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29/03/2012

Metrô de São Paulo ou a Operação Cavalo de Tróia

Por José Roberto Bernasconi*

A competitividade de um país em um cenário internacional marcado pela recessão europeia, pelas dificuldades econômicas das nações desenvolvidas e a provável diminuição do crescimento da China, com o acirramento da concorrência pelos mercados mundiais, é dada por sua capacidade de produzir inovação e tecnologia em produtos de alto valor agregado e com custos competitivos. Nessa conjuntura, a situação do Brasil é preocupante, especialmente quando um estado tão importante para o PIB nacional, como São Paulo, dá sinais de que pretende recorrer à inteligência estrangeira –mais exatamente espanhola– em setor tão fundamental como o de projetos de engenharia para o desenvolvimento da infraestrutura metroviária na capital e na Grande São Paulo.

Se essa intenção for levada à prática pelos governos paulista/paulistano na expansão do metrô de São Paulo, que possui plano de investimentos de R$ 60 bilhões até 2018, na ampliação de três linhas já existentes e a criação de duas novas linhas, os governantes do estado e da prefeitura de São Paulo estarão incentivando a desindustrialização do país e a transferência de empregos e recursos para a Espanha. E o que é pior: tudo pago com dinheiro brasileiro. A justificativa alegada para essa iniciativa, de que “hoje temos carência de engenheiros para a execução de projetos” é, no mínimo, um equívoco. A causa fundamental de o metrô paulistano não conseguir se expandir na velocidade suficiente para atender ao aumento da demanda é a falta de planejamento, não de engenheiros ou de profissionais de projeto. O fato de o Metrô/SP ter construído apenas dois quilômetros de linhas por ano nos últimos 32 anos deve-se a diversos fatores, entre eles, a prolongada recessão que acometeu o Brasil nos últimos 25 anos (1980-2005), diminuindo os recursos e o investimento público em transportes, assim como nas demais áreas de infraestrutura. E, sobretudo, pela falta de planejamento rigoroso e consistente, que preveja e assegure no orçamento recursos compatíveis com as necessidades de expansão da rede metroviária.

O Brasil tem cerca de 20 mil empresas de projeto de arquitetura e engenharia, distribuídas pelo país, a maior parte delas localizada em São Paulo. Essas empresas foram responsáveis por projetos do Metrô paulistano, desde seus primórdios, de hidrelétricas como Ilha Solteira, Porto Primavera, Jupiá, entre outras, além de projetos de portos, aeroportos, de rodovias-símbolo, como a dos Imigrantes, Bandeirantes e Ayrton Senna, por exemplo, e possuem um know-how acumulado a duras penas e com grande investimento, dos profissionais, boa parte deles com mestrado e doutorado, e da sociedade, por meio de inversões em universidades públicas com faculdades de engenharia de ponta, que formam e especializam esses profissionais de alto nível.

A engenharia é uma das bases mais fortes para dar suporte à inovação, ao incremento tecnológico e, portanto, à competitividade de um país. Estados Unidos, Europa – especialmente Espanha, Inglaterra, Alemanha, França e Bélgica –, Japão e China têm pleno conhecimento disso e não permitem que empresas e profissionais estrangeiros atuem livremente em seus territórios. A China, que ostenta os maiores índices de crescimento do PIB industrial, só admite que empresas estrangeiras operem no mercado chinês por meio de joint ventures com empresas locais. Os Estados Unidos, os países europeus, China e Japão, entre outros, utilizam os projetos de engenharia e financiamentos para vender obras e equipamentos. O Brasil, atualmente um dos países mais visados pelas nações em crise econômica, tem uma oportunidade única para explorar essa situação privilegiada em seu próprio benefício. Para isso, as empresas brasileiras de projetos de arquitetura e engenharia podem contratar profissionais de países em dificuldades, como Portugal e Espanha, por exemplo, que trariam sua expertise e a compartilhariam com os profissionais brasileiros, transferindo conhecimento e tecnologia.

Os benefícios para o Brasil seriam visíveis, não somente no curto prazo, mas especialmente nas próximas décadas, com a melhoria da competitividade brasileira em áreas estratégicas e de grande valor agregado. Isto é fundamental para revertermos o atual quadro econômico brasileiro, no qual a indústria, que já representou 25% do PIB, hoje reduziu-se a menos de 15% – retrato vivo da desindustrialização do país – com o déficit na balança comercial industrial atingindo mais de US$ 90 bilhões.

Introduzir empresas estrangeiras de projetos nas grandes obras é como facilitar a entrada de um verdadeiro ‘Cavalo de Tróia’ no país. Esse risco pode e deve ser evitado se os governantes mirarem no exemplo do setor de óleo e gás, cuja política governamental exige no mínimo 65% de conteúdo nacional, incluídos nesse percentual os projetos de engenharia. Ou seja, da inteligência estratégica para o desenvolvimento sustentável do país.
 

*José Roberto Bernasconi é presidente da Regional São Paulo do Sinaenco (Sindicato da Arquitetura e da Engenharia)


Imprensa - SEESP


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