Soraya Misleh / Comunicação SEESP
“A engenharia enfrenta muitos problemas difíceis em função do contexto econômico, agora agravados com a pandemia.” Assim o professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Conselho Tecnológico do SEESP, José Roberto Cardoso, iniciou sua participação na live desta quarta-feira (24/6). Realizada pelo sindicato e apresentada por Antonio Octaviano, coordenador do SEESP Educação, a atividade trouxe o tema “Como será a volta à escola que não existe mais?”. Com transmissão online no canal do Instagram da entidade (oportunidades_na_engenharia), integra a série semanal de debates de temas de interesse da categoria e da sociedade como um todo.
“O SEESP sempre se caracterizou por iniciativas que auxiliem os engenheiros a conhecerem os mais diferentes assuntos. Estamos todos trabalhando em casa [em função da pandemia], mas não deixamos de estar presentes, sobretudo junto aos profissionais do Estado”, informou Octaviano à abertura, trazendo algumas questões: “Qual o cenário atual? A quantas andam as escolas de engenharia e a formação?”
Acima, Octaviano, na live com Cardoso. (Reprodução Instagram)
Cardoso observou dado que impacta diretamente a profissão: a queda do PIB brasileiro, que em 2011 era de US$ 2,6 trilhões e hoje situa-se em US$ 1,5 trilhão. Consequentemente, a economia nacional caiu da 8a para a 5a posição no ranking mundial. “São 210 milhões de habitantes e 12 milhões de desempregados.”
A despeito disso, o professor enfatizou o excelente desempenho em pesquisa do Brasil, não obstante os ínfimos investimentos na área, de apenas 0,7% do PIB em comparação com nações desenvolvidas. “Estamos na 14a posição entre os países com publicações científicas. Apesar disso, ocupamos a 66a classificação no ranking de inovação e a 71a de competitividade (entre 140 países).”
Como salientou, cada milhão de dólares gera um posto de trabalho para engenheiro. “Hoje são 130 mil formandos por ano. O PIB, cujo desempenho é muito baixo, deveria crescer em torno de 10% para haver emprego para todos.”
Problemas e soluções
Na sua concepção, além do Estado, as empresas precisam começar a investir nas universidades e pesquisas. Além disso, é fundamental transformar a educação, que deve ainda ser continuada, de modo que o futuro profissional seja capaz de “criar o seu próprio emprego”.
“A inovação é algo inserido no seio da engenharia. Devíamos ter estudantes com anseio de fazer coisas novas, empreender. A educação fornecida não estimula isso, é voltada para que o futuro profissional seja operacional. O aluno segue sendo o receptor do conteúdo e o professor, o emissor. Isso talvez valesse no século XX, em que bastava obedecer às ordens do superior para garantir emprego.”
Para ele, essa cadeia hierárquica, muito cristalizada, agora foi extinta. “Abaixo, há uma equipe em que cada um detém parte da missão da empresa. O chefe pergunta: O que devemos fazer para melhorar? Tem que ser criativo. Hoje é preciso aprender a aprender, dar condições para o aluno resolver os problemas, pesquisando, observando. E a educação deve ser para toda a vida, continuada, tem que realizar atividades extracurriculares, participar de eventos, palestras, planejar, ter foco, não perder oportunidades.” Também é mister ir além das competências técnicas. “É preciso saber se comunicar, trabalhar em equipe, falar outra língua, ter conhecimentos de economia.”
Ampliar o contingente feminino nos cursos de engenharia é outro desafio apontado por ele. “Hoje são apenas 25%. Não conseguimos atraí-las para a profissão e diversidade é tudo. O projeto de engenharia se eleva em todas as dimensões. É importante ter uma política de acolhimento dos estudantes, ouvi-los nas suas dificuldades, não deixá-los abandonados.” Na busca por contribuir no enfrentamento dessa e das demais questões, Cardoso informou que o sindicato está organizando um evento para discutir as diretrizes curriculares da engenharia.
Enquanto os problemas seguem sem ser solucionados, tem-se alta evasão nos cursos de engenharia – 59% em 2019 – e alguns estão deixando de existir, em várias instituições. “Estudo feito pelo pró-reitor acadêmico do Instituto Mauá de Tecnologia, Marcello Nitz, mostra que em 2015 tínhamos 1,4 milhão de matrículas nos cursos de engenharia; em 2017 baixou para cerca de 1 milhão, e há forte tendência de queda. A oferta de cursos vinha crescendo e a demanda, caindo. É uma tragédia anunciada. Cursos estão fechando, vão ficar apenas as escolas tradicionais.”
Cardoso observou ainda que a pandemia de Covid-19 explicitou a tendência de ampliar-se a educação a distância (EaD). “O que fizemos foi o ensino emergencial online, com soluções interessantes e iniciativas fabulosas. Acho difícil abandonar essa prática, já que a situação anterior não vai existir mais. Terão continuidade após a pandemia. Os alunos irão num futuro próximo para as universidades mais em função da tecnologia, para fazer projetos, desenvolver pesquisas e menos para assistir aulas”, apontou o professor, que defende esse modelo e dá como exemplo bem-sucedido a Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp). “Tem que ter a mente aberta e pensar em como ajudar o País e melhorar a vidas das pessoas”, concluiu.
A próxima live ocorrerá no dia 1o de julho, às 18h. O tema é “Direitos trabalhistas e previdenciários: mudanças e impactos na vida dos profissionais", com participação de Ivani Contini Bramante, desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 2 Região (SP), e coordenação de Jonas Matos, gerente jurídico do SEESP. Sempre no canal do Instagram do sindicato (oportunidades_na_engenharia).
Confira a transmissão online da live “Como será a volta à escola que não existe mais?”: