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Eficiência energética para descarbonizar e impulsionar a nova indústria brasileira

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Soraya Misleh

 

A 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30) terminou com alguns avanços, mas uma grande lacuna: a inexistência de compromissos concretos de abandono dos combustíveis fósseis, principais responsáveis pelo aquecimento global. Embora não contemplado nos documentos oficiais, caminho a uma transição justa dessas fontes para outras mais limpas esteve no centro de um dos debates fundamentais para se fazer frente à emergência climática: a garantia de eficiência energética ao avanço da nova indústria brasileira.

 

O tema foi objeto de um dos inúmeros painéis de discussões que ocorreram paralelamente às mesas de negociação durante o evento. Vai ao encontro dos pilares da política governamental intitulada Nova Indústria Brasil (NIB), lançada em janeiro de 2024, que visa reindustrializar o País e torná-lo mais competitivo: sustentabilidade e descarbonização.

 

A atividade foi promovida pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), braço técnico do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) à implementação da NIB, na tarde de 14 de novembro no Pavilhão Brasil da Zona Verde da COP30. Ao abrir os debates, a diretora de Economia Sustentável e Industrialização do órgão, Perpétua Almeida, informou sobre o desenvolvimento do projeto “Eficiência energética como instrumento da política industrial”.

 

A iniciativa, afirmou ela, “une inovação, política pública e reindustrialização verde”, em prol de toda a sociedade. “Quando falamos de eficiência energética, estamos falando de milhões de brasileiros que merecem viver melhor em um planeta em transformação e de emergência climática, primeiro e último motivo de estarmos aqui na COP30”, destacou.

 

Redução da pobreza e das emissões

 

Como explicou Leandro Andrade, diretor do Departamento de Informações, Estudos e Eficiência Energética do Ministério de Minas e Energia (MME), a eficiência energética “é uma política consolidada no Brasil e aliada à garantia de suprimento para toda a população. Temos o Procel [Programa Nacional de Conservação de Energia] há 40 anos, [que confere] aquele selinho em eletrodomésticos, desde o choque do petróleo, que ajudou inclusive nas crises energéticas como a de 2001”.

 

Com base em dados do 2024, publicado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ele explanou que os ganhos de eficiência com a política consolidada alcançaram 12%, em comparação com 2005 (ano-base do índice adotado, o Odex). Os investimentos em pesquisa e desenvolvimento para tanto bateram, como frisou, “R$ 6 bilhões nos últimos dez anos, quase R$ 500 milhões ao ano”. Andrade foi categórico: “É a forma mais barata do setor de atender não só a redução das emissões de gases de efeito estufa, mas garantir eficiência em si, diminuindo a pobreza energética.”

 

Thiago Ivanoski, diretor de Estudos Econômico-Energéticos e Ambientais da EPE, observou que o Brasil, ressaltou o potencial brasileiro de liderar a transição energética, já que detém a “pole position” em fontes renováveis, com 90% de sua matriz elétrica limpa. Não obstante, há custos financeiro, social e ambiental na sua produção, como ponderou a analista de Produtividade e Inovação da ABDI, Márcia Oleskovicz, durante a COP30. Portanto, para que o País possa aproveitar seu potencial e liderar transição justa, ela defendeu o caminho da eficiência energética.

 

Financiamento e regulação

 

Superintendente de Desenvolvimento Produtivo e Inovação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), João Paulo Pieroni acredita que a eficiência energética traz oportunidades ao País, sendo “talvez uma das poucas vertentes que unem boa parte das qualificações elencadas na NIB”. São quatro eixos principais ao impulsionamento de uma nova indústria no País, como descreveu: que esta seja mais inovadora e digital, mais produtiva, mais exportadora e mais verde.

 

Assim, numa avaliação de projetos para financiamento pelo BNDES de empresas, produtos e processos, ele contou que a eficiência energética é um dos elementos importantes. Por exemplo, para maquinário produzido no Brasil, com conteúdo nacional. “Se o equipamento é verde, ou seja, de baixo carbono”, segundo informou, o banco permite o acesso a linhas ainda mais incentivadas para obtenção de recursos à sua aquisição e modernização do parque industrial.

 

Pieroni complementou: “Apoiamos projetos também de eficiência energética e que vão reduzir as emissões de gás carbônico na atmosfera. E tem uma evolução enorme do Fundo Clima [instrumento da Política Nacional sobre Mudança do Clima] a partir da NIB. O BNDES tinha até 2022 cerca de R$ 500 milhões por ano para incentivar essas linhas. Em 2024 foram mais de R$ 10 bilhões com recursos do Fundo Clima, e a expectativa é chegar a R$ 16 bi neste ano.”

 

O diretor do MME concluiu: “Temos uma agenda regulatória ambiciosa, de assegurar mais eficiência energética aos produtos da indústria nacional, colocando-a em pé de igualdade com outros países, como China e Estados Unidos.” Bishal Thapa, diretor de Estratégia e Impacto do Collaborative Labely and Appliance Standards Program (Clasp), ratificou: “Não há desenvolvimento sem eficiência energética.”

 

A organização internacional, como informou Oleskovicz, tem um acordo de cooperação técnica com a ABDI/MDIC e MME para mapeamento da cadeia de ar-condicionado e refrigeradores, bem como de todo o sistema de inovação no Brasil. O objetivo dessa parceria, segundo ela, é avaliar as necessidades de investimentos para que o País volte a ser competitivo, revertendo forte processo de desindustrialização nessas cadeias produtivas.

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Estresse térmico, saúde e segurança no trabalho

 

Painel no dia 13 de novembro último, no Pavilhão Brasil da Zona Verde da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), na cidade de Belém (PA), dedicou-se à saúde e segurança no trabalho em meio às mudanças climáticas.

 

Para Daniel Bitencourt, pesquisador da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), quem mais sofre com as variações térmicas é o trabalhador, que enfrentam ondas de calor, além das consequências de outros eventos extremos. “Tornados como no Paraná e inundações como no Rio Grande do Sul tiram suas casas, mas também empregos”, lamentou.

 

Conforme ele, os cenários já estabelecidos desde 2000 evidenciam que essas ondas de calor serão cada vez mais intensas e severas, tendência mais substancial na região tropical. “A temperatura já subiu mais de 1,5º e na próxima década, a elevação será ainda mais significativa”, alertou.

 

Como consequência, disse Bitencourt, trabalhadores mais expostos ao calor, como da construção civil e do campo, vivem estresse térmico, com impactos a sua saúde. Em ambientes internos, sobretudo em ambientes informais, como galpões de reciclagem, falta circulação e os telhados acabam por torná-los uma estufa. Urge, como recomendou, pensar em medidas como jornadas flexíveis ou mesmo pausas para proteção do trabalhador, vestimentas mais adequadas e planejamento das atividades laborais com uso das tecnologias para adaptação ao calor.

 

Além de medidas para mitigação da crise climática, o pesquisador da Fundacentro vaticinou: “A palavra de ordem é adaptação, seja nas políticas públicas, seja na edição de normas regulamentadoras e também no ambiente de trabalho.”

 

Ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, defendeu que no enfrentamento às mudanças climáticas temas do mundo do trabalho não fiquem “na lateralidade”. “Transição tecnológica, climática e justa só ocorrerá se as pessoas estiverem no centro do debate. Onde está a sustentabilidade com precarização, sem emprego e salário verdes?”, questionou.

 

Ele sugeriu que as pautas de reivindicações a serem apresentadas pelos sindicatos às empresas para negociação precisam incluir estresse térmico e proteção ao trabalhador. “Transição climática e ambiental têm que estar nos acordos e convenções coletivas de trabalho.”

 

Para além disso, asseverou: “É preciso discutir o modelo econômico, pautar a reforma da renda para que bilionários deem sua parte, assim como países ricos. Esse debate na COP30 tem que provocar um processo de mobilização se a gente quiser avançar.”

 

 

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