Diante dos problemas apresentados logo nos primeiros dias do ciclo de escoamento da safra agrícola de 2014, está claro que as medidas paliativas adotadas pela Secretaria Especial de Portos (SEP), Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) pouco adiantarão para evitar o caos no trânsito em direção ao Porto de Santos. E que, se os prejuízos acumulados em seis meses de 2013 pelo Polo Industrial de Cubatão chegaram a R$ 1,5 milhão de custo de horas-extras e perdas de escoamento de produtos e recebimento de matérias-primas, neste ano a previsão tem números ainda mais assustadores.
Até porque a expectativa oficial é que haverá um crescimento de 10% na safra deste ano, em relação ao total colhido em 2013. Isso significa a provável repetição do pesadelo vivido pela região no ano passado, quando operários e executivos ficaram retidos até quatro horas dentro de ônibus e automóveis que os transportam para o local de trabalho ou para suas casas, sujeitos a acidentes em locais de difícil acesso. E, principalmente, expostos a assaltos, os chamados “arrastões”. Sem contar as crianças que deixaram de ir às escolas e as ambulâncias que ficaram impedidas de circular.
Foto: José Mário Alves Silva
Caminhões isolaram cidades da Baixada Santista, na manhã desta terça-feira (18/02)
Os prejuízos não se limitam ao Polo Industrial de Cubatão, sem dúvida, o mais afetado, já que o município é cortado pelas duas rodovias que interligam o Planalto paulista ao Porto de Santos. Há prejuízos incalculáveis para as demais empresas – transportadoras e comissárias de despachos e seus clientes, que têm sua existência umbilicalmente ligada à atividade portuária. No ano passado, a média foi de 10 mil caminhões por dia em direção ao porto, 300 a mais do que em 2012.
Obviamente, ninguém se opõe ao crescimento da safra agrícola, que tem sido responsável pelo superávit que a balança comercial ainda apresenta. O que se questiona é que um setor, no caso o agrícola, continue a prejudicar os demais segmentos ligados ao comércio exterior, em razão de uma infraestrutura defasada e deficiente.
Na verdade, as autoridades se limitam a anunciar projetos que poderão aliviar o escoamento da safra, mas que incluem apenas obras de ampliação da malha rodoviária, em direção ao porto de Santos, como a duplicação do trecho da Rodovia Cônego Domênico Rangoni entre a Via Anchieta e a Usiminas, que deverá estar concluída em outubro. Ou a remodelação da entrada da cidade de Santos ou a construção da Via Arterial Porto-Indústria, margeando a via férrea do antigo ramal da Santos-Jundiaí, que ainda está só no papel.
Ora, essa opção radical pelo modal rodoviário não vai dar certo. É preciso ampliar também a oferta do modal ferroviário. E mais importante: criar condições para que a safra agrícola do Centro-Oeste seja escoada por outros portos, especialmente do Norte e Nordeste. Sem deixar de construir silos para armazenagem dos grãos próximos ao centro de produção. Caso contrário, os caminhões continuarão a cumprir o papel de silos dos produtores.
Enquanto isso, as autoridades insistem em apostar que a ameaça de multas pesadas para caminhoneiros e terminais que desobedecerem ao agendamento da descarga será suficiente para disciplinar o tráfego. Será?
* por Mauro Lourenço Dias, engenheiro eletrônico, é vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)