Deborah Moreira
Comunicação SEESP
A paralisação dos caminhoneiros, ocorrida em meados de maio passado, e a ameaça de um desabastecimento de alimentos nas cidades fez muita gente refletir sobre o consumo. Há alguns anos, essa tem sido uma preocupação para alguns moradores na capital paulista que estão buscando autonomia alimentar, ou pelo menos parte dela. Se você é uma dessas pessoas, ou está buscando informações sobre, a cidade tem desde grupos que cuidam de hortas comunitárias até opções para produzir nas residências, em pequenos espaços.
Foto: Sonia Parma/Divulgação Centro Cultural São Paulo
Temperos, legumes, verduras e até algumas frutas estão brotando de iniciativas como a das hortas urbanas mantidas pela União de Hortas Comunitárias de São Paulo, que começou em 2011, quando um grupo surgiu no Facebook: o Hortelões Urbanos. A ideia era trocar informações sobre horticultura. Hoje, a página na rede social, na internet, divulga as atividades das 15 hortas urbanas que compõem a rede, bem como a atuação dos voluntários.
Um deles, Gustavo Nagib, geógrafo e doutorando em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo (USP), conta que a primeira foi a Horta das Corujas, na Vila Beatriz, região da Vila Madalena. Depois, surgiram na Praça do Ciclista, na Paulista; na Faculdade de Medicina da USP, na Avenida Dr. Arnaldo; na Saúde, próximo ao Metrô Saúde; na City Lapa; a Horta das Flores na Mooca; entre outras. No Centro Cultural São Paulo, próximo ao metrô Vergueiro, o grupo deu vida ao telhado que tornou-se um símbolo daquela região - na Avenida 23 de Maio.
Segundo Nagib, todas têm produção orgânica, sem uso de insumos químicos ou agrotóxicos. Os locais, além de fornecerem seus frutos à comunidade, também contribuem para um processo de educação socioambiental, propondo um novo modelo de agricultura e alimentação, voltado à biodiversidade, com práticas agroecológicas que misturam diversas espécies. Onde há uma horta comunitária, existem também atividades sustentáveis agregadas como cacimbas ou cisternas que coletam água de chuva; ou compostagem.
“Não são hortas tradicionais. As hortas urbanas de São Paulo têm técnicas da permacultura e agroecologia, onde as plantas se ajudam a partir de uma biodiversidade. Então, você não vai ver uma fileira só de alface, como numa horta comum. As espécies estão misturadas, as vezes dezenas, as vezes centenas de espécies num mesmo canteiro”, contou Gustavo Nagib, que foi um dos primeiros voluntários da Praça das Corujas. Atualmente, ele transformou o tema em objeto de pesquisa. “Desenvolvo esse conceito de transformar as experiências da agricultura urbana em ativismo para transformar a vida das pessoas e das cidades”, explicou.
Nagib enxerga nessas experiências uma nova maneira de fazer política a partir de organizações sociais horizontais, formas que a sociedade estaria encontrando para “se organizar e mudar o poder sem tomar o poder”. Para essas pessoas, ainda de acordo com a observação do geógrafo, o que as move é a solidariedade e a ideia de transformar o espaço onde vivem.
Em 2015, a prática acabou evoluindo e inspirando o poder público a aprovar uma lei municipal (Lei 16.212), proposta pelo vereador Nabil Bonduki, que estabeleceu a gestão participativa em praças do município para fins educativos. A legislação prevê a criação de comitês de usuários formados por iniciativa dos munícipes interessados em contribuir voluntariamente na gestão da praça, sendo constituído por, no mínimo, quatro moradores do entorno e usuários em geral. Os comitês podem propor projetos, reformas, requalificações e intervenções, além de buscar novas parcerias ou opinar sobre as já existentes. Para começar uma gestão participativa é preciso procurar o poder público.
Em casa
Muitas pessoas estão buscando mais informações sobre o cultivo de hortas em pequenos espaços seja na internet ou diretamente com empresas especializadas como a Ecra Sustentabilidade, que desde 2014 oferece produtos para o que ela chama de "sustentabilidade urbana" traduzida em produtos simples e acessíveis. Com isso, veio também a agricultura urbana.
“Tínhamos a ideia de levar a sustentabilidade para o meio urbano de forma simples, nada conceitual porque eu trabalhava numa indústria química onde a gente falava muito em sustentabilidade e em quantificar os impactos ambientais. Foi quando percebemos que nem todos estão prontos para todas as informações. Então, fizemos soluções para diversos graus de consciência”, explicou um dos sócios da Ecra, Amir Hernandez Musleh.
Segundo Musleh, que é diretor técnico e comercial, ainda são mais contratados para fazer uma laje verde com fins paisagísticos, por empresas, ou gramados para melhorar a questão do conforto térmico da casa. “Mas percebemos que, para fechar o ciclo de sustentabilidade, seria interessante também oferecer a agricultura urbana na laje verde, cultivando alimentos”, acrescentou.
A experiência com os clientes e no showroom da empresa demonstrou que é possível não só o cultivo próprio mas também compartilhar com vizinhos, que podem comprar os alimentos ou dividir os custos para manutenção e supervisionar. Para isso, a laje precisa ter pelo menos 180 metros quadrados: "Temos um showroom com muitas variedades, o que nos proporcionou observar que é possível criar espaços assim só que comunitários".
Outro produto oferecido são os caixotes, de um metro quadrado e 12 centímetros de altura, feitos de material reciclável de tubo de pasta de dente, usado para fazer telha, que podem ser colocados no quintal ou garagem. O caixote custa R$ 400 e contém, em geral, terra já preparada com substrato (adubo) e mudas separadas - de seis variedades diferentes. “A ideia é que a pessoa faça o plantio e o substrato garante que todas as variedades de hortaliças cresçam saudáveis”, contou.
Ele explica que o caixote proporciona a colheita em tempos diferentes, garantindo uma variedade. A diversidade, ao contrário da monocultura, protege o solo de pragas, que atacam com muito mais voracidade as monoculturas. "A rúcula e o rabanete estão prontos para serem colhidos em cerca de 20 dias. A partir do momento que você colhe, abre espaço para outras espécies como alface e escarola, que ficam prontas entre 30 e 40 dias. Depois de colhê-las, o caixote ganha espaço para outra espécie, a couve, que leva entre 60 e 120 dias para amadurecer”, exemplificou Amir Musleh.
Ele observou, ainda, que o tempo dos moradores de uma cidade grande, como São Paulo, é diferente e que “ninguém quer ficar todo mês tendo que replantar”. Se a família for grande, dá para ter mais de um caixote e estender a colheita para vários meses seguidos, intercalando o tempo de plantio. Segundo ele, cada caixote precisa passar por um preparo após três meses, em média. “Temos clientes que ficam quase seis meses sem replantar, dependendo do número de caixotes”, completou.
Saiba mais
Matéria publicada na FNE: Hortas ganham os espaços urbanos
Página no Facebook da União de Hortas de São Paulo: https://goo.gl/K456r7
Ecra Sustentabilidade: https://ecrasustentabilidadeurbana.com.br/