Enquanto em controvertida Assembleia Geral no dia 3, com oposição dos acionistas minoritários, foi decidido que as empresas do Grupo Eletrobrás aceitariam os termos da medida para antecipar a renovação das concessões a vencer até 2015 e outras como as paulistas Cteep (de transmissão), CPFL (distribuição) e a gaúcha CEEE (geração e transmissão) também deliberaram nesse sentido, Cesp, Copel, Celesc e Cemig (companhias energéticas de São Paulo, do Paraná, de Santa Catarina e de Minas Gerais, respectivamente) recusaram as regras apresentadas.
Numa tentativa de contornar o descontentamento que vinha sendo manifestado pelas concessionárias, o governo brasileiro chegou a publicar outra medida provisória, além de um decreto na véspera do prazo limite para adesão, visando garantir melhor indenização às empresas – por perdas de remuneração com a redução tarifária. Ao que tudo indica, as iniciativas não foram suficientes para assegurar uma assinatura maciça. A controvérsia pode dificultar a aprovação da MP pelo Congresso Nacional, o que precisa ocorrer até fevereiro próximo para que não perca a validade.
Para Carlos Augusto Ramos Kirchner, diretor do Seesp e representante da FNE na Frente de Defesa do Consumidor de Energia Elétrica, o quadro aponta os equívocos havidos na edição da MP e uma situação bastante preocupante. As empresas deverão ser remuneradas em valores muito aquém do que seria necessário, sobretudo as geradoras de energia elétrica. “Há erros no cálculo das tarifas e é temerário que se quebrem as empresas, em especial as do Grupo Eletrobras, que tiveram que assinar (já que o governo federal é o acionista majoritário). O que deveria ser feito era tentar atuar para reduzir as tarifas mexendo em outros pontos que encarecem a conta de luz. A solução agora é rediscutir e abrir possibilidade de recálculo.”
Outra proposta é que as mudanças se deem mediante projeto de lei elaborado conjuntamente pelo Legislativo e Executivo federais, com ampla participação de todos os entes envolvidos. A sugestão é que um diagnóstico técnico abrangente preceda essa formulação. Tais contribuições foram apresentadas em carta do dia 3 à presidente Dilma Rousseff, assinada por Luiz Pinguelli Rosa, diretor da Coppe-UFRJ (Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro). Colocando-se como porta-voz de um conjunto de técnicos, especialistas e acadêmicos, ele expressou suas aflições e alternativas.
Às empresas públicas, a conta
Anunciada como uma forma de diminuir os valores pagos pelo consumidor em cerca de 20%, a medida foi amplamente criticada no seminário “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento: Energia”, realizado na sede do Seesp, em São Paulo, em 26 de novembro pela FNE, com apoio da CNTU (Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados). Apontou que esse não seria o caminho para alcançar a premente modicidade tarifária, mas sim rever os equívocos do atual modelo do setor elétrico. Professor do IEE/USP (Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo), Ildo Luís Sauer ressaltou o problema de fundo: “Não nos livramos do estigma de que no setor o preço é ditado pelo mercado. Em 2004 (quando da reestruturação), não fizemos a reforma necessária para resolver isso.”
A MP, além de não sanar esse quadro, coloca as empresas estatais em situação difícil, como asseverou Roberto D´Araújo, diretor do Ilumina (Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Energético). Kirchner explica que são elas que têm contratos de concessão a vencer nos próximos anos, portanto, abrangidas pela norma que dispõe sobre os mecanismos para a prorrogação. Aquelas que foram privatizadas nos anos 90, em sua grande maioria, não se enquadram nessa situação e ficaram de fora. “A MP engloba apenas 18% do parque gerador”, estima.
Não se mexe nas bases do modelo. Esse manteve um mercado privilegiado, especulativo, chamado livre, ao qual só tem acesso quem tem poder econômico e que tem garantido lucros gigantescos a empresas (hoje seriam 742). “Em algumas, houve ganhos da ordem de 400%. Agora essas indústrias são transformadas em vítimas e as estatais, em vilãs”, destacou D´Araújo. Ainda conforme sua preleção, o modelo vigente no País culminou em 70% de aumento real das tarifas residenciais entre 1995 e 2011. E o impacto com a MP nas contas de luz seria insignificante.
Para Flávia Lefèvre, consultora da Proteste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor), se a preocupação é reduzir tarifa, um caminho é fazer as compensações aos cidadãos dos R$ 7 bilhões em perdas resultantes de erros na metodologia para reajustes tarifários durante sete anos. “Esse seria o mecanismo correto e o governo não atua para garantir o direito dos consumidores.”
Outra crítica recorrente no seminário foi quanto à imposição pelo governo federal da MP 579. Secretário de Energia do Estado de São Paulo, José Aníbal foi um dos que condenaram a forma como foi apresentada a medida. O coordenador técnico do “Cresce Brasil”, Carlos Monte, lamentou que o processo tenha se dado sem um esforço por consensos, mas salientou: “Todos estão de acordo quanto à necessidade e conveniência da redução das tarifas. Esse deve ser o objetivo central a ser perseguido.”
Participaram ainda do debate Mauro Arce, presidente da Cesp; o deputado federal Carlos Zarattini (PT/SP); César de Barros Pinto, diretor executivo da Abrate (Associação Brasileira das Grandes Empresas de Transmissão de Energia Elétrica); e Hermes Chipp, diretor-geral do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico). Também estiveram entre os presentes José Roberto Cardoso, diretor da Poli-USP, e representantes de sindicatos de engenheiros de diversos estados. Ao final, José Antonio Latrônico, diretor do Senge-SC, resumiu os resultados do seminário, que deverão constar em documento a ser elaborado pela FNE. Conforme Murilo Celso de Campos Pinheiro, presidente dessa entidade, a ideia é que seja apresentado à sociedade nos próximos dias e subsidie os debates junto ao poder público sobre o tema.
Imprensa – SEESP
Reprodução de matéria do jornal da FNE/Edição 127