Jornal da USP*
Um modelo para estimar o impacto da abertura de áreas protegidas de floresta para implantação de projetos de mineração é proposto em pesquisa da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP). O trabalho avaliou os planos da Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca), localizada entre os Estados do Amapá e Pará, na Amazônia, com área de 47.000 quilômetros quadrados (km²) e calculou que a liberação da mineração levaria, em 30 anos, a perda de 7.626 km² de florestas apenas com a construção de estradas de acesso às minas. O estudo mostra que os danos à mata nativa afetam de diversas formas os ecossistemas, sugerindo o estabelecimento de áreas estratégicas de preservação, com mineração proibida, além de medidas como a implantação mais criteriosa das estradas. A pesquisa é descrita no artigo Strategic planning to mitigate mining impacts on protected areas in the Brazilian Amazon, publicado pela revista científica Nature Sustainbility em 28 de julho.
“Recentemente, diversas propostas têm sido apresentadas para abertura de territórios atualmente protegidos, como terras indígenas, com a finalidade de explorar minerais específicos e estratégicos. Além disso, propõe-se uma simplificação dos processos de licenciamento ambiental, responsável pela avaliação prévia dos impactos de novos projetos”, relata ao Jornal da USP a engenheira ambiental Juliana Siqueira-Gay, que desenvolveu a pesquisa para sua tese de doutorado, defendida na Poli. “É nessa conjuntura que o estudo se insere e faz uma análise de cenários na Reserva Nacional de Cobre e Associados. Essa área tem 90% de seu território protegido por unidades de conservação de uso sustentável, proteção integral e terras indígenas, e sua abertura esteve em debate nos últimos anos.”
De acordo com a engenheira ambiental, um modelo de uso e cobertura de terra foi calibrado e validado para projetar cenários de 30 anos de desenvolvimento na Renca. “Usando a localização de depósitos minerais na região e informações sobre o relevo, uso do solo e hidrografia, foram modeladas novas estradas necessárias para acesso às novas minas”, diz. “Dessa forma, foi possível estimar não apenas os impactos em decorrência da expansão da área minerada, mas também todos as implicações indiretas resultantes da infraestrutura de apoio para implementação e operação desses projetos. Com isso, estimamos de uma forma inovadora os potenciais impactos de novos projetos na região.”
Os resultados do estudo mostram a importância da proteção da paisagem para evitar e minimizar os impactos nas florestas e ecossistemas, afirma Juliana. “A abertura de todas as áreas protegidas na região resultaria na perda de 183 km² de floresta resultante diretamente da abertura de novas minas”, ressalta. “Isso corresponde à mais da metade de toda área de mineração industrial do estado do Pará, que é hoje o estado com a maior cobertura de mineração da Amazônia, segundo dados do Mapbiomas, com 337 km² em 2020”. O MapBiomas é uma rede de ONGs, startups de tecnologia e universidades que mapeia as mudanças do uso da terra no Brasil a fim de estimular a conservação e desse modo enfrentar as mudanças climáticas.
Segundo a pesquisadora, o estudo demonstra a importância da determinação de áreas a serem estrategicamente protegidas para evitar e minimizar os impactos da mineração. “Mostramos que para atingir depósitos em locais remotos, como muitas vezes acontece em projetos de mineração no mundo, são necessárias estradas longas que causam perda direta de ecossistemas com alta relevância para conservação”, exemplifica. “Outras estradas, com um desenho mais compacto, também podem causar significativa fragmentação de habitats, sendo necessária, portanto, uma robusta verificação das consequências da construção de infraestrutura de suporte à mina.”
Após defender a tese de doutorado na Poli, em maio de 2021, a engenheira trabalha como gerente de projetos no Instituto Escolhas e continua lidando com mineração na Amazônia e desmatamento.