A turbulência Boeing-Embraer e o interesse nacional
O anúncio pela Boeing no sábado (25/4) de que cancelaria o acordo prevendo a compra do controle da linha de jatos comerciais da Embraer por U$ 4,2 bilhões trouxe nova insegurança para a companhia aeronáutica brasileira e para o seu corpo técnico. A postura deve ainda render disputas entre as duas empresas, que já se acusam mutuamente de não cumprir o combinado, conforme noticiado pela mídia.
O processo, que começou a ser negociado em 2017 e avançou ao longo de 2018 e 2019, acabou encontrando pelo caminho diversos obstáculos, como os prejuízos enfrentados pela Boeing com os defeitos apresentados pelo 737 MAX e a crise em todo o setor, causada pela pandemia do coronavírus. Diante disso, chega-se a um impasse no qual, ao que parece, a Embraer tem tudo a perder, considerando-se os altos investimentos realizados para viabilizar a venda da sua linha mais lucrativa à companhia americana. Em 2019, foram R$ 485,5 milhões destinados apenas para separar a aviação comercial dos setores de defesa e jatos executivos, que não entrariam no escopo do contrato.
É lamentável que se viva esse cenário e é inevitável lembrar que melhor seria que os dirigentes da Embraer e o governo federal – detentor da golden share da companhia e, portanto, com poder de veto à transação – tivessem ouvido advertências e manifestações contrárias a esse processo.
Essa posição foi expressa pelo SEESP, que tentou demonstrar a importância estratégica da Embraer ao desenvolvimento nacional, ao avanço tecnológico e até à soberania brasileira. Nesse sentido, era inadmissível imaginar que o País corresse o risco de perder o controle de uma de suas principais empresas, criada pelo Estado, com investimento público, para ser um ator de ponta nesse setor.
À época, a entidade salientou em nota pública, mas também em reuniões com representantes da empresa, do governo e do Congresso Nacional a sua preocupação, especialmente com a entrega do conhecimento especializado e até do acervo de inovações da área de defesa que são aplicados às aeronaves comerciais. Além disso, havia o temor quanto à perda de postos pelos 18 mil empregados da Embraer, entre os quais 4.200 engenheiros, além de todo o impacto na cadeia produtiva ligada à companhia.
Tais questões fazem-se ainda mais presentes no cenário atual de incerteza quanto ao futuro da companhia, cujas ações já sofrem desvalorização. E mais uma vez é preciso que pensemos no interesse nacional. Pois ainda que a Embraer seja uma empresa privada e tenha optado pelo caminho que a levou a esse ponto, continua tendo a mesma importância estratégica para o País e seu avanço tecnológico, assim como continua sendo imperativo preservar os seus empregos.
O Estado brasileiro deve olhar para essa questão visando aos interesses coletivos da sociedade brasileira e agir para impedir que uma das nossas mais importantes empresas e todo o seu acervo tecnológico virem fumaça.
Eng. Murilo Pinheiro
Presidente do SEESP