A história da tecnologia que revolucionou o globo e os desafios atuais decorrentes foram o tema na atividade “50 anos da internet, a inovação que transformou o mundo”. Realizado em 12 de fevereiro último, no auditório do SEESP, na Capital, o evento foi promovido pelo Conselho Tecnológico (CT) desse sindicato.
Em 29 de outubro de 1969 realizou-se a primeira conexão da rede Arpanet. Desenvolvida no setor de pesquisa do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, é considerada “a mãe da internet”, como explicou Demi Getschko, diretor-presidente do NIC.br (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR). “Isso teve impacto decisivo à pesquisa e economia global, mas também no modo de vida das pessoas”, destacou o coordenador do CT do SEESP, José Roberto Cardoso, à abertura. Vice-presidente do sindicato, Celso Atienza frisou: “É uma inovação fantástica, e temos que comemorar, em especial aqui, na casa do engenheiro.”
Considerado o pai da internet no Brasil, Getschko explicou que em 2019, além dos 50 anos da internet, celebraram-se mundialmente 30 anos de uma aplicação sobre ela, a web, que chegou ao Brasil pouco tempo depois, no início dos anos 1990. A partir daí, houve enorme evolução, a passos largos. Seu Comitê Gestor no País foi constituído em 24 de abril de 2009. “O marco civil, grande garantidor de direitos, foi aprovado em 2014.” Segundo o especialista, que no mesmo ano recebeu homenagem no “Hall da Fama da Internet” e o prêmio Personalidade da Tecnologia do SEESP na categoria Internet, tudo sempre foi feito por grupos de indivíduos. “A internet nasceu dentro da Arpanet, com dinheiro militar, mas o pessoal e as ideias sempre foram libertários. O conceito é de uma rede que não tem um centro de controle, distribuída e aberta. Esse é o espírito”, salientou Getschko, ao citar vários dos pioneiros que construíram essa história, bem como as declarações de “independência” digital e do ciberespaço que dali surgiram. “É gerada uma rede de ponta a ponta, em que ninguém teoricamente deve interferir. O protocolo é agnóstico, ou seja, pela neutralidade e livre inovação.”
Ameaça ou oportunidade
Cinquenta anos depois, 5 bilhões das 7,5 bilhões de pessoas que povoam o planeta têm acesso à internet móvel ou fixa, de acordo com Leopoldo Yoshioka, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Um mundo extremamente conectado, sobretudo ante a Internet das Coisas (IoT), traz novos desafios, entre eles quanto à privacidade. “Pense em uma geladeira que pedirá, sozinha, mais cerveja. E sua balança em casa vai avisar seu médico, que decidirá cancelar a encomenda [por entender que o consumo é excessivo]”, brinca Getschko.
Yoshioka propõe uma série de reflexões: “É uma ameaça ou oportunidade? Nós, engenheiros, estamos preparados? Daqui a cinco ou dez anos teremos carros autônomos rodando pelas cidades. A fábrica da Tesla [na Califórnia, EUA] já tem nível de automação 3 ou 4 [funciona com IoT, praticamente sem mão de obra]. Já chegou o momento da singularidade [em que a inteligência artificial substitui a humana]?”
Na sua ótica, crise pode ser vista também como oportunidade. Ele avalia que este quadro não será o fim do emprego para engenheiros, mas exigirá o uso da tecnologia de forma mais eficiente.
Eduardo Mendes, presidente do Grupo MH – o qual patrocinou a atividade –, enfatizou a importância de focar a indústria 4.0 nesse contexto, que surgiu na Alemanha há cerca de seis anos. “É preciso analisar as tendências. Em 2019, segundo estudo da Gartner, havia 15 bilhões de dispositivos conectados no mundo. Em 2025 serão 75 bilhões.” Ele completou: “A indústria da construção de nuvem tem potencial astronômico. Nos Estados Unidos um data center tem 100MW. No Brasil, entre 2012 e 2013, havia aproximadamente 20-30MW no total; hoje são por volta de 150MW.” Passo importante foi dado em outubro de 2019, como contou Mendes: no período, na cidade de Vinhedo, interior de São Paulo, foi inaugurado o maior data center da América Latina. “É um investimento essencial ao desenvolvimento da indústria 4.0 e da conectividade em geral”, apontou.
Abordando a governança global e colaborativa, Nathalia Sautchuk Patrícia, assessora técnica do Comitê Gestor da Internet no Brasil, falou sobre outro desafio: o esgotamento dos endereços de IPs livres. “A capacidade estimada era de até 4 bilhões, e praticamente já se chegou a isso. Estamos num momento de transição dos protocolos. É como nos telefones celulares, em que foi preciso colocar o número nove na frente.” Questão ainda é garantir estabilidade e segurança na rede. “Um dos grandes problemas são ataques cibernéticos, que também requerem novos protocolos. É um projeto de engenharia extremamente complexo.” Também é mister enfrentar, conforme Sautchuk, desafios econômicos, com medidas antitruste; legislativos, à proteção de dados e direitos autorais; e na questão de direitos humanos, quanto à liberdade de expressão e acesso à informação, além da privacidade.
Por Soraya Misleh