Alexandra M.B. Justo
ATrabalhar por um ambiente acolhedor às mulheres na engenharia. Foto: Drazen Zigic/iStock presença feminina na engenharia tem crescido ao longo dos anos, contudo, saber que apenas 27% das pessoas formadas em engenharia são mulheres ainda é bem impactante. Mulheres estas que enfrentam desafios significativos nesse campo predominantemente masculino. A discriminação de gênero, a falta de representatividade e os estereótipos são barreiras com as quais muitas engenheiras se deparam. Esses desafios não apenas afetam a autoestima e a motivação das profissionais, mas também limitam a diversidade de ideias, soluções e inovações que podem ser trazidas no campo de trabalho, da academia e/ou social. É fundamental reconhecer essas dificuldades para promover um ambiente de fato inclusivo.
Imaginar que a engenheira civil, Enedina Alves Marques (1913-1981), formada pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), em 1945, foi a primeira engenheira negra a se graduar em um turma com 32 engenheiros, todos homens brancos, que, além de professora, trabalhou como chefe em obras públicas e no desenvolvimento do Plano Hidrelétrico do Paraná e acessar informações segundo as quais ela andava com uma arma na cintura e dava tiros para o alto para ganhar respeito em um ambiente dominado por homens é um tanto quanto estarrecedor.
As mulheres têm quebrado barreiras. Elas têm conquistado seus espaços e se tornado mentoras para outras mulheres, mostrando que é possível triunfar em um ambiente ainda de tanto preconceito. Histórias inspiradoras são essenciais para motivar novas gerações a seguir carreiras em engenharia, demonstrando que a perseverança e a determinação podem levar ao sucesso. Comecemos a observar nossas professoras de Engenharia, certamente há muito história de superação!
Caminhos para avançar
Para lidar com a discriminação e o assédio, é crucial que as empresas estabeleçam canais de denúncia eficazes. Esses canais devem ser acessíveis e garantir a confidencialidade das colaboradoras que se sentem ameaçadas ou discriminadas. Além disso, é importante que as denúncias sejam tratadas com seriedade e que haja consequências para comportamentos inadequados. A criação de um ambiente seguro e acolhedor é fundamental para que as mulheres se sintam respeitadas e que exista seriedade para elas possam relatar suas experiências e buscar apoio.
A área de Recursos Humanos (RH) desempenha um papel vital na promoção da igualdade de gênero na engenharia. O RH pode implementar políticas de diversidade e inclusão, além de promover treinamentos sobre a importância da conscientização de gênero para todos os colaboradores. Essas iniciativas ajudam a criar uma cultura organizacional que valoriza a diversidade e de combate à discriminação. Além disso, o RH pode oferecer programas de mentoria e desenvolvimento profissional voltados para mulheres, ajudando-as a avançar em suas carreiras.
Outra forma de apoio é a criação de grupos de afinidade ou redes de mulheres dentro das empresas. Esses grupos proporcionam um espaço seguro para que as colaboradoras compartilhem experiências, desafios e conquistas. Além disso, eles podem organizar eventos, workshops e palestras que incentivem o empoderamento feminino e a troca de conhecimentos. Essas iniciativas não apenas fortalecem a comunidade feminina na engenharia, mas também promovem um ambiente de trabalho mais colaborativo e solidário.
As demandas surgem pelas necessidades expressas pelas mulheres, por mais simples que possam parecer. Vivenciei e acompanhei o caso de uma doutora em Engenharia que se envergonhava toda vez que um antigo parceiro aparecia no estacionamento perto do trabalho com flores, chocolates, por vezes com palavras mais ríspidas. Ela muito preocupada com que esta situação não atrapalhasse seu emprego, entrava no carro e saía calada. Depois de diversas ocasiões, a empresa ofereceu apoio e a levamos até a Delegacia da Mulher para formalizar o boletim de ocorrência, quando descobrimos que o ex-parceiro já havia feito diversas vítimas com este mesmo comportamento. Outra situação muito grave foi observar o olhar assustado de uma jovem aprendiz e descobrir que um colaborador da mesma empresa tentava presenteá-la no transporte de retorno à sua residência; descobrimos que ele desviava de seu caminho para abordar a jovem. Por fim, sua esposa nos relatou que ele havia estuprado as cunhadas sem nunca ter sido denunciado. Por vezes, não basta conversar, medidas de segurança precisam existir. Aos líderes, digo que a observação é tudo! Incluir também proteger.
Os canais de denúncia nas empresas, a busca pelo RH ou Gestão de Pessoas, os grupos de ética são caminhos favoráveis. Reforço a importância do canal oficial no Brasil para denúncias “180”, que fornece orientação sobre leis, direitos das mulheres e serviços da rede de atendimento, como Casa da Mulher Brasileira, Centros de Referências, Delegacias de Atendimento à Mulher (Deam), Defensorias Públicas, Núcleos Integrados de Atendimento às Mulheres, entre outros. Também é possível acionar o canal via Whatsapp (61) 9610-0180. Em casos de emergência, deve ser acionada a Polícia Militar, por meio do 190.
Imaginar que Sra. Maria da Penha Maia Fernandes precisou sobreviver ao extremo de diversos tipos de violência, para que sua luta nos trouxesse garantia de diretos e proteção pela Lei n. 11.340/2006. O livro “Sobrevivi...posso contar” é uma referência que toda mulher e homem deveriam acessar diversas vezes como reflexão e busca de melhorias coletivas.
Os desafios enfrentados pelas mulheres na engenharia são significativos, mas não insuperáveis. Com exemplos inspiradores de superação, canais de denúncia eficazes e o apoio ativo da área de Recursos Humanos, é possível criar um ambiente mais inclusivo e igualitário. Ao promover a diversidade de gênero, as empresas não apenas beneficiam suas colaboradoras, mas também enriquecem a própria indústria, trazendo novas perspectivas e soluções inovadoras. A luta pela igualdade de gênero na engenharia é uma jornada contínua, mas cada passo dado em direção a um ambiente mais justo é um passo na direção certa. E esteja à vontade para contar com o apoio do Núcleo da Mulher Engenheira (NME) do SEESP.
Alexandra Justo é responsável pela área de Oportunidades na Engenharia do SEESP