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04/06/2020

Dieese aponta ideias sustentáveis para o futuro do trabalho pós-pandemia

Comunicação SEESP*

trabalho e meio ambiente freepikNa semana que se comemora o Dia Mundial do Meio Ambiente (5/6), o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) divulgou Nota Técnica intitulada "Brasil pós-pandemia: mais do mesmo? Ideias urgentes para o futuro do trabalho e do meio ambiente", que aborda conceitos e propostas para a reflexão sobre o futuro da sociedade.  

É dado o momento em que todos se perguntam: qual mundo surgirá após a pandemia? As medidas tomadas no decorrer da crise de saúde pública e depois de seu término determinarão se o futuro será mais justo ou se continuará desigual e destrutivo. Algumas propostas já estão em curso, mas o rumo a ser tomado dependerá da mobilização dos diferentes atores sociais, entre eles as entidades sindicais, que têm como missão reintroduzir nas agendas as bases para a retomada do desenvolvimento, da solidariedade, da igualdade e, com mais ênfase, dos cuidados necessários com o planeta em que vivemos.


Ainda não é certo, mas as evidências são muitas de que a atual pandemia de Covid-19 pode ter sido causada pelo desequilíbrio provocado pela ação humana no ambiente. “Não se trata de vingança da natureza. Trata-se de pura autodefesa”, já avisou o sociólogo Boaventura de Sousa Santos.


Se há algo positivo para se extrair deste momento é a revelação da importância do Estado e das políticas públicas para sociedades organizadas. A pandemia realçou valores que estavam esquecidos, como o do trabalho como elemento estrutural social. Sem trabalho não há produção. Sem trabalho não há renda que dinamiza a economia e a faz girar. Sem dignidade no trabalho, com condições mínimas de higiene, a saúde individual e coletiva é colocada em risco.

Por outro lado, a crise da saúde fez emergir a desigualdade social e sua perversidade visível a olho nu. Com ela, a devastação ambiental em prol dessa insustentabilidade econômica: a interferência do homem que nos trouxe consequências desastrosas.


As possibilidades de respostas e os projetos para o dia seguinte já estão em curso, o rumo que será tomado dependerá da mobilização dos diferentes atores sociais, entre esses o movimento sindical, em torno de agendas que refundem as bases do que se entende por desenvolvimento, solidariedade, igualdade e cuidado com o planeta.


Em alguns países estão em andamento programas e políticas públicas para rever suas matrizes produtivas energéticas e estabelecer limites do crescimento econômico, priorizando a sustentabilidade do planeta. E, mesmo sem provas definitivas da associação entre o avanço da humanidade sobre o habitat de outras espécies e a Covid-19, as mudanças climáticas já comprovavam a pronta necessidade de alteração do curso do modelo econômico adotado até aqui.


A mudança na base energética – dos combustíveis fósseis para energias renováveis – é uma das ações almejadas no âmbito do acordo de Paris e dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável para 2030.


Situações como a dependência por equipamentos de saúde produzidos na China podem levar países em desenvolvimento a promoverem investimentos focados em produção nacional, a partir de uma matriz produtiva limpa.


Em todo o País, a prioridade por investimentos sustentáveis poderia mobilizar recursos entre R$ 890 bilhões e U$ 1,3 trilhão até 2030, segundo previsões da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), em setores como construção civil (habitação social, espaços urbanos para pedestres); saneamento básico; transporte público; energias renováveis (solar e eólica); produção alimentar orgânica; restauração de ecossistemas; recuperação de rios, florestas e bacias hidrográficas; saúde pública (equipamentos, serviços de cuidado); e educação pública, entre outros, o que garantiria um crescimento anual em torno de 1,6% do Produto Interno Bruto (PIB).


Um manifesto lançado recentemente na Holanda por 170 intelectuais (repercutido pelo El Clarín) indica o desafio do País para reestruturar sua economia baseada nos princípios do “decrescimento”, isto é, diferenciando setores que podem crescer e requerem investimentos (serviços públicos e energias limpas, entre outros) e setores que devem decrescer (como combustíveis fósseis, pecuária e gastos militares, entre outros). O manifesto destaca também a necessidade da construção de uma estrutura econômica baseada na redistribuição da renda; na transformação da agricultura do agronegócio exportador para uma agricultura local e vegetariana; e na redução do consumo e das viagens, entre outras recomendações.


Geração de empregos sustentáveis

A situação do mercado de trabalho no Brasil já era dramática antes da pandemia. No primeiro trimestre deste ano, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desemprego foi de 12,2%, alcançando perto de 13 milhões de brasileiros. A taxa de informalidade foi de 40% da população ocupada (37 milhões de pessoas). Some-se a isso a possibilidade de milhões de empregos estarem em risco até 2026, devido à digitalização na economia, segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2019.


Já o Dieese projetou três cenários para 2020, sendo um pessimista, com aumento de 4,4 milhões no número de desocupados; outro intermediário, com 2,3 milhões; e outro otimista, com 1,1 milhão de novos desempregados. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que, nos primeiros meses da expansão da epidemia, algo em torno de 130 milhões de empregos foi perdido no mundo, podendo alcançar rapidamente 305 milhões nos próximos meses.

Ainda segundo a OIT, a elevação da temperatura no País poderá gerar perda de produtividade equivalente a 850 mil empregos até 2030, com impactos maiores na agricultura, construção civil, indústria e serviços. No mundo, a previsão é de que essa perda corresponda a 80 milhões de empregos.

No entanto, existe a possibilidade de que políticas públicas de fomento à geração de emprego estejam assentadas na criação de postos de trabalho sustentáveis - em setores de atividade com baixa emissão de carbono.


trabalho e meio ambiente freepik 2A OIT fez, em 2019, uma medição dos chamados empregos verdes no Brasil - entende-se por emprego verde o posto de trabalho que contribua substancialmente para a preservação ou restauração da qualidade ambiental e esteja baseado nos princípios do trabalho decente, garantindo salários adequados, condições seguras de trabalho e direitos trabalhistas, inclusive o direito de se organizar em sindicatos. Os empregos verdes aferidos por esse estudo representavam aproximadamente 7% dos empregos formais do Brasil em 2008, ou 2,7 milhões de postos de trabalho.


Há 11 milhões de empregos em energia renovável no mundo, segundo estudos da International Renewable Energy Agency (Irena). No Brasil, hoje, o setor de energia renovável emprega aproximadamente 1,1 milhão (10% dos empregos mundiais), sendo a maior parte (74%) a partir da biomassa; 18%, da hidroeletricidade e 8%, eólica e solar.


Nas universidades, o tema trabalho é analisado por diferentes áreas do conhecimento: sociologia, economia, antropologia, direito, psicologia, saúde, arte, entre outras, o que aprofunda o entendimento, mas faz com que se perca a riqueza do todo. O Dieese, ao estruturar o primeiro bacharelado interdisciplinar em Ciências do Trabalho, teve a intenção de romper essas estruturas rígidas, criando um novo campo de conhecimento que reúne as diferentes contribuições científicas sobre o trabalho.

Conclusão
Citando Manoel Castells, o Dieese afirma que a produção científica sobre a “economia” é segregada e, com isso, não há um olhar desse ponto de vista sobre a cultura, o cotidiano e a vida. E isso faz com que a natureza seja tratada meramente como recurso natural a ser consumido, além de aprofundar um determinado olhar sobre o mundo, o olhar que a colonização instaurou e ainda predomina.


Os negacionistas do aquecimento global estão sintonizados com essa desconexão entre humanidade e natureza. O estudo enfatiza a dimensão do problema ambiental: “(...) se a mudança climática não for estancada, o degelo nos polos fará ressurgir camadas de micro-organismos desconhecidos e cujas consequências são imprevisíveis, incluindo a possibilidade do surgimento de uma série de novas pandemias e até mesmo a extinção de espécies, entre elas, a humana.”

Também não se pode deixar de observar a desigualdade na apropriação dos bens naturais. Um estudo realizado pela Oxfam (2015) indica que os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis pela emissão de 49% de CO², enquanto a metade mais pobre da população mundial é responsável por 10%. Os padrões de consumo dos países ricos e dos ricos de todo o mundo deverão ser revistos. Os ricos se apropriam da maior parte dos bens naturais e são os menos atingidos pelos seus efeitos. Não são, portanto, os pobres ou a pobreza que devem ser responsabilizados pelos impactos negativos da ação dos homens sobre a natureza.

É preciso rever os paradigmas do que se entende por desenvolvimento econômico sustentável, já que nem mesmo a propagação dos conceitos, aliada aos avanços tecnológicos, tem sido capaz de redimir o planeta dos impactos ambientais. A geração de empregos realmente sustentáveis pode ser uma boa e oportuna escolha para a compreensão do ambiente como um todo, e essa bandeira não pode ser coerentemente conduzida senão pelos sindicatos de trabalhadores.

Acesse aqui a íntegra da Nota Técnica do Dieese.

Imagens: Free Pik

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