Soraya Misleh
Foi o que apontou o já tradicional Seminário de Campanhas Salariais. Em sua décima segunda edição, o evento contou com aproximadamente 200 participantes, entre autoridades, negociadores do sindicato e representantes de empresas. Além disso, pôde ser acompanhado online pelo twitter e neste site (clique aqui (INSERIR LINK) para assistir o vídeo). Promovida pelo SEESP, a iniciativa, que anualmente marca a abertura das campanhas salariais, visa sedimentar o caminho do diálogo entre capital e trabalho.
Nos últimos anos, tem predominado nesse processo a conquista de aumento real, o que ocorreu em 2011 em cerca de 86% das negociações. O dado foi apresentado pelo diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Clemente Ganz Lúcio. E para 2012, o cenário é auspicioso, como demonstraram as falas de especialistas. “A situação no geral é bastante favorável”, atestou. Segundo ele, há perspectiva de crescimento econômico por duas ou três décadas e é preciso pensar as negociações coletivas contemplando-se esse horizonte. “Temos a chance histórica, inédita de transformar o País em desenvolvido.” Não significa, na sua análise, que não haja enormes problemas. “Mas o ambiente permite enfrentá-los.”
Além da questão da sustentabilidade e de se combater a desindustrialização, um dos grandes desafios explicitados por Ganz Lúcio é a “desigualdade dramática”. Na concepção do diretor do Dieese, nas campanhas salariais, uma grande responsabilidade é “retomarmos a diretriz distributiva, elemento essencial para transformar o País”. O que requer, conforme sua preleção, avançar significativamente na formulação de estratégia relativa à partilha dos ganhos de produtividade.
De acordo com Antonio Augusto de Queiroz, o Toninho, diretor do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), ao lado do quadro econômico auspicioso – com previsão de crescimento de 4,5% em 2012, o que servirá de parâmetro para a valorização do salário mínimo em 2014 –, o ambiente político também se configura positivo. Na sua visão, o estresse que se verifica deve-se ao momento que antecede as eleições municipais deste ano, não havendo uma “crise devasta quarteirão”. Inclusive os grandes projetos que o governo quer aprovar, incluindo um para combate à desindustrialização, relativo à cobrança de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) à importação, não encontram resistência. “A tendência é de um ano muito bom, com grandes lucros para as empresas e boa participação dos trabalhadores (nesses ganhos)”, acredita.
Consultor sindical do SEESP, João Guilherme Vargas Netto afirmou que um quadro que “deve iluminar nossas negociações” é a batalha pela isenção do imposto de renda cobrado sobre a PLR (participação nos lucros e resultados), abonos salariais e sobre 1/3 de adicional de férias. “É um componente de receita fabuloso. Podemos lutar por isso, há condições positivas e efetivas (para tanto).” Quanto à desindustrialização, objeto de ação unitária do movimento sindical para reverter esse panorama, “é um tema paulista por excelência”. Resvalando em diminuição de empregos, disse ele, “criou a possibilidade de uma gramática relativamente comum entre os setores trabalhista e empresarial”. Manifestação marcada para 4 de abril em São Paulo deverá, assim, contar com representantes de ambos segmentos. Ainda na avaliação de Vargas Netto, essa iniciativa conduz o patronato a “pensar um pouco diferente em relação a pagamento de salários, o que representa um ganho na batalha de ideias”.
O mesmo se dá em relação à necessidade de queda dos juros, “quase um consenso”. Ele concluiu: “Se tivermos juízo e persistirmos na rota que estamos trilhando, podemos avançar para uma democracia mais equilibrada.” Tudo isso deve permear as campanhas salariais de 2012. “A sustentabilidade e outros temas impactam diretamente nas negociações coletivas”, concordou Zilmara David de Alencar, secretária Nacional de Relações do Trabalho.
Diálogo permanente
Ponto observado por Ganz Lúcio, ainda, é a instituição de mesas de diálogo permanentes para se solucionar situações complicadas e se assegurar o trabalho decente, em especial em setores com grandes impasses, como o da construção civil. É o que defendeu Alencar, para quem as negociações devem ser perenes, não se restringir às datas-bases. “Não há condições de falar em democratização das relações do trabalho sem agregar essa necessidade.” Segundo sua ótica, as mesas permanentes devem funcionar não apenas para se dirimir conflitos, mas para preveni-los e planejar o desenvolvimento do País, pauta comum aos setores laboral e patronal. “Temos a oportunidade de reativar os avanços e construir um pacto nacional. Temos condições de figurar em todos os instrumentos a luta pela desoneração da folha de pagamento. É momento de distribuir (renda).” Otimista e enxergando o seminário como “uma injeção de ânimo” nesse processo, a secretária salientou: “Sairemos (dessas campanhas) com cláusulas que significam avanços na geração de trabalho decente, produtivo e de riquezas para o País, as quais nortearão as demais categorias.” O secretário estadual de Emprego e Relações do Trabalho, Carlos Andreu Ortiz, destacou: “Vamos tentar trabalhar de forma tripartite, em busca de soluções.”
Representantes de empresas com as quais o SEESP negocia mostraram estar de portas abertas à interlocução contínua. “O ano inteiro realizamos conversas”, constatou Walter Sigollo, superintendente de RH da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo). Ele frisou que na empresa tem havido, como resultado, um incremento nessas questões de desenvolvimento da jornada de trabalho, benefícios, salários e horários flexíveis. “Temos já coisas suficientemente importantes para o bom resultado. Obviamente podemos progredir.”
Célia Maria Dutra, superintendente de RH da Comgás (Companhia de Gás de São Paulo), enalteceu o “momento ímpar nas relações do trabalho, em que há preocupação de ambas as partes com o diálogo”. Segundo acredita ela, essa “sintonia fina” fará diferença. Negociador do Sinaenco-SP (Sindicato das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva), Carlos de Freitas Nieuwenhoff ressaltou: “São mais de 20 anos de convenções coletivas firmadas com o SEESP. Para 2012, já garantimos a data-base (1º de maio) e seremos mais um a aumentar o percentual de 86% (referindo-se ao estudo que indicou índice de empresas em que se obteve aumento real nas negociações).” Luiz Brasil Dias Runha, assessor técnico executivo do RH da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), também valorizou a boa interlocução com o sindicato, assim como o representante da Usiminas, José Manoel Santos Tavares. Na mesma linha, Rildo Martins da Silva, gerente de relações sindicais da Telefônica, lembrou que em 2011 houve uma fusão da empresa com a Vivo, e o desafio foi integrar o pessoal em um acordo coletivo único. “O SEESP conduziu esse processo de forma exemplar.” Na SPTrans (São Paulo Transporte), uma grande conquista obtida graças à ação do sindicato, ressaltada pelo seu assessor, José Borges de Carvalho Filho, foi a criação da carreira de engenheiro. “Buscamos negociações cada vez mais progressivas”, assegurou.
Gilberto Campanha, consultor de RH da Elektro, aproveitou o ensejo para lembrar a responsabilidade da categoria no desenvolvimento e capacitação profissional. Também apontou a preocupação com a qualificação a supervisora de relações trabalhistas da Embraer (Empresa Brasileira de Aeronáutica), Cristina Rodrigues. O que vai ao encontro da implementação do Isitec (Instituto Superior de Inovação e Tecnologia), apresentada durante o seminário pelo seu diretor-geral, Antonio Octaviano. “No segundo semestre, teremos um conjunto de cursos de curta duração apontando para a importância da inovação na atividade industrial. Convidamos as empresas a se associarem a essa iniciativa”, concluiu.