada a uma única nação. “Eu vejo a Internet como algo não-nacional”, salientou.

As declarações de um dos pais da internet foi dada durante o debate “#WEB25 Uma Carta Magna da Internet”, que reuniu outros grandes nomes: Frank La Rue, relator especial da ONU para o direito à liberdade de expressão; Demi Getschko, diretor­presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto.BR (NIC.br), membro de notório saber do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e responsável pela primeira conexão TCP/IP implantada no País; Gilberto Gil, ex-ministro da Cultura, músico e ativista pelos direitos na Internet; e o o deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ), relator do Marco Civil na Câmara, onde o projeto tramitou durante quase três anos. O debate foi mediado por Ricardo Poppi, coordenador-geral de Novas Mídias e outras Linguagens de Participação da Secretaria-Geral da Presidência da República.

“Agora, o Brasil vive uma nova fase, a das regulamentações fundamentais para o Marco Civil da Internet", declarou Frank La Rue, durante a coletiva e imprensa concedida instantes antes da atividade. Uma dessas regulamentações previstas será a lei da privacidade. De acordo com ativistas, o artigo 15 do texto aprovado pelo Senado, e sancionado por Dilma, estabelece a vigilância em massa de todos os internautas, uma vez que obriga que todos os sites e aplicativos constituídos, na forma de pessoa jurídica, retenham os dados de acesso de seus usuários (possibilitando identificar, localizar e gerenciar os dados). Um movimento chegou a ocorrer, nas redes e no primeiro dia do NET Mundial, para exigir o veto integral do artigo 15, mas a presidente da República acabou não vetando.

La Rue frisou que a luta pelo acesso à rede deve contemplar também os que ainda não têm acesso. Dados de 2013, de uma pesquisa Ibope, apontam que o Brasil possui 102,3 milhões de usuários. Ou seja, pelo menos metade da população brasileira ainda está desconectada. “A internet não pode ser um privilégio de uma minoria, pois isso acentuaria a fratura entre os ricos e pobres”, acrescentou. O relator especial da ONU destacou três características na gestão brasileira da rede: o modelo multistakeholder adotado pelo CGI.br - envolvendo governo, setor privado, sociedade civil e academia; o movimento organizado da sociedade em torno do Marco Civil; e o discurso da presidente Dilma no plenário da ONU, em 2013.
O deputado Molon também falou da importância da participação da sociedade civil na construção de diretrizes para a internet, como ocorreu durante o Marco Civil. Também lembrou da importante influência de alguns nomes durante o último período da tramitação do projeto, como do próprio Berners-Lee, que inicialmente era contra uma regulamentação da rede: “Tim disse algo que resume tudo sobre o Marco Civil, que não é só um projeto para a internet, mas sim um projeto sobre direitos humanos na rede”.

Gilberto Gil, que esteve presente no processo embrionário do Marco Civil, durante o segundo governo Lula, admitiu que pode ser um visionário. “Não por saber tudo sobre a Internet, mas porque, como poucos, eu admitia que não entendia nada! Então tive que buscar, com toda generosidade, esse conhecimento. E trouxe para dentro do governo essas questões, esse debate”, disse Gil.

Demi Getschko falou sobre a capacidade da rede de autodefesa, como em casos de censura, quando rapidamente a rede multiplica os conteúdos em páginas diversas. “Mas isso não nos isenta da importância de protegê-la contra os ataques que possam surgir. E é nesse sentido que vem o Marco Civil”, declarou Getschko.

Em suas palavras de considerações finais, Demi Getschko alertou sobre as críticas ao Marco Civil, de que ao mesmo tempo que é importante escutá-las para tornar o dispositivo legal ainda melhor, é fundamental estar atento às críticas “destrutivas”. “Existem as críticas que são destrutivas, baseadas em mentiras e cujo único objetivo é desviar-nos do nosso verdadeiro objetivo. Então, não podemos cair numa armadilha e ser pegos por uma crítica de viés. Senão a gente nem percebe e quando se dá conta está jogando o jogo errado”, disse.

Mulher e tecnologia

Renata Ávila, da fundação WebWeWant (WWW), a mesma de Tim Berners-Lee, pediu para fazer uma fala e foi convidada a se juntar aos presentes na mesa. “Como não tinha mulher nesta mesa, eu posso capturar o microfone e ocupar o espaço. Acho que a gente deve fazer sempre isso”, exclamou Ávila, chamando sua colega da fundação Anne Jellema e, instantes depois, a brasileira Julia Fonseca, do Marco Civil Já também foi chamada para equilibrar a representação de gênero na atividade.

Tanto Ávila, quanto Jellema, ressaltaram o processo de diálogo construído entre sociedade civil e governo nos últimos anos. As mulheres presentes lembraram do momento atual do México, onde os cidadãos estão ocupando as ruas para combater um projeto de lei que pretende cercear as liberdades na Internet.

A ativista nigeriana Nnenna Nwakanma, que participou ao lado de Dilma Rousseff da abertura do NET Mundial, na quarta, foi chamada à mesa. Ela lembrou que a construção de uma Carta Magna da Internet é fundamental “porque o Marco Civil[brasileiro] não é suficiente.” “Ele é ótimo para o Brasil, mas o Brasil não está sozinho. O Marco Civil é um jogo de casa, agora temos que jogar o jogo internacional”, exclamou.


Deborah Moreira
Imprensa SEESP




 

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