O advogado que age com comprovada imperícia, impedindo que seu cliente consiga uma posição mais vantajosa no processo, pode ser responsabilizado com base na Teoria da Perda de uma Chance. Com este entendimento, a 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve, integralmente, sentença que condenou um advogado a pagar R$ 10 mil, a título de danos morais, por ter prejudicado seu cliente. O erro da estratégia jurídica levou à prescrição do direito que estava sendo buscado, deixando o reclamante sem receber verbas rescisórias.
Após analisar as reais possibilidades de o autor obter êxito na demanda, os magistrados das duas instâncias concluíram pela culpa do profissional, em função do nexo de causalidade existente entre a sua conduta e o resultado final — a perda de direitos trabalhistas.
‘‘Na prática, era corriqueiro que, antes do pedido de habilitação do crédito, houvesse o ajuizamento de ação trabalhista, para consolidar o crédito em favor do empregado, o que demonstra, conforme fundamentando na sentença, o erro grosseiro do advogado que requereu diretamente a habilitação’’, afirma o desembargador-relator, Ergio Roque Menine. A decisão é do dia 19 de dezembro.
O caso
O autor informou, na inicial, que trabalhou para a rede de lojas J. H. Santos de 1994 até 1997, quando o grupo veio a falir. Em vista da ruptura abrupta do Contrato de Trabalho, ele teve de constituir advogado e buscar na Justiça as verbas rescisórias não pagas pelo empregador. No caso, contratou um profissional indicado por seu sindicato, que estava atendendo os demais colegas, que amargavam a mesma situação.
O advogado optou habilitar o crédito dos trabalhadores no processo de falência do grupo empresarial, que tramitou na Vara de Falências e Concordatas de Porto Alegre, ao invés de entrar prontamente com as reclamatórias na Justiça do Trabalho. A estratégia, no entanto, não deu certo, porque a habilitação exigia a juntada de acordos homologados na Justiça Trabalhista — ou seja, era necessário o prévio ajuizamento das reclamatórias.
Em novembro de 2001, o advogado resolveu ajuizar a ação em nome do autor, mas já era tarde. A demanda foi julgada extinta pela vara local, pelo reconhecimento da prescrição do direito de ação. É que no processo do trabalho, a instituição da prescrição está disciplinada pelo disposto no inciso XXIX, do artigo, 7º da Constituição. O dispositivo assegura o direito de ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.
Em função da imperícia, que causou a perda de uma chance, o autor ajuizou ação indenizatória contra o profissional, pedindo o pagamento de danos morais em valor equivalente a 100 salários-mínimos.
A sentença
Ao julgar o mérito da ação indenizatória, o juiz de Direito Diego Diel Barth, da 2ª. Vara Cível da Comarca de Alegrete, disse que o advogado não desempenhou a contento as obrigações de meio, já que não tem obrigação de fim. Assim, em função do grave e grosseiro erro cometido, deve ser responsabilizado civilmente, pois causou inegável prejuízo ao autor.
O magistrado observou que, ao contrário do alegado na contestação, não havia controvérsia doutrinária na época sobre qual procedimento deveria ser adotado em casos análogos aos do autor. O único caminho correto, garantiu, era ajuizar a reclamatória trabalhista. Ou seja, o pedido de habilitação de crédito somente poderia ser considerado o procedimento correto, ainda que em tese e com ressalvas, caso o empregador ingressasse com a autofalência, mas continuasse funcionando plenamente, mantendo o vínculo empregatício com o autor.
‘‘Neste caso, ainda que se entenda que não houve a intenção deliberada de prejudicar o autor, certo é que o réu agiu, no mínimo, com imperícia, circunstância suficiente para consubstanciar a sua culpa e o nexo de causa entre o ato cometido pelo réu e o prejuízo sofrido pelo autor’’, escreveu na sentença.
Por fim, citou as disposições do artigo 32 do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94), que considera o advogado como responsável ‘‘pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa’’.
O julgador arbitrou a reparação moral em R$ 10 mil, levando em conta os cálculos da rescisória informados na manifestação do próprio réu perante o juízo falimentar e a Justiça do Trabalho, quando atuou em nome do autor.
Fonte: Revista Consultor Jurídico