No âmbito da saúde, uma prática muito observada no Brasil é a automedicação. Para resolver um problema, a pessoa se dirige à farmácia e, sem prescrição médica, adquire os medicamentos que, em seu entendimento, irão aliviar os incômodos que a afligem. As graves consequências dessa prática são cada vez mais discutidas. Dentre os efeitos negativos estão a ocultação de sintomas e a combinação inadequada de drogas. Curiosamente, as edificações brasileiras sofrem do mesmo problema: são “automedicadas” por seus usuários. É o que afirma o engenheiro civil Flávio Figueiredo, conselheiro do IBAPE/SP (Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia de São Paulo) e diretor da Figueiredo & Associados Consultoria.
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“Basta que se troque a palavra farmácia por loja de materiais de construção e se substitua receita médica por projeto e especificação e se estará face a face com inúmeras tentativas empíricas de se solucionar manifestações indesejáveis nos mais diversos tipos de construções”, relata o especialista.
Segundo Figueiredo, são observadas “automedicações” em imóveis de todos os tamanhos, tipos e padrões, desde o mais simples barraco ao escritório em edifício de alto padrão. O engenheiro informa os exemplos mais comuns de automedicação:
- Trocar disjuntores por outros com maior amperagem, quando os originais desarmam com frequência em razão de excesso de carga;
- Esconder trinca ou bolor com papel de parede;
- Aplicar argamassa em peças de concreto armado, sem critério técnico definido, para encobrir armaduras oxidadas;
- Ocultar marquises ou outras estruturas em concreto armado deteriorado atrás de belas fachadas decorativas, em vidro ou alumínio, por exemplo;
- Emendar tubulações com fitas adesivas ou massa plástica.
Essas ações podem “maquiar” o problema, mas não eliminam suas origens. “Muitas vezes, as patologias são até agravadas ou continuam a se desenvolver de forma oculta e, de um momento para o outro, se manifestam com intensidades tão relevantes a ponto de levar a construção à ruína”, afirma Figueiredo. É importante ressaltar que as manifestações patológicas não ocultadas funcionam como indicadores das reais condições de segurança, além de fornecerem pistas para o diagnóstico de sua origem.
“Para resolver pequenos problemas, as pessoas acreditam que não precisam de orientação de especialistas. São razões culturais, da mesma forma que acontece com a automedicação. A pessoa está com uma dor na perna e logo vai à farmácia para comprar anti-inflamatórios, sem saber os riscos que corre tomando aquele remédio sem a indicação de um médico”, esclarece Figueiredo.
Ainda usando a analogia com a medicina, edificações também são vítimas do uso de vitaminas e anabolizantes não prescritos. “De um simples benjamim, para ampliar a quantidade de tomadas em um ambiente, à colocação de caixas d’água adicionais, ou até a construção de pavimentos extras sem quaisquer projetos e análises, nossas construções são submetidas a muitas intervenções que podem equivaler a doses letais de suplementos hormonais”, explica o engenheiro.
Neste cenário, é preciso estar sempre atento às intervenções realizadas nas edificações. A falta de prescrições feitas por profissionais habilitados, ou intervenções feitas sem respeitar a boa técnica, pode ter consequências graves, tanto para os edifícios quanto para seus usuários.
Fonte: Segs