Quando escreveu, em 1960, “The Golden Age of Brazil-1695/1750: growing pains of a colonial society” (A Idade de Ouro no Brasil: dores de crescimento de uma sociedade colonial), o historiador inglês Charles Ralph Boxer (1904-2000), com certeza, levou em conta para título de sua obra os inúmeros percalços que dificultaram a marcha da civilização brasileira nos séculos XVII e XVIII, especialmente a fase anterior ao ministério do marquês de Pombal (1699-1782), cujas decisões lançaram as bases da independência brasileira em 1822. Talvez não imaginasse que, em pleno século XXI, o Brasil ainda estaria às voltas com as dores provocadas por um crescimento que se dá aos solavancos, quase sem planejamento, à medida que as exigências do desenvolvimento tornam certas decisões inadiáveis.
Um bom exemplo disso é o apagão logístico que se deu nas rodovias e portos dos Estados de São Paulo e Paraná, que, de certo modo, até que demorou para acontecer, embora viesse sendo anunciado há pelo menos uma década. Ainda que previsível, o apagão logístico nunca foi encarado como suficientemente ameaçador para merecer um tratamento prioritário e, assim, as obras de infraestrutura tanto viária, ferroviária como portuária continuaram a ser executadas com lentidão, enquanto outras sequer saíram do papel, como as projetadas pontes e túneis submersos para ligar as duas margens do Porto de Santos.
Já a produção agrícola voltada à exportação começou a crescer sem medidas e sem planejamento. Nunca houve por parte do governo nenhuma preocupação em estimular o aumento da capacidade de armazenamento de grãos. Resultado: sem silos, os caminhões foram convertidos em depósitos improvisados e as rodovias transformadas em pátios, com a distribuição dos prejuízos entre a sociedade. Agora, com o caos instalado, parece que as autoridades estão dispostas a seguir o exemplo dos EUA, que dispõem de capacidade de silagem para duas safras.
Obviamente, os obstáculos que impedem o crescimento do País não se limitam a isso. Não dá para imaginar o Brasil avançando ao ritmo chinês enquanto dispuser de um sistema de transporte rodoviário precário e custoso, malha ferroviária exígua, portos e aeroportos congestionados e um potencial hidroviário, praticamente, inexplorado. Mais ainda: o desenvolvimento do País vai continuar em xeque enquanto não mudar uma mentalidade atrasada que impede que órgãos de fiscalização funcionem 24 horas.
Basta lembrar que, segundo estudos da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), o tempo de liberação de uma carga no País é quase 55 vezes maior que nos terminais de Xangai e Singapura. O levantamento mostra que, no Brasil, o tempo médio de liberação de uma carga é de 175 horas, ou seja, mais de uma semana, enquanto em Xangai e Singapura é de quatro horas. Mais: uma tonelada de produtos farmacêuticos movimentada no Aeroporto do Galeão, de valor equivalente a R$ 35 milhões, teve custo de armazenagem, em 2012, de R$ 287 mil, enquanto no Aeroporto de Heathrow, em Londres, foi correspondente a R$ 17,8 mil e no de Singapura a R$ 7,1 mil. É o chamado custo Brasil.
Não é só. A esses obstáculos deve ser acrescida a escassez de mão de obra qualificada, que impede que cargos importantes sejam preenchidos nas empresas. Sem contar a falta de pesquisas que busquem novas tecnologias que possam diminuir custos e obter maior produtividade. Neste caso, é de observar que há no País carência de políticas de fomento à pesquisa.
Naturalmente, todas essas dificuldades não haverão de impedir o crescimento do País, que, com uma população superior a 180 milhões de habitantes, já se afigura como um dos grandes mercados mundiais. Mas é claro que, se superar esses obstáculos operacionais, ainda que com dores, haverá de crescer a um ritmo mais intenso.
* por Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC)
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