Rita Casaro – Comunicação SEESP
A imprescindível qualificação permanente para que os engenheiros se mantenham aptos a acompanhar as demandas da profissão esteve em debate nesta quinta-feira (18/9), no auditório do SEESP. O tema encerrou os trabalhos do seminário “Ensino de engenharia: quantidade, qualidade e empregabilidade”, realizado pela Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) ao longo de todo o dia.
O painel foi coordenado pelos vices-presidentes do SEESP Celso Atienza e Fernando Palmezan Neto, esse último também coordenador do projeto "Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento".
Para tratar a questão foram convidados representantes de quatro instituições de renome na engenharia, cujos programas de educação continuada são reconhecidos pela excelência. Nas falas, o consenso sobre a premência em se dar sequência à formação, tendo em vista a impossibilidade de adquirir na graduação todas as competências necessárias à construção de uma carreira de sucesso, inclusive as chamadas soft skills, como habilidades de comunicação e trabalho em equipe, e o acelerado avanço tecnológico observado no mundo contemporâneo.
A partir da esquerda, Palmezan, Souza, Farah, Lucchi, Aguiar Neto e Atienza. No púlpito, presidente do SEESP e da FNE, Murilo Pinheiro, encerrando os trabalhos do seminário que ao longo de o dia debateu como assegurar mais e melhores engenheiros ao Brasil. Fotos: Rita Casaro
De olho nas tecnologias do futuro
Gilberto Francisco de Souza, coordenador do Programa de Educação Continuada da Escola Politécnica (Pece).Dando início às palestras, Gilberto Francisco Martha de Souza, coordenador do Programa de Educação Continuada da Escola Politécnica (Pece) da Universidade de São Paulo (USP), foi categórico: “Por mais que se busque manter atualizada a grade curricular, há a necessidade de [o profissional] acompanhar tecnicamente os anseios dos diversos setores industriais e da sociedade.” Como exemplo, citou o trator agrícola. “O engenheiro que se formou em 2000 não sabe fazer a máquina de 2020, que é autônoma, funcionar.”
Souza apontou ainda o amplo espectro de tecnologias-chave para a liderança em inovação elencadas por publicação da Universidade de Stanford. Essas incluem inteligência artificial, biotecnologia, criptografia, lasers, ciência dos materiais, neurociência, robótica, semicondutores, ciência espacial e energias renováveis. “Não tem como sair da escola sabendo tudo isso”, asseverou.
Nesse contexto, disse, entra a educação continuada, que abrange aprendizado formal e informal, incluindo cursos e eventos oferecidos pelas associações profissionais, além da pós-graduação stricto e lato sensu oferecida pelas instituições acadêmicas.
O Pece, informou ele, oferece cursos de especialização, aperfeiçoamento e difusão, englobando mais de uma dezena de cursos. “A educação continuada propicia atualização, networking e maior competitividade”, reforçou.
Construção da carreira
Júlio Lucchi, coordenador do programa de Educação Continuada do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT).Júlio Lucchi, coordenador do programa de Educação Continuada do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT), apresentou o programa de pós-graduação da instituição, que se divide em três momentos, envolvendo a atualização profissional como passo inicial, o aperfeiçoamento a seguir e, finalmente, a possibilidade de se tornar um especialista.
Nessa lógica, explicou ele, os alunos vão criando o caminho que entendem ser o melhor para a carreira, sem duplicação de esforços e perda de tempo. “Estamos falando de pessoas que querem dar mais um passo, e para isso não tem jeito, tem que estudar.”
Ainda pensando na dinâmica de facilitar a vida de profissionais que buscam qualificação, Lucchi afirmou não ser possível descartar a educação a distância (EaD). “Quando se fala nisso, pensa-se em algo ruim, mas não é necessariamente assim. Estamos num momento de digitalização para entregar com a máxima qualidade os nossos cursos.”
O representante do IMT trouxe para a discussão sobre a formação continuada a necessidade de se garantir educação básica de qualidade. Para ele, esse não é um problema que afeta quem frequenta estabelecimentos privados de elite, mas sim os estudantes oriundos da escola pública, que enfrentam dificuldades para chegar à engenharia. “É preciso incluir”, enfatizou.
Concluída a graduação, frisou, não se pode parar. “Primeiro que não está pronto, e seis meses depois já está em desuso, o que sabe já está mudando. Então a ideia de estar constantemente se atualizando é condição sine qua non para se manter no mercado e progredir na carreira”, completou.
Ele destacou ainda ser obrigatório, por parte das instituições que oferecem a pós-graduação, o contato com o mercado, o que abrange os cursos in company existentes no IMT. “Fazemos muito curso a quatro mãos no modelo remoto. Chegamos a atender 350 colaboradores da Volkswagen num curso de eletrificação veicular”, contou.
Lucchi defendeu ainda que o conhecimento adquirido nos cursos de especialização seja aproveitado nos de mestrado e doutorado. Além disso, ele propôs a ideia de “residência em pesquisa”, que valorize o desenvolvimento de projetos por alunos que buscam na pós-graduação soluções para problemas concretos das empresas em que atuam.
Qualificação e geração de riqueza
Benedito Aguiar Neto, diretor-geral do MackGraphe e ex-reitor do Mackenzie. A participação de organizações como SEESP, FNE e Sistema Confea/Crea no esforço de educação continuada na engenharia foi defendida por Benedito Aguiar Neto, diretor-geral do Instituto Mackenzie de Pesquisa em Grafeno e Nanotecnologia (MackGraphe) e ex-reitor da Universidade Mackenzie. “O processo de ensino e aprendizagem cabe também a outras instituições, além das universidades”, afirmou.
Ele alertou que a educação continuada, apesar de sua importância, “muitas vezes tem sido negligenciada”. Aguiar Neto enfatizou o papel das entidades empresariais nesse esforço, que devem “ter preocupação com a formação dos seus profissionais, pensando na competitividade”.
A formação, retomou o professor, não se encerra na graduação, e são aspectos importantes na lógica de qualificação permanente o fortalecimento de competências, habilidades e atitudes profissionais; a compreensão do contexto e o desenvolvimento de estratégias específicas; e a capacitação para mudanças.
Na sua avaliação, é fundamental “buscar o alinhamento entre as demandas de mercado, as oportunidades de negócios e o conhecimento científico”.
Para Aguiar Neto, garantir profissionais aptos a esses desafios é essencial para que se alcance o desenvolvimento nacional efetivo. “O Brasil ainda carece da capacidade de transformação do conhecimento em produtos e negócios. Não podemos atirar em todas as direções, mas temos que ter um projeto estratégico em que as instituições cooperem.”
Desafios na engenharia
Mario Luis Farah, da Pró-Reitoria de Educação Continuada da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).Mario Luis Farah, assessor da Pró-Reitoria de Educação Continuada da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), abordou a relevância da educação continuada no contexto de desafios enfrentados pela engenharia na atualidade.
Conforme ele, há questões como ensino excessivamente teórico e baixa qualidade em várias instituições de ensino. Frente à redução de 23% nas matrículas entre 2014 e 2023, há “déficit generalizado de profissionais”. Enquanto isso, o mercado exige cada vez mais qualificação e competências específicas.
Essas incluem, listou ele, as hard skills (tecnologia, inovação, sustentabilidade e digitalização), as soft skills (habilidades interpessoais, como comunicação, liderança e solução de problemas complexos) e a demanda por especialistas que compreendam profundamente áreas como engenharia de dados, inteligência artificial e questões ambientais.
O engenheiro, por seu lado, precisa de formação continuada para se manter competitivo, saber transitar pelas várias áreas da carreira, que vão de gestão e inovação ao ensino e desenvolvimento técnico, e ter flexibilidade e agilidade
para dominar novas ferramentas e técnicas.
Nesse amplo pacote, entra a premência da educação constante. “Se não tiver formação contínua, ficará para trás”, advertiu.
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