Estudo da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP analisou as políticas públicas de transporte coletivo em São Paulo entre 2001 e 2010. Segundo a pesquisa de mestrado do arquiteto Caio Vinícius Higa, a implantação do bilhete único, em 2004, e a ampliação dos corredores de ônibus representaram uma reversão na tendência de crescimento de uso do transporte individual. Aumentou o número de usuários de ônibus e metrô e ocorreu uma maior mobilidade urbana para a população com renda de até 3 salários mínimos. Outra constatação é a grande influência do empresariado na definição das políticas públicas de transporte da cidade durante todo o período analisado.
“De 1997 até 2002 podíamos identificar uma tendência de aumento do uso de transporte individual. O bilhete único reverteu isso”, aponta o arquiteto, com base nos dados da pesquisa Origem-Destino, realizada pelo Metrô a cada dez anos. “Em 2002, houve uma mini pesquisa origem-destino, o que facilitou bastante a realização do estudo”, completa. O arquiteto também se baseou em uma pesquisa bibliográfica, entrevistou especialistas, analisou dados financeiros (recursos) que foram disponibilizados para o setor e estudou inúmeras notícias veiculadas em jornais e revistas abordando o tema.
“Tudo o que a cidade é hoje foi construído ao longo dos anos. E o que percebemos com a pesquisa é que as políticas públicas de transporte coletivo sempre sofreram influência de lobby do setor privado”, conta. Segundo ele, na década de 1920, a influência veio por meio de empresas privadas do setor de bondes. Em 1950, o modelo de bondes foi substituído, dando lugar à indústria automobilística e de pneus.
Corredores de ônibus x metrô
Na gestão Marta Suplicy (2001 – 2004) foi criado o Sistema Interligado, que incluía o bilhete único e a ampliação dos corredores de ônibus já existentes. A iniciativa permitiu um melhor planejamento do transporte, a renovação da frota e a criação de estações de parada informatizadas. Surgiram as vans de transporte regularizadas pela Prefeitura (lotação). Também estava prevista a construção de 400 quilômetros de corredores de ônibus, 26 terminais, 250 estações de parada informatizadas e a conclusão do então chamado Paulistão (corredor de ônibus elevado), saindo da Vila Prudente até Cidade Tiradentes, no extremo leste da Capital. O custo previsto era de R$ 1,123 milhões com recursos vindos do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) e Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD).
Como ponto negativo, Higa cita a pressão que os empresários fizeram sobre a administração da época. As empresas, tendo um número maior de veículos circulando, acabam aumentando o valor de sua remuneração. “Segundo o edital de licitação, os valores seriam compostos pelo número de passageiros transportados mais um valor chamado de “conta sistema”. Essa ‘conta sistema’ tem uma série de critérios que influenciam o cálculo, como manutenção, combustível, aquisição de novos veículos, etc. O maior número de veículos circulando causa o grande congestionamento que percebemos em alguns trechos dos corredores nos horários de pico”, explica. “A instalação de ônibus articulados, com maior capacidade de transporte de passageiros, ajudaria a dinamizar este problema”, sugere.
Monotrilho
O Sistema Interligado deixou de ser seguido em 2005, nas gestões seguintes: José Serra/Gilberto Kassab (2005 – 2008) e Gilberto Kassab (2009 – 2010). O modelo adotado passou a ser voltado para a construção do metrô, com recursos tanto do município como do estado. O projeto do Paulistão foi alterado: em vez de um corredor de ônibus elevado, foi proposta a construção de um Monotrilho (Linha 15-Prata) para o mesmo trecho.
“O valor de R$ 1,123 milhões representava, no ano 2003, metade dos recursos utilizados para a construção de um trecho da Linha Verde do metrô”, compara o pesquisador. Para Higa, a relação custo x benefício é mais vantajosa para a construção de corredores de ônibus, em comparação ao metrô. “A cidade de São Paulo já possui uma infra-estrutura pronta de avenidas para a construção dos corredores”, justifica. O pesquisador também aponta atrasos nas entregas das linhas Amarela e Ouro do metrô como pontos negativos deste modelo.
“Segundo a Prefeitura, as obras serão de responsabilidade do Consórcio Expresso Monotrilho Leste, composto pelas empresas Queiroz Galvão, OAS e a canadense Bombardier. O custo da obra estava inicialmente orçado em R$ 2,46 bi, sendo R$ 1 bi provenientes da administração municipal e o restante de responsabilidade do governo estadual”, aponta o pesquisador.
Para Higa, em ambos os casos houve influência de empresários do setor. “De um lado, temos um empresariado de capital mais local, formado por empresas de ônibus, distribuidoras de combustível e pequenas empreiteiras. Do outro, encontramos a ‘indústria de capital internacional’: grandes construtoras e grandes produtoras de componentes para transporte ferroviário”, aponta. “É preciso minimizar essa influência do setor privado e pensar no transporte público da cidade como um serviço essencial que deve ter como prioridade atender aos interesses da maioria da população”, conclui.
Imprensa – SEESP
Matéria da Agência USP de Notícias