Em 23 de agosto último, iniciou-se um conjunto de obras com a pretensão de acabar com enchentes que prejudicam, há quase 60 anos, uma região de 12km² da cidade de Santos (a 55km da Capital paulista). Ao todo, o município ocupa 30km² da Ilha de São Vicente.
Ali, vivem, aproximadamente, 120 mil habitantes distribuídos em 14 bairros. É o projeto “Santos Novos Tempos”, que, em sua primeira parte, realizará obras de macrodrenagem na Zona Noroeste (ZN), uma ocupação iniciada na década de 1950 em área de mangue aterrado, mas sem a adequada infraestrutura e no nível mais baixo do que as marés altas. “É um novo processo de desenvolvimento sustentável para essa região”, define o engenheiro civil Márcio Lara, coordenador da Unidade de Gerenciamento do programa.
Para o prefeito santista Paulo Alexandre, a cidade está pagando uma dívida histórica para com a população daquela localidade, que sofre com os alagamentos, ou por causa da maré alta ou pelas fortes chuvas. “É uma região estratégica, relativamente nova e com grandes oportunidades de desenvolvimento econômico e inclusão social”, observa.
O programa prevê, além de obras de drenagem, a construção de habitação, urbanização e sistema viário, e deverá durar entre cinco e oito anos. O investimento total será de R$ 1,4 bilhão. Os recursos serão oriundos de fontes diversas, como orçamento municipal, Banco Mundial e governos federal e estadual.
“Santos Novos Tempos” está dividido em três fases. Na primeira, serão destinados R$ 137,5 milhões, entre recursos próprios e do Banco Mundial, e prevê a construção de comportas, estações elevatórias, galerias etc. Para a segunda, a previsão é de R$ 225 milhões – sendo R$ 180 milhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC Drenagem) e o restante da Prefeitura –, cujo contrato de dragagem do Rio São Jorge já foi assinado e realizada audiência pública para licitação das obras de drenagem, que devem começar no primeiro semestre de 2014. A última fase, estimada em R$ 200 milhões, ainda está em processo de captação de recursos e abrangerá a construção de moradias, urbanização e implantação de novo sistema viário.
Segundo Lara, é o maior empreendimento de macrodrenagem urbana em curso no Brasil e o segundo maior contrato do PAC do setor – o primeiro é o da transposição do Rio São Francisco. A ação demandou, entre outras ações, nove autorizações ambientais e até verificação arqueológica. Intervenções foram realizadas em governos anteriores para acabar com o problema, mas não com a abrangência do trabalho atual.
Saturnino de Brito, inspirador
O coordenador garante que a iniciativa é definitiva, transformadora. Na sua ótica, de certa forma, repete as premissas do programa de saneamento que o engenheiro Saturnino de Brito desenvolveu, na virada do século XIX para o XX, na zona intermediária e na orla santista. “Projeto tão bem-sucedido que, 100 anos depois, os canais funcionam perfeitamente e foi responsável pela possibilidade de ocupação, com qualidade de vida, nesses lugares”, explica.
Bem diferente do que ocorreu na ocupação da ZN. Por isso, hoje, os alagamentos geram uma série de problemas, como a dificuldade de acesso a Santos de quem utiliza o Sistema Anchieta-Imigrantes e a falta de ligação da Zona Noroeste com outras partes do município.
Lara destaca que são obras inovadoras, com a implantação de comportas nas saídas dos canais junto à foz de dois rios – São Jorge e Bugres –, com estações elevatórias e comportas em posições intermediárias. O sistema funcionará com sensores inteligentes, independentemente de comando de pessoas ou de uma central. “Quando a maré alta ocorrer, as comportas automaticamente serão fechadas e quando coincidir com chuvas fortes, as estações bombearão as águas do interior dos bairros para o estuário”, detalha.
À sua durabilidade, as comportas e as guias serão todas em aço inox. Foram planejadas grades nas comportas para evitar que lixos travem o equipamento. As bombas das estações elevatórias serão a diesel para garantir o seu funcionamento mesmo na pior tormenta, quando a energia elétrica pode ter oscilação. “Tudo foi feito de acordo com a orientação do Banco Mundial e tem a supervisão da Caixa Econômica Federal e do Ministério das Cidades”, observa o engenheiro.
Sobre as soluções de habitação, de urbanização e de interesse social, Lara afirma que essa não é uma obra de concreto, mas uma intervenção destinada às pessoas. “Vemos nesse projeto o papel social da engenharia”, ressalta.
A equipe envolvida é multidisciplinar, com engenheiros de diversas modalidades, arquitetos, urbanistas, advogados, assistentes sociais. Ao final, a região da Zona Noroeste contará com os seguintes componentes de macrodrenagem: 13 comportas, 14 estações elevatórias, dois canais, quatro galerias, um reservatório de retenção, duas torres de carga e o desassoreamento do Rio São Jorge, que ganhará profundidade de três metros – atualmente está com apenas 40 centímetros –, para auxiliar no escoamento de águas pluviais.
Por Rosângela Ribeiro Gil