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03/09/2020

Cenário econômico e recuperação pós-pandemia

 

Soraya Misleh / Comunicação SEESP

 

Na live semanal realizada pelo SEESP, tema de extrema importância foi abordado: “Cenário econômico e recuperação pós-pandemia”. A atividade ocorreu nesta quinta-feira (2/9), na página do Instagram da entidade (oportunidades_na_engenharia). Teve a participação de Antonio Corrêa de Lacerda, diretor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Ciências Atuariais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (FEA-PUC/SP) e presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), e coordenação de Murilo Pinheiro, presidente do sindicato e da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE).

 

À abertura, este último destacou que o SEESP, para além da defesa dos direitos dos engenheiros, tradicionalmente tem trazido debates e feito gestões em relação a questões importantes para toda a sociedade brasileira. Caso do assunto em pauta na live: a expectativa em relação à retomada pós-pandemia.

 

Lacerda trouxe o panorama a ser enfrentado: “Ontem [1º/9] o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] divulgou dados do PIB [Produto Interno Bruto] do segundo trimestre do ano, quase integralmente afetado pela pandemia. Isso porque o necessário isolamento se intensificou a partir da segunda metade de março. O resultado trágico é a queda de 9,7%. A indústria caiu mais de 12% e a formação bruta de capital, que são os investimentos, mais de 15%.”

 

Ele apontou a gravidade dessa situação, uma vez que, muito antes da pandemia de Covid-19, já se tinha “quadro desolador no que se refere a desemprego e crescimento pífio” – apenas residual, de 0,3% ao ano, quando se considera o dado per capita.

 

Murilo Pinheiro (acima) e Antonio Corrêa de Lacerda, na live.

(Reprodução Instagram)

 

Por isso e uma série de deficiências estruturais, no País, como enfatizou, a pandemia global assumiu “contornos muito especiais”. “Além do desemprego elevado, têm-se extremas desigualdades sociais, um déficit habitacional de mais de 6 milhões de moradias, carência de saneamento em quase 50% dos lares brasileiros”, detalhou.

 

E acrescentou: “As pessoas precisaram se isolar, mas muitas vezes dependiam de trabalhar para comer naquele dia. É quase impossível falar em distanciamento quando as pessoas vivem em habitações precárias ou debaixo de viadutos – só em São Paulo estima-se que são 30 milhões de moradores em situação de rua –, menos ainda para milhões de brasileiros que não têm acesso a água para o ato simples de lavar as mãos com frequência.”

 

Somam-se, segundo Lacerda, à crise sanitária, política, social e econômica outros fatores: a divergência de comunicação entre os três poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário) e entes da Federação (União, estados e municípios), além da “carência de governança e gestão”.

 

O especialista foi categórico: “A postura negacionista do governo federal, em especial no início da pandemia, contribuiu muito para a ampliação exagerada do número de infectados e óbitos [mais de 4 milhões de casos confirmados e 123 mil mortes, de acordo com dados oficiais]. A gestão é péssima do ponto de vista federal, com alternância do Ministro da Saúde e o atual interino sem autonomia para várias ações. Tudo isso agrava o problema no Brasil.”

 

 

Lava Jato

 

Outra questão que considera complicada para a retomada pós-pandemia é consequência da Operação Lava Jato, como explicou: “Temos uma recessão pela frente e não se pode, sob o discurso de combater a corrupção, destruir empresas, como foi feito no Brasil. É um erro monumental. A empresa é um ativo social, não só para seus acionistas, mas também para os empregados, fornecedores, clientes, sociedade e governo, através da geração de recursos via impostos.”

 

Lacerda observou que uma única companhia dessas que foram objeto da Lava Jato “queimou” 300 mil empregos diretos, além de mais três ou quatro indiretos. “Seriam 1 milhão de pessoas atingidas, que sustentam suas famílias. Então o impacto seria de outros 2 ou 3 milhões de brasileiros”, prospectou.

 

Ao não deixar dúvidas de que é fundamental combater a corrupção, defendeu, portanto, que isso não pode significar destruir tais ativos sociais, que movimentam a economia. Para o especialista, um dos exemplos internacionais do que deveria ter sido feito é a atitude adotada pelo governo da Alemanha. Sem citar nomes, referiu-se ao caso amplamente divulgado de fraude nos níveis de emissão de poluentes de automóveis produzidos pela Volkswagen no país europeu em 2015. A empresa não foi fechada, mas multada, assim como seus diretores, que foram afastados e processados criminalmente.

 

 

O que fazer

 

Ante este quadro complexo e a provável retomada das atividades econômicas a partir do terceiro trimestre de 2020 – com possibilidade de o ano fechar com queda de 5,5% a 6% no PIB brasileiro –, Lacerda apresentou propostas para conjunto de políticas a serem adotadas que podem definir o panorama em 2021.

 

Ao destacar a relevância do auxílio emergencial, ele apontou a demonstração do papel fundamental e protagonismo do Estado – ao invés da visão fiscalista predominante no Ministério da Economia hoje, que vê ajuste como panaceia. “Ao contrário do que é vendido, isso aprofunda a recessão e cria desequilíbrio permanente. Já o gasto público tem efeito multiplicador”, afirmou. Sob essa ótica, revelou que a cada real investido gera-se 1,5 em outras atividades, com impacto positivo a médio e longo prazos. O tema é tratado no livro “O mito da austeridade” (Editora Contracorrente), organizado por Lacerda, que reúne artigos também de vários outros especialistas.

 

Propostas nessa direção apresentadas por ele são constituir frentes de trabalho e programas empresariais de emergência à geração de trabalho e renda. Também sugeriu se espelhar na experiência de outros países e pensar renda básica à população, desvinculada do trabalho – já que a chamada revolução tecnológica resultará em redução de postos e parcela da sociedade fora do mercado.

 

Defendeu ainda que se insira no debate nacional a proposta de “reforma tributária solidária”, construída a muitas mãos por diversos especialistas, garantindo tributação progressiva – ou seja, que ricos paguem mais (leia aqui). Diferentemente do foco pura e simplesmente na simplificação tributária, como propugna o governo federal para reforma nesse sistema.

 

Murilo levantou também a importância da retomada dos milhares de obras paradas no País. Com planejamento e cronograma definidos, além de estímulo à iniciativa privada, o presidente do SEESP destacou que essa ação movimentaria a economia e geraria emprego e renda.

 

Para Lacerda, as frentes de trabalho – como propõe – podem ser associadas à retomada das obras paradas, “desobstruindo um dos principais gargalos ao desenvolvimento brasileiro: as áreas de infraestrutura e logística. “Precisamos que parte do investimento seja feita pelo Estado e parte pode ser junto à iniciativa privada, mediante rígido marco regulatório. Essa é uma tarefa multidisciplinar, romper os muros e trabalhar em conjunto”, acredita.

 

Ponto fundamental, ainda – levantado por Murilo e ratificado por Lacerda – é a construção de programa de reindustrialização, para mais segurança no abastecimento, geração de tecnologia e empregos. Lacerda foi enfático: “Com a pandemia isso ficou claro para a população. Um bom exemplo do risco da desindustrialização é que o Brasil não tinha competência para produzir equipamentos de proteção individual [EPIs], respiradores e teve que recorrer à importação.” Efeito imediato foi o atraso no recebimento e implantação de aparelhos em hospitais para salvar vidas.

 

Nessa direção, enxerga que os vários problemas brasileiros representam oportunidades na recuperação pós-pandemia. “Temos que colocar esse potencial enorme em movimento. O desafio hoje é tão grande que é preciso esforço de unir profissionais e entidades de classe para construir soluções”, salientou.

 

Ao fim, Murilo informou que será lançada em outubro próximo mais uma edição do projeto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”, inciativa da FNE com adesão do SEESP que reúne propostas factíveis ao desenvolvimento nacional sustentável com justiça social. Desta vez, o tema será a recuperação pós-pandemia e retomada das obras paradas. O documento, como informou o presidente do sindicato, será entregue a todos os candidatos a prefeito pelo menos das capitais do País, para que possa ser utilizado na construção de seus programas de governo.

 

Lacerda – que é consultor e autor de notas técnicas para o “Cresce Brasil” – saudou a iniciativa, que demonstra a importância do protagonismo dos engenheiros à construção de políticas públicas rumo à saída da crise.

 

A próxima live acontece na quarta-feira (9/9), às 18h. O tema é “Engenharia, inovação e realidade ‘phygital’”, com a participação de Valter Pieracciani, sócio-diretor e fundador da Pieracciani Consultoria, e coordenação de Edilson Reis, diretor do SEESP. Sempre na página do Instagram do sindicato (oportunidades_na_engenharia).

 

 

Confira o vídeo:

 

 

 

 

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