As três medidas fazem parte de um receituário há tempos defendido por especialistas em mobilidade urbana como saída para a crise atual vivenciada em São Paulo. Segundo dados da Secretaria Estadual dos Transportes Metropolitanos, a Capital dispõe de cinco linhas que perfazem quase 75km de metrô e a Região Metropolitana como um todo, de 260km de trens. Somados, os dois modais atendem, conforme o titular da pasta, Jurandir Fernandes, 7,2 milhões de usuários por dia. A malha está superlotada.
O governo paulista anuncia investimentos de R$ 45 bilhões nos próximos quatro anos, de acordo com o PPA (Plano Plurianual do Estado). Segundo a Secretaria dos Transportes Metropolitanos, serão R$ 29,9 bilhões para a implantação de mais 30km de linhas de metrô até 2014 e o restante destinado à modernização das seis trechos da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e expansão em 44km. Como observa Nazareno Stanislau Affonso, coordenador do MDT (Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para Todos), de fato, tem havido inversões nos últimos anos, mais ainda aquém das necessidades. Campanha lançada pela Fenametro (Federação Nacional dos Metroviários) e por dez sindicatos desses trabalhadores, entre os quais o de São Paulo, reivindica que 2% do PIB (Produto Interno Bruto) sejam destinados para assegurar sistema de alta capacidade com qualidade não apenas à metrópole, mas a todo o País. Hoje, segundo documento elaborado pelo Ilale (Instituto Latino-Americano de Estudos Socioeconômicos) a pedido dessas entidades, são investidos em torno de 0,5% do montante em transporte.
Além de concordar com a proposta, Laerte Conceição Mathias de Oliveira, vice-presidente do SEESP, ressalta que é fundamental planejar os investimentos para que o sistema de alta capacidade funcione como rede estruturadora e integradora de todos os modais. “Isso não ocorreu. O poder público dizia não ter recursos para a expansão da malha. Em 1990, havia apenas 36,4km de metrô e já apontávamos o problema. A mobilidade, contudo, não era foco de preocupação dos governantes.” Fernandes garante que isso mudou. “Hoje estamos fazendo. Com as novas linhas previstas, vai haver melhor redistribuição e reacomodação de passageiros.” Contudo, ele reconhece que não resolverá, apenas atenuará a superlotação – agravada pelo crescimento da demanda.
Como afirma Edilson Reis, diretor do SEESP, colaborou o acréscimo de 40% de cidadãos que passaram a usar o sistema metroferroviário a partir do bilhete único. Para Fernandes, a incorporação de novas linhas, como a amarela, que atende a zona sul da cidade, também elevou o número de pessoas, já que a maioria dirige-se à região central para trabalhar e migrou para o sistema. “Houve um salto súbito de 1,2 milhão entre outubro e dezembro de 2011, com o início de sua operação”, explica.
Na sua opinião, mesmo com os investimentos previstos – que incluem monotrilho na zona leste e uma das novas linhas (branca) também atendendo a região – o desafogamento depende de outras ações, como aproximar o emprego da moradia. Até porque, segundo ele, a tendência é de que continue a se ampliar o número de usuários, que passará para 9,3 milhões em 2014.
Iniciativas necessárias
Descentralizar os postos de trabalho é fundamental, apontam os especialistas. Hoje, ¾ encontram-se no centro da Capital. Considerando-se a região expandida, como amplamente divulgado pela mídia, há 400 mil imóveis vazios, de acordo com o censo de 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Assim, o caminho seria tanto possibilitar aos cidadãos moradia nesse local quanto garantir empregos nos bairros.
Além disso, Oliveira acredita que contribuiria para a solução do problema a instituição do ente metropolitano. “Poderia assumir o papel de articulador da mobilidade em toda a região. Como metrô e CPTM são da alçada estadual, os municípios não se preocuparam em se esforçar para investir no sistema. O governo federal também teria que alocar recursos.”
Quanto aos outros modais, Reis informa que, ainda a partir do bilhete único, os ônibus tiveram um adicional de 60% no número de passageiros, passando a 8 milhões. “E temos os mesmos 15km licitados de antes.” A concorrência com o transporte individual faz com que perca sua característica de sistema de média capacidade. Assim, na sua análise, além de ampliação significativa da rede metroferroviária – que deveria ser hoje de 300km para atender a grande metrópole –, seria preciso garantir aos ônibus faixas segregadas. Ele revela que esses veículos coletivos ocupam 4.500km dos 17 mil km de vias da cidade. Há apenas 130km de corredores exclusivos e um único sistema que cumpre o papel de média capacidade, o Expresso Tiradentes, o qual ocupa apenas 8km. “Se tivéssemos BRTs (veículos rápidos sobre pneus), poderíamos atingir 30 mil passageiros por hora/sentido.” Reis defende ainda a construção de mais monotrilhos.
Para Affonso, a solução passa por mudar a lógica instalada a partir dos anos 50, em que houve sucateamento da ferrovia e o transporte individual passou a ser estimulado. Hoje, 45% das viagens são feitas dessa forma, ante 55% por coletivos. “O sistema de ônibus deve se apropriar do viário.” Em estudo, o consultor Adriano Murgel Branco defende que os carros passem a deter 30% dos deslocamentos e os sistemas públicos, 70%. O coordenador do MDT enfatiza que a restrição ao uso do automóvel, o que incluiria política pública de estacionamento, seria importante nesse contexto.
Soraya Misleh
Imprensa – SEESP
Publicado originalmente no JE, Edição 411
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