Em outubro último, mais de 20 entidades representativas da engenharia nacional – entre elas a Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) – lançaram a carta “Engenharia sob ataque”. No documento, criticam qualquer tentativa de abertura indiscriminada do “mercado brasileiro a profissionais e empresas de engenharia estrangeiras” e observam que os profissionais brasileiros, ao longo das últimas décadas, credenciaram-se entre os mais qualificados do mundo.
O presidente em exercício do SEESP, João Carlos Gonçalves Bibbo, endossa a defesa, observando que “o País vive uma gravíssima crise econômica e política que atinge em cheio a engenharia e, portanto, o seu mercado de trabalho”. Tal cenário, prossegue, causou o desemprego de milhares de profissionais, todos “plenamente aptos a se incumbir das tarefas necessárias na construção civil e em outras áreas”.
Ao invés de abrir o mercado indiscriminadamente, ele considera que o governo deve tomar medidas essenciais para reaquecer o setor e a economia em geral, como, por exemplo, dar andamento às mais de 5 mil obras paralisadas. A opinião é compartilhada pelo presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco), seção São Paulo, Carlos Roberto Soares Mingione, que adverte: “No meu setor está sobrando gente. E do ponto de vista tecnológico, ninguém vai trazer nada novo. É uma ilusão dizer que vai abrir mercado para empresas estrangeiras e com isso vai rolar dinheiro aqui. Não sou contra o profissional estrangeiro, mas precisa seguir as mesmas regras que nós. E tem que haver reciprocidade.”
O presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), José Carlos Martins, concorda que a engenharia brasileira é reconhecida pela sua qualidade e tradição. “Temos aqui profissionais e empresas com grande qualificação e expertise, preparados para participar de projetos de qualquer natureza. A CBIC tem acompanhado esse tema e alertado para os efeitos negativos da potencial entrada predatória de players internacionais no mercado brasileiro”, assevera.
Em 2015, segundo dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) do Ministério do Trabalho, o Brasil tinha 1.882 engenheiros estrangeiros com vínculo formal de trabalho atuando em território nacional, vindos de países da Europa, Ásia, África e América. O exercício profissional dessa natureza é regulamentado pela Lei 5.194/66, conforme alínea C do artigo 2º, em que se estabelece que a critério dos conselhos Federal e Regionais de Engenharia e Agronomia (Confea/Creas), “considerados a escassez de profissionais de determinada especialidade e o interesse nacional, tenham seus títulos registrados temporariamente”. Em outro artigo (85), o dispositivo legal determina que as entidades que contratarem estrangeiros “são obrigadas a manter, junto a eles, um assistente brasileiro do ramo profissional respectivo”.
Valorização profissional
O presidente da Delegacia Sindical do SEESP na Baixada Santista, Newton Guenaga Filho, esclarece que a lei de 1966 foi elaborada quando o País carecia desses profissionais e de cursos na área. Conforme dados do Confea, na década de 1960, o Brasil contabilizava 10.395 engenheiros; em dados atualizados até 27 de novembro último, esse número aumentou para 874.921. Depois de 51 anos, como observa Guenaga, a área tecnológica nacional se desenvolveu muito, tem modalidades as mais modernas e domina o conhecimento mundial em muitos setores, como de construção de barragens para hidrelétricas. “Portanto, o que precisamos é de valorização profissional e não abertura de mercado.”
Nesse sentido, o presidente da Frente Parlamentar Mista da Engenharia, Infraestrutura e Desenvolvimento Nacional, deputado federal Ronaldo Lessa (PDT-AL), defende a criação da carreira de Estado para os engenheiros, conforme projeto de lei que tramita no Congresso Nacional desde 2013. “Sem isso, questões meramente técnicas de obras acabam sendo judicializadas, as quais ficam paradas ou inacabadas. Isso ocorre porque as instituições que fiscalizam, como o Ministério Público e todas as outras, não têm um quadro específico próprio que possa avaliar quando há qualquer tipo de problema com a necessidade técnica que cada caso impõe.”
Em resposta a questionamento do Jornal do Engenheiro sobre projeto de lei que o governo encaminharia para facilitar a revalidação de diploma e registro profissional de engenheiros estrangeiros, conforme noticiado pela Folha de S. Paulo, a Casa Civil da Presidência da República e o Ministério do Trabalho negaram conhecer o assunto. A Casa Civil, inclusive, disse que “não há discussão sobre o tema nas áreas técnicas deste Ministério”. Bibbo, todavia, já avisa: “O SEESP atuará não só em defesa dos empregos dos profissionais brasileiros, mas também de um projeto estratégico de desenvolvimento, que não pode prescindir da engenharia nacional.”
Por Rosângela Ribeiro Gil