Jéssica Silva / Comunicação SEESP
Seguindo com os tradicionais debates promovidos pela entidade, neste momento por meio das ferramentas online, o SEESP realizou live na última quinta-feira (24/9), transmitida pelo perfil no Instagram (@oportunidades_na_engenharia), com o tema “Estratégias para aproveitamento da ventilação natural: arquitetura bioclimática”.
A especialista convidada foi Myrthes Marcele Faria dos Santos, arquiteta urbanista, sócia-diretora da Equalize Consultoria em Eficiência Energética, com a coordenação da diretora da Delegacia Sindical do SEESP em Campinas, engenheira Cláudia Maria Coimbra.
O tema da live, como lembrou Coimbra, deu sequência ao debate realizado em julho último sobre eficiência energética e certificações verdes para edifícios. “A ventilação natural é um dos principais pontos da arquitetura bioclimática e traz benefícios para qualquer tipo de construção, bem como para quem faz uso dessa construção”, atestou ela.
“A arquitetura bioclimática está inserida em princípios básicos da sustentabilidade, que é a preservação dos recursos naturais, seja água, luz, energia. E também nos projetos de construção constitui um pilar muito interessante para uma solução sustentável, reunindo, inclusive, profissionais de diversas áreas, arquitetos, engenheiros. É importante que nós façamos o uso consciente desses recursos, porque dessa forma vamos colaborar com a nossa parte para um consumo consciente e inteligente”, pontuou a engenheira sobre a relevância do tema.
Coimbra fez questão de ressaltar o ator principal do assunto em questão: o vento, “recurso natural, gratuito e renovável”. Seu uso adequado, conforme disse, traz benefícios para qualquer qualidade interna do ar, pela constante troca deste no ambiente, e uma maior eficiência energética. Ela afirmou: “Se nós temos um maior conforto térmico, vamos necessitar menos dos sistemas de condicionamento de ar e também poder reduzir a pressão sobre outros recursos naturais, como por exemplo a água”, base da geração de energia elétrica.
Segundo a engenheira, a ventilação natural é um forte segmento a ser explorado. “Estudiosos já afirmam que é indicada como principal estratégia bioclimática na maior parte das cidades brasileiras. E eles atestam que é possível anualmente melhorar o desempenho térmico em pelo menos 4.380 horas. Ou seja, isso significa que a gente pode melhorar pelo menos 50% das nossas horas do ano com desempenho térmico”, explicou.
E é possível aproveitar a ventilação natural em todos os tipos de construção. A afirmação foi feita por Santos, considerando as características de cada obra. O melhor, em sua visão, é que o recurso seja pensado no desenvolvimento da edificação, na etapa do projeto. Para construções já realizadas, a arquiteta deu dicas de adaptações.
Em muitos prédios comerciais, por serem muito altos, os usuários não podem abrir as janelas como medida de segurança, e não têm controle da temperatura ambiente. “São controlados por uma central”, contou Santos. Nesses casos, ela apontou o caminho da automação, utilizando um sistema de ar-condicionado integrado às janelas, com uma programação que abra as janelas de madrugada, para renovação do ar, quando não há expediente. “Esse sistema deixa o ar fresco da madrugada entrar, refrescar a estrutura do prédio e de manhã, antes das pessoas chegarem, fecha automaticamente e aí sim se liga o ar-condicionado”, exemplificou a especialista. “São sistemas que têm baixo consumo de energia, podem ser associados com detectores de vento e chuva e evitar que as janelas fiquem abertas em condições adversas”, relatou.
Ventilação e clima
Coimbra colocou em pauta como tratar a ventilação natural diante da diversidade de climas no País. Segundo Santos, a ventilação natural pode ser de três tipos: controlada, quando o usuário tem controle total, “como em nossas casas”; higiênica, uma ventilação mínima em ambientes exigida, inclusive, por lei; e permanente, através de aberturas fixas, em telhados ou fachadas.
A ventilação higiênica é obrigatória em todos os tipos de clima e está presente na Norma de Desempenho, a NBR 15.575, conforme salientou a arquiteta. “É uma norma que tem as diretrizes para os profissionais garantirem conforto, saúde e segurança nas edificações. Existe desde 2008 e em 2013 passou a ser obrigatória, com força de lei. Uma das coisas que a norma fala é justamente sobre a parte de ventilação, uma renovação mínima de ar que tem que ter."
Em climas muito quentes, a especialista indica o uso da ventilação permanente prevista no projeto da construção, “por meio de aberturas no telhado, como lanternim, aberturas altas, com uma janela mais abaixo, para o ar fresco empurrar o ar quente. É o que chamamos de efeito chaminé”, contou.
A ventilação cruzada, quando se tem duas aberturas, uma porta e uma janela em paredes opostas, segundo ela exemplificou, é a mais indicada para climas quentes e úmidos. Santos alertou, no entanto, que ambas as técnicas devem ser usadas com parcimônia em climas secos. Nestes, o ideal é utilizar o resfriamento evaporativo, quando se tem espelhos d’água próximos ao local de ventilação, presentes nas obras de Oscar Niemeyer, ou plantas e vegetação.
Os tipos de janelas também devem ser considerados no planejamento do uso de ventilação natural. “Nós temos um regulamento técnico para eficiência energética de residências, o RTQR, temos um catálogo com a maioria das janelas mais usadas no Brasil e ali há alguns dados com relação ao percentual de entrada de luz natural e ventilação”, revelou Santos. Quanto a ambientes climatizados em que não será aproveitada a ventilação natural, pontuou, é importante que as janelas sejam bem vedadas para uma maior eficiência energética do ar-condicionado.
Em locais que apresentam intensa poluição no ar, a ventilação natural é impossibilitada, mas toda a atenção deve recair sobre os sistemas de filtragens, segundo ressaltou. É possível incluir sensores que medem a qualidade do ar, utilizar ventilação natural nas partes mais altas da edificação e, em locais em que a poluição é mais branda, Santos afirmou, pode ser usada a técnica do resfriamento evaporativo, “plantas e vegetação que filtram os poluentes e assim entra um ar com mais qualidade”.
Combate ao coronavírus
De acordo com as especialistas, a ventilação natural é importante aliada neste momento em que o País e o mundo combatem a pandemia ocasionada pelo novo coronavírus. Como dica principal do que fazer diante do retorno das atividades em locais como escolas, lojas, teatros, Santos apontou: “A primeira coisa é ter consciência e acreditar que a ventilação natural traz muitos benefícios, além de prevenir proliferação de bactérias e vírus, como coronavírus. Sabe-se que um ambiente arejado melhora nossas funções cognitivas, em relação a raciocínio, memória. Então é ter essa consciência de que um ambiente ventilado é sinônimo de um ambiente mais seguro e mais saudável.”
Tendo essa consciência, indicou a urbanista, deve-se “perseguir” a ventilação natural, dentro e fora de casa. “Quando sair, evitar lojas, restaurantes com climatização artificial. No caso de um teatro, cinema, ter certeza de que o sistema de filtro é eficiente e atestar isso. Porque às vezes a gente entra num ambiente fresquinho, com ar ligado, e tem aquela sensação de conforto, mas aquilo pode estar escondendo um ar viciado, contaminado. Tem que ter realmente muito cuidado com isso”, destacou.
Para saber mais sobre as estratégias bioclimáticas, Santos indicou a plataforma Projeteee, elaborada pelo Ministério do Meio Ambiente, que disponibiliza também dados climáticos por cidade. Ela citou ainda como exemplo de arquitetura bioclimática as obras de João Filgueiras, conhecido como o arquiteto Lelé. Na visão de Coimbra, são informações importantes a serem consideradas, que “colaboram com a sustentabilidade, com a qualidade de vida e com a saúde”.
Confira no vídeo: