Um conceito inovador de projetar e construir residências com foco na sustentabilidade e na eficiência energética é a principal proposta do protótipo de uma casa do futuro que une a tradição indígena brasileira com as tecnologias mais avançadas. Inspirada na cultura tupi-guarani, foi batizada de Ekó, que significa “viver” ou “maneira de viver”.
Desenvolvido por uma equipe transdisciplinar formada por docentes e estudantes de diversas universidades brasileiras, o projeto é coordenado pela USP (Universidade de São Paulo) e pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina). “A meta é que os alunos participem de todo o processo, desde o desenho até a construção. Num futuro próximo, vamos ter que mudar a nossa forma de projetar e construir e quem fará isso serão esses jovens”, explica José Ripper Kós, professor da UFSC e coordenador de Arquitetura e Projetos da Ekó House.
Na visão do pesquisador, um dos diferenciais do trabalho é a integração entre diferentes áreas, aspecto fundamental para a construção de uma sociedade mais sustentável. “A maior parte dos estudantes envolvidos são de arquitetura e engenharia, mas temos também alunos de design, marketing e jornalismo. Essa perspectiva de integração terá que acontecer cada vez mais no mercado de trabalho, portanto, a Ekó House é uma das iniciativas que apontam para esse caminho”, salienta.
O desenvolvimento do protótipo fundamenta uma série de pesquisas, que além de dar amparo aos projetos da casa sustentável, embasa uma dezena de trabalhos acadêmicos que incluem iniciação científica, mestrados e doutorados. “Outra meta é formar recursos humanos para que esse conhecimento seja difundido em prol da sociedade. E o principal canal é demonstrar a viabilidade da montagem dessa casa”, enfatiza a engenheira Claudia de Andrade Oliveira, professora da FAU/USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) e coordenadora da montagem da Ekó House.
O projeto também foi idealizado para concorrer ao Solar Decathlon Europe 2012, uma competição internacional que acontece em setembro próximo, em Madri, na Espanha. “Durante a competição, serão dez provas que avaliarão quesitos como inovação, desempenho energético, conforto térmico, viabilidade de mercado, como a proposta é apresentada ao público, entre outros, daí a importância do trabalho ser pensado de maneira global”, enfatiza Kós.
Estrutura
A residência possui 47 metros quadrados de área interna, divididos em banheiro, cozinha, quarto, salas de estar e jantar. Com foco na flexibilidade, a estrutura foi projetada com base na modularidade para que se adapte às necessidades de diferentes famílias e haja facilidade na montagem e no transporte.
Para dar conta de tal tarefa, a equipe optou pelo sistema de construção industrializada em painéis de madeira com isolamento térmico embutido. Os módulos são constituídos de estrutura de vigas e pilares de madeira e painéis de OSB (oriented strand board). Como revestimento, foram usadas placas cimentícias e vidro nas partes laváveis, como no banheiro e na cozinha. As instalações hidráulicas e elétricas foram posicionadas entre os painéis de madeira e os revestimentos para facilitar a manutenção.
As varandas da casa também são tecnologicamente dinâmicas. Foram instalados painéis e persianas automatizados que se adaptam às condições ideais de iluminação natural, controlam as trocas de calor e garantem privacidade. “Por meio desse sistema de automação, o morador consegue definir como ele quer que a casa funcione. É possível programar não só a movimentação das persianas, como controlar e registrar o quanto de eletricidade é gasto na residência, entre outros. Essa é uma nova forma de os usuários se relacionarem e se interarem com o meio ambiente de uma forma consciente”, explica Oliveira.
Eficiência energética
A casa sustentável utiliza painéis fotovoltaicos e coletores que transformam a radiação solar em energia elétrica e térmica. “Durante o dia a produção atinge o pico, mas o consumo normalmente é menor. E como a casa não possui acumuladores, a eletricidade sobressalente vai para a rede de distribuição gerando créditos que podem ser usados durante a noite. Apesar de não ser muito utilizada no Brasil, existem protocolos que permitem que cada residência seja uma miniusina geradora de eletricidade”, detalha Oliveira.
A pesquisadora acrescenta que o desenvolvimento do protótipo está inserido em um convênio entre a USP e a Eletrobras que visa lançar as bases de uma indústria nacional de residências energia zero – alimentadas apenas por energia solar. “Além do financiamento da Eletrobras, o projeto conta com uma série de parceiros da iniciativa privada que doam materiais e mão de obra técnica.”
Sustentabilidade
A Ekó House possui ainda sistemas de gerenciamento de resíduos. No banheiro foi colocado um vaso sanitário seco, importado da Suécia, que dispensa o uso de água potável e faz a compostagem de forma eficiente, gerando adubo para ser utilizado no jardim. Os efluentes do chuveiro, lavatório e máquina de lavar roupas também serão tratados por um sistema natural híbrido de filtros e tanques de plantas que purificam a água que pode ser reutilizada para regar jardins ou lavar pisos, além de fazer parte da composição estética no ambiente externo da residência.
Conforme Oliveira, a casa se adaptaria a qualquer região do País. “Futuramente, a equipe pretende produzir protótipos em vários locais para avaliar a adequação dos sistemas e a questão da manutenção – quais as possibilidades que o usuário terá para manter sozinho todos esses sistemas funcionando bem”, conclui.
Lucélia Barbosa
Ciranda Internacional da Comunicação Compartilhada