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17/10/2023

Chocolate com pimenta e engenharia

Jéssica Silva – Comunicação SEESP

 

Engenheiro de alimentos desenvolve receita saudável de chocolate com zero açúcar e fonte de fibras. Como próximo desafio, quer elaborar fórmula do doce sem gorduras prejudiciais à saúde.

 

Um engenheiro com uma missão: tirar do chocolate o título de vilão dos alimentos. Isso porque a popular guloseima, em geral, tem uma grande concentração de açúcar em sua composição.

 

Gabriel Almeida Eng de Alimentos 450O engenheiro de alimentos Gabriel Almeida. Fotos: Acervo pessoalFoi assim que Gabriel Almeida iniciou sua trajetória de pesquisa no mestrado na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). E para tanto, encontrou na pimenta dedo-de-moça o ingrediente especial de que precisava. O resultado foi um chocolate amargo, 55% cacau, sem adição de açúcar e com valor nutricional, com a presença de fibras.

 

A pesquisa iniciada em 2019 foi concluída no início deste ano, quando Gabriel começou seu doutorado na mesma área. Além da redução de açúcar, o engenheiro visa trabalhar com a substituição de gordura nos alimentos industrializados, sobretudo a saturada.

 

Doenças cardiovasculares, diabetes e câncer estão relacionados ao alto índice de ingestão desses ingredientes, conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS). “Há o consenso de que os alimentos industrializados, processados e ultraprocessados, são altamente perigosos para a saúde. A engenharia precisa pensar e desenvolver novos produtos mais saudáveis, usar a indústria a nosso favor”, defende Gabriel.

 

Não se sabe ao certo quem deu o primeiro passo na mistura de cacau que originou o famoso doce, mas estima-se que são cerca de 4.000 anos de história. No Brasil, o consumo anual  desse alimento chega a ser de 3,6 quilos por pessoa, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Amendoim e Balas (Abicab). Já na Europa o número dobra, a Estônia lidera ranking de consumo de chocolate com 8,5 quilos por pessoa, seguida da Alemanha (8,4 kg), Áustria (8 kg) e Suíça (7,9 kg), de acordo com pesquisa da Euromonitor.

 

“Estudando as tecnologias dos alimentos me encantei pela que está por trás do chocolate, desde a plantação do cacau, colheita e processamento”, conta o engenheiro de alimentos em entrevista ao SEESP.

 

De onde surgiu a ideia da pesquisa?

Sempre fui muito curioso para tudo e principalmente com comida. Na escola era bom em matemática e química e, a partir daí, que fui cursar Engenharia de Alimentos. Desde a infância sempre fui muito gordinho, do Ensino Médio à faculdade engordei mais de 20 kg. Quando comecei a ver bioquímica, toda a parte do metabolismo do corpo, no segundo ano da graduação, tive interesse em emagrecer e busquei isso. Logo em seguida, estudando as tecnologias dos alimentos, me encantei pela tecnologia por trás do chocolate, desde a plantação do cacau, colheita e processamento. Foi o que me encantou e eu queria trabalhar com isso! Encontrei na pós-graduação a professora titular da FEA, Helena Bonini, que trabalhava com uma linha de chocolate mais saudáveis. Então, uni o útil ao agradável, eu queria tirar a vilania atribuída ao chocolate.

 

E como entrou a pimenta na história?

A receita de chocolate com pimenta é antiga, sei que muita gente vai lembrar da novela, mas eu sempre achei interessante esse antagonismo com o doce do chocolate. Usamos a pimenta dedo-de-moça, que não é tão forte, não agride o paladar. Além da inovação no perfil sensorial, chegamos a um produto que tem um adoçante natural, que é a estévia, e com valor nutricional, pois apresenta 5g de fibra (numa porção de 25g), fazendo do chocolate um produto prebiótico. Ainda, a pimenta é acrescentada in natura, em pó, diferentemente de outras marcas que colocam o aroma. O que é justamente o propósito da pesquisa, um chocolate mais saudável.

 

A partir desse sucesso no produto, o que foi realizado?

A pesquisa foi finalizada. Começamos testando os ingredientes, depois as condições de processo, que é a parte da engenharia, de entender quais seriam as melhores condições para atender a produção em grande escala; e fizemos uma planta piloto, em parceria com o Instituto Tecnológico de Alimentos (Ital), em Campinas. Com o produto, realizamos as análises de qualidade, estudo de modulação de gostos e sabores, e vimos também a viabilidade econômica. É um produto fruto de uma pesquisa, mas tem potencial para atrair investidores e ser lançado ao mercado. Atualmente estamos fazendo testes para ampliar esse chocolate com outras especiarias. 

 

Pesquisa do chocolate Gabriel Almeida Eng de AlimentosProtótipo do chocolate desenvolvido por Gabriel, com zero adição de açúcar e fonte de fibras

 

 

Isso no escopo do seu doutorado?

Sim, além da substituição de açúcar, eu quero trabalhar com a substituição de gordura também, principalmente a gordura saturada. Temos no País a regulamentação, vemos nas embalagens destacadas as informações de quantidade de açúcar, de gorduras nos produtos processados e ultraprocessados. A preocupação em reduzir o consumo desses itens que fazem mal à saúde é mundial. Esse é o desafio do meu doutorado.

 

Não é todo dia que vemos um engenheiro trabalhando com chocolates, mas a alimentação saudável é uma questão importante a se revolver no País e no mundo todo. Qual o papel da engenharia nesse sentido?

O curso de Engenharia de Alimentos é bem amplo, mas temos esse papel crucial de estar em favor da sociedade. Sabemos que hoje o índice de obesidade é alto no mundo todo, somado ao de sobrepeso chega a 2 bilhões de pessoas. Há o consenso de que os alimentos industrializados, processados e ultraprocessados, são altamente perigosos para a saúde. A engenharia precisa pensar e desenvolver novos produtos mais saudáveis, usar a indústria a nosso favor, reinventar alimentos processados aliados à nossa saúde. E para isso é preciso investir em ciência, em pesquisa.

 

 

 

 

 

 

 

 

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