Deborah Moreira
Comunicação SEESP
Durante a Plenária 3 sobre Sustentabilidade, do EcoSP, na manhã de sexta-feira (22/3), uma experiência em logística reversa chamou a atenção da plateia formada por estudantes e profissionais preocupados com a questão ambiental. Trata-se do relato de Jonas Lessa, um dos idealizadores da Retalhar Logística Reversa e Consciente, que surgiu em 2014 após a implantação de um setor de sustentabilidade em uma confecção de uniformes. A iniciativa gerou um processo produtivo capaz de reciclar uniformes profissionais usados, bem como os retalhos que sobram após o corte da modelagem.
Foto: Beatriz Arruda
Jonas Lessa, um dos idealizadores da Retalhar Logística Reversa e Consciente, na plenária do IX EcoSP.
Aproveita-se o uniforme quando ele rasga, mancha ou há uma troca de logomarca. Segundo Lessa, a imensa maioria das empresas usam uniformes. Então, há um impacto associado indiretamente nas atividades das empresas. “A iniciativa atua em aspectos sociais, ambientais e culturais no setor, inclusive de combate a práticas de escravidão. Criou-se um processo em larga escala de reciclagem”, continuou.
Apesar da Política Nacional de Resíduos Sólidos instituir a logística reversa, a falta de regulamentação dos processos acaba acarretando na ausência total de soluções nesse meio, que tem grande potencial para se tornar um mercado altamente produtivo. Com relação à reciclagem de material têxtil foi possível perceber que “o problema é gigantesco” como apontou Jonas Lessa: “Uma grande companhia aérea gera, em média, de 15 a 20 toneladas de uniformes ao ano. Temos empresas que possuem 40 mil colaboradores, que recebem duas mudas de uniformes e cada uma delas tem três peças. Estamos falando de 50 toneladas em um ano. Então o problema é gigantesco e precisa de uma solução em larga escala. Inclusive, porque as empresas ainda estão num processo de compreender a importância de investir nisso para prevenir os danos ambientais”.
A logística reversa está definida na política nacional como um conjunto de procedimentos e instrumento de desenvolvimento econômico e também social que garanta que os diversos componentes de um resíduo pós consumo retorne ao setor produtivo. Ele alertou que muitas empresas estão vendendo esse serviço de logística reversa. No entanto, elas só retiram os materiais do cliente e encaminham para um aterro sanitário ou um forno de processamento. "Isso não é logística reversa", advertiu.
Ele explicou que a destinação correta deve seguir a seguinte ordem: não gerar lixo, se não puder, reduzir a quantidade gerada, se não puder reduzir mais, reutilizar o que foi gerado, se não puder mais reutilizar, reciclar, se esgotar a reciclagem, faz aproveitamento energético e se não puder mais, manda para o aterro sanitário. Ou seja, aterro sanitário deve ser a última opção. E o aproveitamento energético deve ser feito em sistema de coprocessamento, quando a queima do resíduo ocorre dentro de uma indústria, como a de cimento, geralmente. Ao invés de comprar combustível novo, aproveita o resíduo para usar para fabricação do cimento.
A logística reversa viabiliza a prática da economia circular, que prega que os recursos já estão disponíveis e não é preciso extrair mais recursos da natureza, podendo aproveitar os que já foram extraídos. O conceito da economia circular é o oposto da economia linear adotada hoje em dia e que funciona basicamente com ciclo de extração, beneficiamento, consumo e descarte – feito com base em jogar fora. "Mas jhogar fora para onde? É preciso repensar esse conceito de jogar fora porque estamos acumulando o lixo.Vai além de pensar em como viabilizar a reciclagem. O xis da questão é como a gente pensa no produto. Se houve sobra ou lixo há uma falha de design. Antes de nós chegarmos aqui no planeta, não existia lixo. Na natureza não há lixo", explicou.
Ele recordou que no início, quando a proposta de reaproveitar os uniformes era para transformá-los em produtos como mochilas. No entanto, durante o processo, perceberam que o mais importante a ser equacionado era a questão ambiental com o fator econômico. “Oferecer esse produto de altíssimo valor agregado não é compatível com o orçamento que as empresas têm disponível para fazer a gestão de resíduos onde, via de regra, são gastos de R$ 2 a R$ 4 por quilo. E para fazer uma mochila dessas custa cerca de 30 reais, consumindo uma peça de roupa. Para uma empresa que gera 15 toneladas de uniformes, ao ano, que equivale a 45 mil peças, seria inviável 45 mil mochilas. Precisaríamos criar um modelo para escoar essa produção que não cabe neste momento. Então, entendemos que seria mais atrativo para as empresas criar subprodutos. E a mochila vira a cereja do bolo”, explicou.
Outro problema apontado pelas empresas é a questão da segurança da empresa e da população. Ladrões se apropriam dos uniformes para realizar assaltos.
Uma das indústrias mais poluentes
A indústria têxtil é uma das mais poluentes. É considerada a segunda mais poluente. No entanto, é difícil mensurar o impacto ambiental, dependendo do que se considerar, como emissões, consumo de energia e consumo hídrico, os números variam. Todos descartam resíduos têxtil em algum momento da vida. E o poder público não dá apoio para seu descarte. Até mesmo as sacolinhas de plástico que são usadas para reciclagem, cinza e verde, têm uma lista de materiais do que deve e do que não deve ser descartado. Segundo Jonas Lessa, em nenhuma dessas listas, nem do que deve, nem do que não deve ser descartado contém os resíduos têxteis, e em nenhuma das duas sacolas. “Ninguém fala sobre isso”.
A Retalhar encontrou soluções primeiro para os resíduos gerados dentro do processo produtivo da confecção que são as sobras dos tecidos após o corte da modelagem das peças, reaproveitando para a fabricação de novos produtos como bolsa, sacola, mochila, nécessaire, cama de cachorro, luvas. Em larga escala, trabalham com a indústria recicladora de tecidos que basicamente pega esse material e tritura ou desfibra resultando em cerca de 40 produtos diferentes com aplicação industrial como, por exemplo, revestimento de paredes para isolamento acústico, de móveis para proteção e até autopeças para isolamento térmico.
“Também fomos procurados por um cliente da empresa que estava trocando toda a coleção dos uniformes e precisava descartar de forma adequada os uniformes antigos. A legislação ambiental determina que há uma responsabilidade compartilhada desse ciclo de vida dos materiais. A partir das parcerias com as cooperativas de costureiras transformamos esses uniformes antigos em novos produtos resolvendo a questão ambiental e gerando valor social para as costureiras e também uma oportunidade de comunicação dentro da empresa porque os colaboradores da empresa que descartaram os uniformes receberam um brinde”, detalhou.
Desde que o trabalho começou, Lessa estima que a empresa já contribuiu com a redução no volume de resíduos nos aterros equivalente a 200 carros populares, levando em conta que 1 tonelada de resíduos têxteis ocupa o mesmo volume que dois carros populares.
Esta foi a 9ª edição do EcoSP que ocorreu na sede do SEESP na Bela Vista, capital paulista, que organizou o evento, com apoio da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) e patrocínio de Comgas, grupo Semmler, Mutua-SP, Usiminas,. SICOOB Cecres e Inbec Pós-graduação. A Plenária 3 foi coordenada pelo diretor do sindicato, Edilson Reis.