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21/09/2017

G1 faz reportagem sobre mulheres na engenharia

Do portal G1

Em 2015, as mulheres respondiam por 30,3% das matrículas em cursos de engenharia civil, e por 26,9% dos profissionais no mercado. Para as engenheiras, aumento da presença feminina ajudou na queda da discriminação.

As mulheres estão quebrando, ano a ano, o mito de que exatas não é coisa de menina. Dados do Censo da Educação Superior levantados pelo IDados a pedido do G1 mostram que o número de mulheres matriculadas em cursos de graduação em engenharia civil vem crescendo todos os anos desde 2007. Mas essa tendência ainda não está tão consolidada no mercado de trabalho. Segundo um levantamento do Conselho Federal de Engenheiros e Agrônomos (Confea), a tendência de alta ininterrupta só começou em 2012 e, ainda assim, cresce em um ritmo mais lento.

Segundo os dados do Confea, entre 1º de janeiro e 8 de agosto de 2017, 20.813 pessoas fizeram o registro no conselho na modalidade de engenharia civil. Destes, 14.971 eram homens e 5.842 eram mulheres. A presença feminina neste ano representou 28,1% do total de novos engenheiros e engenheiras com registro no órgão. Os dados do Censo mais recentes são referentes a 2015.

Estudantes, ex-alunas e professoras de engenharia civil relataram ao G1 que o aumento em termos numéricos foi acompanhado da redução da discriminação de gênero nas universidades. Formada na graduação em engenharia civil na década de 1990, Silva Santos, hoje professora da Univali, afirma que, hoje em dia, as mulheres estão em pé de igualdade em sua universidade. Mas ela lembra que, na sua época de estudante, já chegou a sofrer com o comportamento inadequado de professores.

Quando um professor decidiu elogiar publicamente Silvia e uma colega sua, acabou fazendo uma das famosas "piadinhas sem graça" sobre o papel da mulher. "Ele chamou a mim e minha amiga e falou para os outros alunos: 'Essas meninas, quando vão cozinhar em casa, calculam o volume do trigo para usar na massa com [cálculo] integral, e vocês não sabem calcular integral na prova'", lembra ela.

Naquela época, ela diz que as mulheres não protestavam ou denunciam as discriminações. "A gente respondia: 'Ah, é assim? Então espera pra ver'. A gente reclamava menos e agia mais."

Há alguns anos, Ana Paula Guedes tem uma agenda corrida com o trabalho de bailarina do programa Domigão do Faustão. Mas o pouco tempo livre ela preenche com a faculdade de engenharia civil. Atualmente no quarto ano, a jovem de 23 anos já chegou a transferir de universidade duas vezes para poder seguir conciliando o trabalho e os estudos.

"Eu amo dançar, essa é a minha paixão. Comecei a dançar com quatro anos de idade, comecei a dar aula aos 12 anos, dançar é o grande amor da minha vida", disse ela. "E sempre gostei muito de matemática, de construir. Quando pequena eu já desenhava casa, eu gosto muito desse lado de projetar. Inclusive é o que pretendo seguir: quero ser projetista. É algo que vai me permitir conciliar tudo, essa veia artística e esse lado do cálculo, que é meio louco, mas eu amo."

Arrastando uma multidão de 300 mil seguidores no seu dia a dia, que ela registra pelo Instagram, Ana Paula diz que não sofreu preconceito na área de engenharia por ser mulher. Pelo menos, não mais do que o preconceito que todas as mulheres brasileiras sofrem na sociedade.

"Os professores tratam todo mundo da mesma maneira, com certeza", diz ela. "Mas eu acho que o brasileiro sabe que o nosso país ainda carrega um ar machista muito forte, não é de hoje. Mas eu carrego para a minha vida que, dependendo da forma como você se porta diante das pessoas, como você age, como você fala, isso reflete muito na forma como você é recebida. Acho que a forma de se impor é muito importante, independente do que a gente sofra, porque essa questão é muito mais cultural do que qualquer outra coisa."

Marina Anton também fez engenharia civil no século passado, mas, atualmente, trabalha dando mentoria para empresárias. "Quando entrei na faculdade eu imaginava que trabalharia com engenharia, mas não sabia exatamente com o que. A realidade me fez abandonar a engenharia."

Ela passou na Fuvest em 1993 e se formou na Escola Politécnica em 1997. Filha de um engenheiro e empresário, cresceu estudando matemática, física e negócios com o pai. "Me encantei com o raciocínio lógico que a engenharia despertava", disse ela, lembrando que, naquela época, "ainda se tinha a concepção que, para se ter sucesso, as únicas faculdades possíveis eram engenharia, medicina e direito".

Na turma de 100 alunos, ela afirma que cerca de 30 eram mulheres. Entre os colegas, sempre houve um relacionamento muito respeitoso. "Tenho vários bons amigos até hoje e um deles é pai dos meus filhos", conta. "Já quando se tratava de atendimento personalizado por parte dos professores, sentia diferenciação."

Ela recontou ao G1 um dos episódios em que foi tratada pior do que os colegas homens.

Marina diz, porém, que em outras vezes as mulheres eram incentivadas a estar nos mesmos ambientes que os homens, mesmo que fossem locais pouco confortáveis, como a visita a uma obra em um dos túneis que passam embaixo do Rio Pinheiros. "Eu e algumas colegas estávamos com medo e pedimos para o professor se podíamos voltar. Ele respondeu rispidamente que não, que se queríamos ser engenheiras tínhamos que enfrentar a obra como os colegas homens", disse ela.

A empresária afirma, ainda, que as estudantes de engenharia também sofriam preconceitos dos alunos de outras faculdades. "Era comum frases do tipo: 'Na Poli só tem sereia: metade mulher, metade baleia.'"

Depois de formada, ela conta que tentou exercer a profissão, mas acabou desistindo tanto porque outros mercados, como o financeiro e o marketing, pagavam mais, quanto por causa da falta de espaço para mulheres. "No canteiro de obras só tinha o mestre de obras e vários operários da construção. Para mim era muito amedrontador. Quando o engenheiro chega à obra ele precisa conversar com o mestre de obras, e quando eu ia falar com ele a primeira pergunta era sempre: 'Onde está o engenheiro?' e a resposta 'Eu sou a engenheira' nunca era convincente."

"Está mudando muito por causa das mulheres que resolveram se juntar e não ficar mais quietas", afirma Mariana Duran Meletti, de 23 anos, que está no quinto ano do curso, na Escola Politécnica da USP. "Na Poli tem muito mais homem, bastante, inclusive a quantidade de ingressantes na Poli foi basicamente a mesma nos últimos anos, em torno de 25%", diz ela. Na Fuvest 2016, segundo dados da própria USP, 80% dos novos calouros eram homens.

Segundo Mariana, a discriminação tem um caráter corriqueiro, mas há também casos graves de assédio. "São desde piadas idiotas, tipo quando mandam fazer alicate, eles falam 'ah, mas meninas, tomem cuidado, porque não é alicate de unha', até coisas de professor falando 'vem pedir nota na minha sala sozinha', coisas que deixam a mulher desconfortável."

A reação das mulheres foi se unir, criar um canal de denúncias e deixar de se calar. Neste ano, as alunas da engenharia civil decidiram transformar a tradicional gincana "Integrapoli" em uma plataforma contra o preconceito e o machismo. Elas dublaram a música "Survivor" (Sobrevivente, em português) e até contaram com a participação da vice-diretora da escola. O vídeo foi visto mais de 340 mil vezes entre abril e agosto.

Mariana, que participou da produção, afirma que o grupo fez o vídeo com a ideia de que ele circulasse internamente, mas, apesar de serem surpreendidas com a grande repercussão do clipe, ela afirma que a maior parte das reações foi positiva. E que essa ação, assim como outras de denúncia, têm feito com que os homens abandonem comportamentos e atitudes machistas.

"Não vou mentir, melhorou, muito mesmo. Quando entrei era outra coisa." Ela ressalta, ainda, que as calouras já chegam à faculdade cientes da necessidade de exigir um tratamento igualitário. "Quando entrei, nem passava na minha cabeça. Hoje em dia as pessoas já se questionam isso antes de entrar. Então, para mim, graças a deus melhorou bastante. Mas infelizmente mulheres ainda passam por situações desagradáveis."

 

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