Fátima Aparecida Blockwitz assumiu a presidência da Delegacia Sindical do SEESP, em Sorocaba, em novembro de 2014. Não foi uma tarefa fácil. Afinal, teria que substituir o então presidente, o colega Ricardo José Coelho Lessa, falecido no dia 21 de novembro daquele ano. Em entrevista à Comunicação do SEESP, a engenheira contou um pouco da rotina e como faz para conciliar o exercício no sindicato; no Crea, onde é conselheira desde 2015; na Associação de Engenheiros de Itapetininga, onde mora; com a profissão. Entre seus objetivos para os próximos anos está a criação de um polo tecnológico na região, com apoio do Instituto Superior de Inovação e Tecnologia (Isitec). Aos 57 anos, ela comemora 32 anos de Engenharia, 22 deles na Sabesp, onde começou a atuar pelo SEESP, somando 20 anos de atuação sindical. Ao falar do trabalho, tem orgulho dos passos que deu e se diz realizada profissionalmente. “Tenho muita coisa pra fazer. Estou conciliando muitas atividades ao mesmo tempo, mas eu sempre fui assim. Eu gosto dessa agitação”.
Foto: Jessica Silva/Comunicação SEESP
Presidente da Delegacia Sindical do SEESP em Sorocaba concilia carreira com atuação política.
Porque você decidiu ser engenheira?
A única coisa que eu tinha certeza é que queria ter uma profissão que eu pudesse ser autônoma. Queria fazer Medicina até o dia que entrei na sala de anatomia, com algumas amigas que faziam psicologia, e pensei comigo: isso não é pra mim. Então, como era boa em matemática, física e química, sempre fui a melhor da classe nessas matérias e meu pai trabalhava no DER (Departamento de Estradas de Rodagem), pensei: vou fazer Engenharia e trabalhar no DER.
Teve alguma dificuldade por ser mulher?
Tenho pensando nisso até porque minha filha mais nova está cursando Direito e é feminista. É interessante que para mim nunca foi algo que me incomodou. Meu irmão mais velho, que tem uma diferença de idade de 11 anos, sempre teve tudo da minha mãe, que teve uma educação extremamente machista. Competi muito com meu irmão até aprender que me tornaria o que eu quisesse ser. Por conta disso, minha maneira de encarar o mundo sempre foi de igualdade. Se houve machismo, eu nem percebi. Eu sou uma pessoa muito prática, muito focada.
E como foi entrar numa sala de aula majoritariamente masculina?
Foi normal. Sempre tive mais amigos homens. Entrei no curso de Engenharia Civil da Faculdade Franciscana, atual Universidade São Francisco, em Itatiba, aos 19 anos, onde participei ativamente da Atlética, porque sempre fiz esporte, então convivi com muitos meninos. Depois, no centro acadêmico.
Meu sonho sempre foi ter um diploma, nunca foi usar um vestido de noiva. Sempre falei isso. E também queria ter um filho. Então, no quarto ano de faculdade, descobri que estava grávida. Acabei fazendo o curso em seis anos, um ano a mais. Hoje, meu filho está com 33 anos.
E como foi ao entrar no mercado de trabalho?
Eu tive muita sorte. Na época, o pai da minha cunhada era uma pessoa espiritualizada e ele tinha um amigo, que fazia parte do grupo espírita, e ele era o melhor engenheiro da cidade, trabalhava com estruturas. Fui lá e me apresentei a ele, o engenheiro José Antonio Saad, que foi quem me ensinou de fato a ser engenheira. Eu digo que ele é meu pai na engenharia porque ele me ensinou tudo. Com o tempo, foi me passando os clientes, até que mudou de ramo, para o comércio, e deixou o escritório para mim.
E a prática se mostrou muito diferente do que você viu em sala de aula?
Sim. Você tem que ter alguém para te ajudar e orientar no início. O grande segredo para trabalhar na área é absorver conhecimentos dos mais experientes. Eu pude conviver com bons empreiteiros, que trabalhavam com construção há muitos anos. Infelizmente, hoje em dia não tem mais tantos profissionais assim. Eu sempre me impus nas obras com os empreiteiros, mas sempre numa postura de igual pra igual, e eu tenho uma grande realização na vida por isso, por ser respeitada pelo meu trabalho. Comecei aprendendo com eles.
Então você reconhece que é uma profissão ainda majoritariamente masculina e que tem algum preconceito?
Sim. Muito masculina e existe de fato um preconceito com relação à mulher na obra. Mas por conta do meu profissionalismo eu conquistei esse respeito. Sempre tive essa postura de não querer chamar a atenção na obra, nunca fui de me arrumar para ir pra obra para não chamar a atenção. Sempre estava de jeans, camiseta e tênis, isso quando não ia de botina. Além disso, sempre procurei compartilhar o conhecimento, acredito também que por eu ter escolhido atuar com estruturas, que é a área mais difícil da Engenharia Civil, eu consegui esse respeito profissional. Fiz uma pós-graduação em Engenharia de Estrutura e um curso de gerenciamento empresarial.
Em casa é você quem conserta as coisas?
Meu ex-marido falava algo que eu sempre duvidada. Mas depois constatei que ele tinha razão. Se há um problema na casa, chamamos o servente que a gente conhece. Aí ele olha e diz: melhor chamar o pedreiro fulano. Aí chama o pedreiro fulano. Aí ele diz: melhor chamar o mestre fulano. Chama o mestre fulano, que diz: melhor chamar um engenheiro. Aí quando chama um engenheiro ele diz: melhor chamar a Fátima.
Como e quando se aproximou do sindicato?
Foi na Sabesp. Eu já conhecia a atuação do sindicato antes, mas como eu era autônoma, não tinha muito contato. Eu já tinha uma experiência de atuação política na associação, que me afastei quando nasceu a minha filha, que hoje está com 20 anos.
Como você vê a atuação sindical com as novas gerações?
Temos um problema muito sério a ser encarado, que é uma resistência muito grande por conta da recente crise política, que também atinge o mundo sindical. Estou fazendo um trabalho de divulgação em Itapetininga bastante forte e tenho sentido isso. Também há desconhecimento sobre as instituições. Muitos ainda acreditam que quem defende o engenheiro é o CREA, que foi criado para defender a sociedade de maus profissionais. Quem defende o profissional é o sindicato.
Um ponto a favor do nosso sindicato é que não temos uma vinculação específica com uma corrente política, com uma única central sindical. Temos discussões por termos visões diferentes, mas é isso que nos faz crescer. Felizmente, o movimento sindical já fez essa reflexão e estamos avançando com um trabalho concreto tendo uma jovem engenheira a frente, que é a Marcellie Dessimone (do Núcleo Jovem Engenheiro), que esteve em duas faculdades da região.
Conquistar os jovens é uma meta?
Sim. E aí entra o Isitec (Instituto Superior de Inovação e Tecnologia), que é uma ideia fantástica, muito interessante. Na nossa região temos poucas opções em pós-graduação. Então, estamos tentando levar uma especialização oferecida atualmente pelo Isitec, em Engenharia de Segurança voltada à área rural, que é uma característica de Itapetininga. Estou com muita esperança de montar um polo tecnológico local com apoio do Isitec.
Qual o conselho que você dá para uma jovem que pensa estudar engenharia?
Tem que ter bom senso e ser flexível. Não pode se impor tanto, pra não ser arrogante e não criar barreiras no local de trabalho, e também não baixar tanto a cabeça. Estudar o máximo possível para saber o que você está fazendo, saber escutar e aprender com outros profissionais. A troca de informação em campo é essencial. Nunca percebi muito esses comportamentos de machismo, sempre trabalhei de igual para igual. Homens e mulheres são diferentes, tem visões diferentes e se complementam. Aprender a conviver com as diferenças e unir essas visões é o ideal.
Deborah Moreira
Comunicação SEESP