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07/08/2015

Opinião - Três forças que transformam o mundo

A Revolução Industrial do final do século 18 e início do século 19 foi uma força que transformou o mundo. Na produção, mãos foram substituídas por máquinas, métodos e processos evoluíram com ganhos de eficiência no uso da energia e de insumos, criando uma enorme gama de novos produtos e facilidades para as pessoas. A Revolução Industrial foi um divisor de águas na história e desde então o mundo experimentou um progresso sem precedentes. A pobreza absoluta, que há duzentos anos, penalizava 94% da população mundial, reduziu-se para cerca de 14% da humanidade.

Talvez o mundo esteja passando por uma transição ainda mais dramática, em razão de três forças que operam em velocidade e intensidade muito superior àquelas que produziram a Revolução Industrial. Urbanização acelerada, aumento da frequência de eventos climáticos extremos e avanços expressivos no desenvolvimento científico e tecnológico ocorrem como ondas em sinergia. São forças capazes de amplificar umas às outras, ganhando magnitude e maior poder de influência, com transformações substantivas na vida da sociedade.

A primeira força vem do crescimento das cidades, que têm incorporado, em âmbito global, uma média de 65 milhões de pessoas anualmente, nas últimas três décadas. Isso equivale a criar quase seis cidades de São Paulo a cada ano. Segundo a ONU, em 2010 a população urbana no mundo pela primeira vez ultrapassou a população rural. Até 2030, espera-se que cerca de 60% da população mundial esteja vivendo em áreas urbanas. No Brasil, em 2010, dos 191 milhões de brasileiros, apenas 29,8 milhões (15,6%) estavam no meio rural.  Em 2030, projeta-se que 90% estarão nas cidades.

A segunda força, as mudanças climáticas globais, indica que o modelo de desenvolvimento dependente de recursos não renováveis que, ao longo de décadas, elevou os níveis de poluição e a emissão de gases de efeito estufa a patamares perigosos, chegou a seu limite. Mudanças de clima e os anseios da sociedade por um futuro sustentável forçam a busca de um novo paradigma energético e de novas possibilidades de produção, com práticas mais limpas e substituição de matérias-primas de origem fóssil por recursos de base biológica, recicláveis e renováveis. Em um mundo pós-combustível fóssil, uma crescente proporção de químicos, plásticos, têxteis, eletricidade e combustíveis terá de vir de outras fontes, e não mais do petróleo.

A terceira força vem da profunda alteração no escopo, escala e impacto econômico do desenvolvimento tecnológico. Ruptura marcada pelo avanço cada vez mais rápido do conhecimento e pela dissolução dos limites entre as ciências tradicionais como a física, a química e a biologia. Os avanços da tecnologia da informação e a transformação digital produzem uma espécie de fertilização cruzada entre vários domínios científicos, com geração de novos conhecimentos e produção de bens e serviços antes impossíveis de se obter. Muitos deles incorporados pela sociedade em ritmo alucinante. Há vinte anos, menos de 3% das pessoas tinham um telefone celular. Hoje, dois terços dos habitantes do planeta têm pelo menos um.

Da sinergia entre estas três forças – urbanização, clima e tecnologia – surgirão muitos desafios e oportunidades, além de mudanças radicais no comportamento da sociedade. Com o avanço do progresso e das mudanças demográficas, o futuro nos promete, além de cidades mais populosas, pessoas mais idosas, mais educadas e mais exigentes. Os desafios de gerir megacidades e as preocupações com o equilíbrio ambiental já colocaram a sustentabilidade no topo da agenda da sociedade.  E a intensificação dos fluxos de capital, informações e pessoas, em todos os cantos do planeta, vai criar um novo ciclo de globalização, mais dinâmico, volátil e também mais imprevisível.

As assimetrias tenderão a crescer. Em duas décadas, a região da Ásia-Pacífico concentrará cerca de 60% da classe média mundial. Ali haverá uma escalada de demanda por leite, carne, ovos, peixes, frutas, verduras e legumes. O aumento da demanda por alimentos, em quantidade, qualidade e diversidade, em regiões onde é baixa a disponibilidade de áreas agricultáveis é uma grande preocupação para o futuro.  Além de provedores confiáveis em várias partes do mundo, a Ásia necessitará de um sistema de comércio complexo e intrincado, com ramificações em muitos continentes. Uma grande oportunidade para o Brasil, do qual se espera protagonismo crescente e qualificado na produção de alimentos.

O fato é que a força das mudanças em curso provocará uma elevação da complexidade em praticamente todos os processos do mundo moderno, exigindo de indivíduos, empresas e governos a compreensão de que estamos imersos em um verdadeiro "sistema de sistemas", com interfaces nas dimensões econômica, social, ambiental e política. A redução dos riscos, das incertezas e da ineficiência dos muitos processos que movem a sociedade só será alcançada com planejamento eficiente e continuada ampliação da nossa capacidade de integrar e gerir sistemas complexos. Klaus Schwab, fundador e presidente do Fórum Econômico Mundial, refletindo sobre esta realidade afirmou que "neste novo mundo não é o peixe grande que come o peixe pequeno; é o peixe rápido que come o peixe lento".


 

* por Maurício Antônio Lopes, presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Artigo publicado na edição do dia 2 de agosto de 2015 do jornal Correio Braziliense








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