Artur Araujo
A cena é conhecida dos moradores das cidades brasileiras: uma equipe de manutenção bloqueia um trecho de alto tráfego e executa serviços de recapeamento. Dias depois, funcionários de uma concessionária de água e esgotos interditam o local, escavam, executam obras e fecham, de modo precário, a vala aberta no trecho recapeado. O mesmo local poderá, em curto intervalo de tempo, ser objeto de poda de árvores, limpeza de bueiros, manutenção de rede elétrica ou substituição de semáforo. Os transtornos de mobilidade e de qualidade de vida da vizinhança se repetem, e os prejuízos, públicos e privados, se multiplicam.
Não se trata, apenas, de uma descoordenação entre diversos agentes independentes atuando na malha urbana, que poderia (e deveria) ser resolvida por organismos de gerenciamento e de compartilhamento de informações. Por trás de eventos dessa natureza está uma ausência cada vez mais crítica, a falta de uma visão e prática integradas de intervenções urbanas.
Foto: Beatriz Arruda/SEESP
Artur Araujo está na elaboração da fase atual do projeto Cresce Brasil - Cidades
As cidades são “entes vivos”, têm uma dinâmica que não se submete à fria lógica de um experimento de laboratório. Qualquer fenômeno urbano tem múltiplas interfaces e é quase impossível o isolamento de uma variável em detrimento do conjunto. Isso exige pensamento complexo, estruturas matriciais de planejamento e de execução e alta permeabilidade para captação e atendimento das necessidades e aspirações dos cidadãos. No entanto, o desenho hierárquico e funcional das prefeituras é a negação dessas necessidades: secretarias estanques; inexistência de fóruns de coordenação e de troca de informações e experiências; desconexão entre órgãos de planejamento e de execução; ausência de diálogo entre o poder público e a comunidade que quer e precisa ser atendida.
Mesmo as diversas especialidades técnicas presentes no quadro de servidores públicos e nas equipes de empreiteiras e concessionárias não são estimuladas à atuação conjunta e multidisciplinar. As obras e serviços são planejados e executados como mero somatório, sem beneficiar-se da intersecção de conhecimentos e métodos. Usando expressões populares, fica “cada engenheiro no seu quadrado” e todos “pensando e agindo dentro das caixinhas do organograma”.
A engenharia, felizmente, já resolveu a contento dificuldades dessa natureza. Séculos de experiência na gestão da produção material, no proverbial “chão de fábrica”, permitiram o desenvolvimento de uma cultura e de conhecimentos – científicos, tecnológicos e empíricos – que integram as múltiplas especialidades dos engenheiros com profissionais de design, de marketing e de relações com os consumidores, gerando sinergia e otimização.
É dos engenheiros, portanto, que pode surgir a resposta inadiável ao desafio da gestão urbana, o desenvolvimento e aplicação de uma autêntica Engenharia de Cidades.
Artur Araujo é consultor do “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”