F. Gonçalves*
A Petrobras anunciou em 8 de fevereiro passado, a efetivação da venda da Refinaria Landulfo Alves-Mataripe (RLAM), na Bahia, ao fundo soberano Mubadala, dos Emirados Árabes Unidos, por US$1,65 bilhão (dólares), estimado em pelo menos US$ 3,5 bilhões pelo Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo (INEEP). A venda se dá em continuidade ao processo de auto desmonte e entrega de ativos, até então restrito a poços e oleodutos. Esta é a primeira de um total de oito refinarias colocadas à venda.
Os petroleiros receberam a notícia com um misto de revolta e tristeza. A FUP e o Sindipetro-BA anunciam que já haviam decidido pela greve, caso as negociações para a venda da RLAM avançassem. O movimento paredista está sendo organizado e pode iniciar a partir do dia 17 de fevereiro, quarta-feira.
A seguir, uma breve retrospectiva sobre essa política para tentarmos entender como ela afeta o nosso bolso, o nosso futuro e a soberania nacional:
Em setembro de 2018, a Agência Nacional de Petróleo (ANP) acionou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) para analisar a quebra do monopólio da Petrobras, por esta deter 99% da capacidade de refino de petróleo no Brasil.
Ocorre que, a partir da Lei nº 9.478/1997 (Nova lei do petróleo), a Petrobras perdeu o monopólio da exploração e refino de petróleo no Brasil e, desde então, qualquer investidor poderia explorar petróleo e construir refinarias.
A quebra de monopólio deixou ainda mais evidente o potencial da Petrobras e dos brasileiros. Nenhuma petroleira estrangeira encontrou volumes significativos de petróleo ou se dispôs a quebrar o monopólio por meio de grandes investimentos e ameaçar a pretensa “ineficiência estatal” da Petrobras. Assim, a iniciativa privada se limitou a operar pequenas refinarias antigas e construir duas refinarias minúsculas, de modo que a capacidade privada de refino ainda é pouco maior que 1% do total nacional.
Por outro lado, a Petrobras investiu pesado em pesquisa e tecnologia, disputou e venceu leilões, descobriu e viabilizou a produção de petróleo nos campos do pré-sal e investiu pesado na modernização das refinarias, inclusive da RLAM, para produzir derivados menos poluentes atendendo o protocolo de Kyoto (2005).
A primeira lógica neoliberal foi desnudada: Pra quê correr riscos se é muito mais fácil comprar poços descobertos e/ou produzindo e refinarias já depreciadas e com investimentos amortizados?
Em segundo plano, estudos realizados pela PUC-RJ, apontam que a venda de refinarias, tem como objetivo criar monopólios menores, privados, sem competitividade, e sem compromisso algum com a soberania nacional ou com as necessidades do povo.
Em terceiro plano, sob a direção de Pedro Parente (PSDB), no governo Temer (PMDB), em outubro de 2016, a Petrobras adotou a paridade de preços de preços internacional (PPI), que inclui no preço de derivados custos como de frete de navios, custos internos de transporte e taxas portuárias (custo de internação) – mais margem para remunerar riscos como volatilidade da taxa de câmbio e dos preços sobre estadias em portos e lucro, além de tributos, tendo como referência os preços do Golfo do México.
Sim, isso mesmo que você leu: nós, consumidores, pagamos custo de internação e preço de mercado internacional, em dólares, pela gasolina, diesel, gás de cozinha etc., mesmo que o petróleo tenha sido produzido e refinado no Brasil a um custo inferior. Daí a alta de preços absurda experimentada a partir de outubro de 2016. Com isso, as refinarias norte-americanas do Golfo do México tiveram seus preços viabilizados, e conquistaram parte do mercado nacional, que antes pertencia à Petrobras.
Ou seja, a venda das refinarias da Petrobras tem profunda relação com a atratividade e abertura do mercado nacional às refinarias norte-americanas do Golfo do México.
Como se não bastasse, junto com a RLAM estão sendo vendidos 669km de dutos, três terminais terrestres e um terminal marítimo. Mas o pior talvez nem seja isso. Assim como a venda de alguns campos de petróleo foram efetuados para estatais como a norueguesa Equinor ou as chinesas CNOOC e CNODC, quem compra a RLAM é um fundo soberano dos Emirados Árabes Unidos, um fundo estatal. Esse governo irresponsável está “privatizando” nossas riquezas para “empresas estatais”.
Maior atentado contra a soberania nacional e maior atestado de incompetência são absolutamente impossíveis.
*F. Goncalves, é engenheiro civil, delegado da Associação dos Engenheiros da Petrobras para a Grande São Paulo (AEPET-Sampa).