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A Convenção 158: um exemplo de sua aplicação no Brasil

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      Durante a onda de privatizações nos anos 90, em especial no setor ferroviário – o qual sofreu verdadeiro desmonte, com a dispensa de milhares de trabalhadores –, uma ação civil pública tornou-se caso exemplar da aplicação da Convenção 158 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) no Brasil. Ajuizada pela Aenfer (Associa­ção de Engenheiros Ferroviários) na 18ª Junta de Conciliação e Julga­mento do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região do Rio de Janeiro, visava a readmissão de 743 empregados demitidos da Flumitrens (Empresa Ferroviária Pública Estadual) em 14 de fevereiro de 1996.
       Em primeira instância, o pedido de liminar como medida cautelar para o retorno ao trabalho foi aceito, o que foi considerado uma vitória. “Foi uma sentença revolucionária, que virou tese do Direito do Trabalho”, lembra Clarice Soraggi, presidente da Aenfer e diretora da FNE (Federação Nacional dos Engenheiros) – Regional Sudeste.
      Entre os argumentos constantes da ação, o de que as dispensas eram ilegais por descumprir o Decreto Legislativo nº 68 de 1992, que “introduziu no ordenamento jurídico pátrio o texto da Convenção 158”. Esta proí­be a demissão imotivada. Conforme funda­mentavam na peça jurídica os advogados do escritório Di Julio, Serra e Oliveira, sua ratificação no Brasil confirmava a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa. E a Flumitrens não poderia deixar de cumpri-la. No texto, o aviso: “Centenas de trabalhadores verão, da noite para o dia, suas vidas alteradas pelo desmando da ré.” Além disso, alertava para as demissões imotivadas de mão de obra qualificada para operar os trens urbanos.
       Não obstante, a companhia – integrante da administração pública indireta no Rio de Janeiro – recorreu e conseguiu ter cassada a liminar. Diante disso, como conta Soraggi, a associação encaminhou denúncia à OIT de demissão maciça no Brasil, em total inobservância à Convenção 158 da qual era signatário. À época, isso moti­vou a vinda de uma comissão da OIT para o País para investigar o caso. A diretora da FNE afirma que, enquanto esse processo tramitava, o então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, renunciou à Convenção 158, que deixou, assim, de vigorar em território nacional. “O Brasil fez essa solicitação para poder efetuar as demissões numa época de privatização dos setores.” O processo que busca­va reintegrar os ferroviários à Flumitrens foi arquivado, impossibilitando a reversão das dispensas. Não obstante o final não tenha sido feliz, a ação em questão demonstrou a força da Convenção 158 como proteção aos trabalha­dores. Tanto que o caminho encontrado teria sido invalidar sua aplicabilidade em âmbito nacional.

Nas mãos da Justiça
        Além disso, na própria ação consta um dos questionamentos que tem sido trilhado na Justiça atualmente para reverter a renúncia de FHC. Segundo constatado no texto, o decreto legislativo que incluiu no ordenamento jurídico brasileiro a Convenção 158 “é o instrumento legal hábil a convalidar e ratificar os tratados aos quais o Brasil pretende aderir, e por ser este ato da competência exclusiva do Congresso Nacional, independe da sanção ou veto por parte do Presidente da República”. A alegação tem por base a própria Carta Magna.
       Sob esse argumento, conforme divulgou o Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), até o momento três ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) votaram pela inconstitucio­nalidade da renúncia a essa conven­ção e em favor de ação ajuizada pela Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) em 1997. Para que tal volte a valer no Brasil, ainda é preciso que mais três sigam essa linha, já que ao todo são 11 os ministros do STF.
       Na análise de Antônio Augusto de Queiroz, o Toninho, diretor de documentação do Diap, a possibilidade de vitória na Justiça é real. “Os empresários vão trabalhar para não dei­xar julgar a ação, mas acredito que as chances de a Convenção 158 voltar a vigorar ainda neste ano existem, sim.” Soraggi enfatiza que para proteger seus trabalhadores, o Brasil necessita voltar a ser signatário do tratado inter­nacional. “É preciso cuidar disso.”


Soraya Misleh

 

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