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09/02/2015

Estudantes não percebem tecnologia como parte do aprendizado

Alunos de classes populares ainda não veem a presença de aparelhos tecnológicos em sala de aula como parte do processo de aprendizagem. Principalmente em escolas públicas, estudantes manuseiam aparelhos celulares sem a orientação ou intervenção de seus professores, apesar da proibição de sua utilização por lei. É o que mostra pesquisa de mestrado de André Toreli Salatino, na Faculdade da Educação (FE) da USP. O pesquisador acompanhou regularmente dezenas de estudantes de uma escola pública. A ideia do trabalho foi compreender as tensões que conformam a experiência escolar contemporânea, a forma como os jovens vivenciam mundos culturais e tecnológicos distantes entre si.

Segundo o estudo, é do professor a responsabilidade de tentar criar situações de aprendizagem que incluam a utilização dos diversos aparelhos tecnológicos, já que as tecnologias não fazem nada por si mesmas. Esses jovens não mobilizam as novas tecnologias para construírem relações com os saberes escolares, em grande parte utilizam seus celulares para se ausentarem daquele mundo. O uso das tecnologias, entretanto, não poderá se tornar a finalidade de nenhuma instituição escolar, e seu uso deve ser pensado nos valores que são reforçados por meio de sua prática. Com foco no processo de aprendizagem, cabe ao professor avaliar, em sua realidade concreta, se a implementação dos aparelhos tecnológicos contribuem para que os alunos criem uma relação com o conteúdo de sua disciplina.

Durante um ano letivo, Salatino observou três turmas do ensino médio de um colégio da periferia da cidade de São Paulo, na zona leste. O acompanhamento não se deu apenas em sala de aula, mas também em outros espaços escolares, como o pátio em horário de intervalo entre as aulas e períodos de entrada e saída. Esses espaços se mostraram interessantes por também participarem do mundo de exibição produzido com esses aparelhos tecnológicos, em meio à experiência escolar desses jovens.

Metodologia
A metodologia do trabalho teve inspiração da etnografia, método utilizado pela antropologia na coleta de dados. O pesquisador tentou compreender essa cultura escolar específica a partir do significado construído pelos jovens em sua relação com celulares e aparelhos eletrônicos em geral e com a escola dos dias atuais. Essa análise se deu por intermédio de um trabalho de campo prolongado com jovens de classes populares.

Foram aplicados questionários fechados a todos os alunos presentes nas turmas, cujas respostas foram comparadas com dados estatísticos publicados por diferentes institutos internacionais que tinham por objeto a relação dos jovens com a tecnologia. Para amenizar a distância entre “aquilo que somos” e “aquilo que dizemos que somos”, buscou-se refletir sobre o que as ações desses alunos têm a dizer sobre a sociedade em que estão inseridos.

Resultado
Por mais que a cooperação entre docente e tecnologia para auxiliar no progresso do ensino seja importante, não se pode deixar iludir. Em determinadas situações, será difícil introduzir recursos tecnológicos, mesmo porque a cultura brasileira não tem a aprendizagem como valor. Grande parte dos estudantes de classes populares não compreende o ensino em instituições escolares como meio de ascensão social. Muitos, aliás, observam a promessa da escola como ilusão, pela própria experiência com pessoas que concluíram o ensino médio e mesmo assim não galgaram condições financeiras melhores.

De acordo com Salatino, não significa, porém, que a proibição de telefones celulares em sala de aula seja o suficiente. Durante o percurso escolar esses alunos distraem-se com ou sem a presença de recursos tecnológicos, embora os aparelhos tecnológicos levem essa dispersão para outra escala. “Temos que considerar que a proibição não retirou os aparelhos da escola”, lembra o pesquisador, “pois a dinâmica de leis no Brasil é abstrata, constituída de cima para baixo e despreocupada com sua implementação prática”.

O pesquisador ainda vê eventos de distúrbio, como músicas tocadas em sala de aula para provocar os professores, como obstáculo à convivência de ensino e tecnologia. “Os jovens devem crescer em dois mundos: o juvenil e o escolar. Tudo se passa como se esses jovens não tivessem crescido no mundo escolar, não vendo perspectivas em seus estudos. Dessa maneira, a maioria dos jovens mostra uma forma de socialização paralela à escola, investindo sua criatividade, inteligência e seu tempo na utilização de aparelhos tecnológicos e em algo que se mostrou central nessa experiência: a produção e manutenção de redes de sociabilidade via formas rápidas de comunicação, que cadenciavam o decorrer de todas as aulas observadas”, afirma Salatino.


 

Fonte: Agência USP de Notícias








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