Durante muito tempo, o uso de bicicletas esteve muito mais ligado ao lazer, em especial infantil, do que ao transporte. É difícil apontar alguma criança que nunca tenha se aventurado em cima de uma magrela; por outro lado, há décadas as condições para a utilização das bicicletas como meio de locomoção nas cidades se mostram precárias, o que faz com que o uso delas para esse fim não seja tão difundido em nosso país. Felizmente, algumas iniciativas recentes têm mostrado que não é preciso muito para incentivar a cultura da bike no Brasil.
Uma dessas iniciativas é a marca Respeite um carro a menos, que está ganhando espaço principalmente nas ruas do Rio de Janeiro. A empresa desenvolve placas de material pet reciclado que podem ser colocadas em bicicletas e outros meios de transporte, e que mostram mensagens de apoio ao transporte alternativo.
Para adquirir uma plaquinha, basta a pessoa entrar no site da empresa e montar sua placa com as centenas de modelos, cores e ilustrações. As plaquinhas custam em torno de 25 reais, e, nos primeiros 12 meses do projeto, mais de três mil já foram vendidas, sendo que mais de 800 foram para fora do estado do Rio de Janeiro.
Segundo Fred Sampaio, um dos idealizadores da iniciativa, há toda uma ideologia por trás da criação e da utilização das plaquinhas de representar e estimular a mobilidade sustentável, principalmente a bicicleta.
“A educação e o hábito para o uso da bicicleta são pontos fundamentais para a evolução da mobilidade na cidade e decidimos começar essa aventura através de uma plaquinha feita em material reciclado e que tem um incrível poder de segurança, sinalização e o melhor, de despertar sorrisos no meio do estresse do trânsito”, coloca Sampaio.
O criador explica que a ideia surgiu da vontade de encontrar uma solução que pudesse compartilhar entre ciclistas, motoristas e pedestres a necessidade de respeito com as leis de trânsito, principalmente entre esses três principais agentes do trânsito urbano. No início, eram 20 opções de placas; atualmente são mais de 350.
A ideia deu tão certo que, com aproximadamente um ano, a marca já é economicamente sustentável, e aumentou ainda mais as opções para os clientes, oferecendo também camisetas com as mensagens. Além disso, o projeto também tem a participação expressiva do público nas redes sociais: a página do Respeite no Facebook já tem mais de 12 mil ‘curtidas’.
E os idealizadores acreditam que a iniciativa de fato incentiva o uso da bicicleta e de outros transportes alternativos, e que além disso é uma oportunidade de negócios. “A bicicleta é um meio de transporte que já foi adotado pelas pessoas e carece apenas de dois importantes aspectos: estrutura e educação. Todo tipo de iniciativa que possa influenciar positivamente nesse contexto é bem-vinda e representa não só uma oportunidade de contribuir com a população, mas também de se desenvolver profissionalmente.”
Nesse mesmo sentido, o projeto Bike Anjo também oferece uma alternativa simples e eficaz para impulsionar o uso da magrela como transporte: ciclistas mais experientes se oferecem para ajudar pessoas que desejam se locomover com bike através de noções de segurança no trânsito, conhecimento sobre todos os itens das bicicletas e também na escolha de trajetos de mais seguros.
A iniciativa surgiu em São Paulo em dezembro de 2010, fundada pelo ciclista João Paulo Amaral, e hoje já está presente em mais de 40 cidades no Brasil e também em alguns outros países. O auxílio compreende todas as etapas do processo de utilização da bicicleta como transporte: desde ensinar a pedalar até se comportar no trânsito, passando também pela compra de uma bicicleta.
O trabalho é voluntário e, de acordo com Guilherme Lima, bike anjo em Florianópolis (SC), qualquer pessoa ou empresa que se identifique com o projeto é bem-vindo a ajudar. Lima afirma que, depois que muitos ‘protegidos’ aprenderam com eles a andar de bike, passaram a usar mais a bicicleta e até a participar de movimentos ciclísticos.
“Não só acreditamos que temos ajudado a estimular as pessoas a andarem mais de bicicleta, como já comprovamos isso na prática. Diversas pessoas que aprenderam conosco hoje são parceiras de pedaladas e também dos movimentos ciclísticos de Florianópolis, como a Bicicletada Floripa”, declarou o bike anjo.
Também preocupada em melhorar as condições de mobilidade dos usuários de bicicleta, a ONG Via Ciclo é mais um dos atores que participam da busca por uma maior participação das bikes como uma das alternativas para o transporte urbano.
A ONG, que também atua em Florianópolis, foi fundada em maio de 2001 por um grupo de ciclistas para suprir a falta de uma entidade da sociedade civil que pautasse a questão da democratização da mobilidade urbana.
Desde então, a Via Ciclo promove algumas atividades, principalmente passeios ciclísticos, para chamar a atenção do governo e da sociedade civil para os problemas da mobilidade urbana, em especial com relação ao uso das bicicletas.
Daniel Costa, atual presidente da ONG, acredita que muitos ciclistas apoiam as ações e conquistas da Via Ciclo, mas que ainda falta estímulo à cultura da bicicleta como meio de transporte, principalmente por ser a utilização do automóvel tão mais estimulada.
“As maiores dificuldades ainda estão no paradigma e cultura do automóvel, promovida pelo marketing sobre a população, o que acarreta na priorização de investimentos e utilização maciça do transporte individual motorizado”, alerta Costa.
O resultado é que, com a falta de investimentos para o desenvolvimento de infraestrutura para outros tipos de transporte, como ciclovias, no caso das bicicletas, a maioria da população acaba não utilizando essa opção, até por considerar arriscado. Costa também ressalta a falta de integração da bicicleta com outros modais, como os ônibus, o que também contribui para que o transporte ciclístico não seja incentivado.
“[Florianópolis] tem uma demanda reprimida de 74% das pessoas que gostariam e querem utilizar a bicicleta em seus deslocamentos urbanos, e que não fazem uso desse veículo pela insegurança com a falta de infraestrutura, e principalmente pela falta de respeito ao Código de Trânsito Brasileiro, sendo que as elevadas velocidades permitidas aos motorizados de transitar nas vias urbanas são fator preponderante nos sinistros de trânsito. Uma frase exemplifica essa triste realidade: ‘Andar de bicicleta não é perigoso, perigoso é como se permite conduzir motorizado em nossas ruas’”, lamenta o presidente da Via Ciclo.
“As bicicletas são a resposta de grande parte do problema de mobilidade urbana nas cidades. Todos os principais especialistas mundiais em mobilidade urbana ressaltam isso. No entanto, enquanto ainda tivermos prefeitos e governadores que apenas pensem a cidade para carros (e que continuem investindo dinheiro público somente em elevados, alargamentos e duplicações de vias, sem priorizar o transporte público e sua integração com bicicletas), e não para as pessoas, ainda passaremos um bom tempo fazendo mais do mesmo. Para todas as pessoas que não compactuam com esse modelo ineficiente do século passado e querem um modo permanente de qualidade de vida, não só nas férias e não só para lazer, mas diariamente, nós estaremos sempre ao lado para ajudar”, conclui o bike anjo Guilherme Lima.
Fonte: Instituto Carbono Brasil