Soraya Misleh
Garantir formação de mão de obra qualificada para que o País absorva a tecnologia que deve advir com o TAV (Trem de Alta Velocidade) e desenvolvimento socioeconômico das regiões incluídas em seu traçado. Essas são algumas das premências com a implantação de tal inovação em âmbito nacional, levantadas por técnicos durante seminário intitulado “O TAV e a engenharia nacional”, que reuniu aproximadamente 250 participantes.
Realizada pelo SEESP, por intermédio do Comitê Temático “Cidade em Movimento”, do seu Conselho Tecnológico Estadual, no último dia 9 de setembro, na sede da entidade, na Capital paulista, a iniciativa contou com o apoio da FNE (Federação Nacional dos Engenheiros). Teve por objetivo discutir os aspectos técnicos, econômicos, financeiros, a transferência de tecnologia, formação e capacitação de profissionais para atender a adoção do TAV no País – cujo investimento previsto é de R$ 33,1 bilhões e a entrada em funcionamento deve ocorrer em 2016.
Hélio França, superintendente executivo da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), apresentou à oportunidade as análises feitas que levaram à decisão de investir na inovação para o eixo Rio de Janeiro-São Paulo-Campinas – cuja distância de 510,8km seria feita em 2h27 a uma velocidade média de 209km/h. Segundo ele, a ligação entre as duas capitais por trem de alta velocidade vem sendo objeto de estudos desde os anos 80. O atual culminou no lançamento do edital de licitação em 14 de julho último. Entre as conclusões, a de que o trecho é dos mais atrativos à implantação. Os dois estados abrigam 30% da população brasileira e 45,5% do seu PIB (Produto Interno Bruto). “O fluxo anual de passageiros é da ordem de 33 milhões, e a maioria das pessoas viaja por motivo de trabalho, portanto, tem necessidade de se deslocar e capacidade de renda.” Assim, estaria assegurada a demanda para o TAV, cujo volume anual estimado giraria em torno de 18 milhões, com projeção de esse público se ampliar progressivamente.
Além desses aspectos, ele indicou como vantagens à construção do TAV o fato de esse ocupar menos área que uma rodovia – 15m de largura ante 28m; resultar em menor emissão de CO2 e consumo de energia por passageiro transportado; a pontualidade e agilidade do sistema; a absorção de tecnologia, geração de emprego e desenvolvimento regional. França procurou ainda desmistificar certos pontos, como o de que o trem de alta velocidade não seria prioritário. Na sua concepção, é uma alternativa ao principal corredor de transporte do País, cujos sistemas rodoviário e aeroviário apresentam “sinais de saturação”. Quanto ao questionamento de que o recurso poderia ser investido em metrôs, ele acredita que tais inversões não são concorrentes.
Referencial
Se não competem, deveriam ser complementares, na opinião de Emiliano Afonso Neto, diretor do SEESP e membro do Conselho Tecnológico desse sindicato. Na sua ótica, a integração do TAV com o transporte urbano nos destinos por onde deve passar é um dos desafios ao qual é preciso fazer frente. E os estudos falharam nesse aspecto.
O coordenador do Comitê Temático e também diretor desse sindicato, Edilson Reis, destacou a importância de os governos locais investirem nisso. Salientou também outras preocupações e expectativas dos técnicos com o projeto. Entre elas, que seja um referencial a novos avanços, propiciando ao País atingir patamar mais elevado de modernidade e desenvolvimento e servindo como indutor à recuperação, revitalização e ampliação da malha ferroviária convencional. E que a União, “por meio de convênios de cooperação técnica, dê incentivos para que as empresas nacionais e as instituições invistam em pesquisa e desenvolvimento”. E ainda, que a academia garanta a necessária mão de obra capacitada para atuar no setor metroferroviário.
Para o coordenador do Conselho Tecnológico Estadual do SEESP e diretor da Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo), a questão da formação é fundamental, nesse caso sobretudo de doutores. “Em 2008, foram apenas 10.700, dos quais 1.500 em engenharia, ou seja, aproximadamente 50 por milhão de habitantes. Na Alemanha, são 300; no Japão, 120.” Ele concluiu: “Se não mudarmos isso, não teremos condição de absorver a tecnologia e vai acontecer com o TAV o mesmo que ocorre na Marinha e no setor aeroviário. Temos fábricas de aviões e navios, mas não os projetamos. Devemos quebrar esse paradigma para que a gente deixe de ser mestre de obras do planeta.” (clique aqui para ler artigo sobre o tema) Roberto Spínola Barbosa, do Departamento de Engenharia Mecânica da Poli-USP, ressaltou que a academia tem contribuição a dar nesse processo.
Ainda na oportunidade, foi apresentada por Cyro de Laurenza, diretor do Sinaenco (Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva); e Vicente Abate, presidente do Simefre/Abifer (Sindicato Interestadual da Indústria de Materiais Ferroviários e Rodoviários / Associação Brasileira da Indústria Ferroviária), a visão da iniciativa privada acerca do tema. O último defendeu a implantação do TAV ao desenvolvimento do setor, destacando que “o Brasil não pode mais prescindir do transporte ferroviário”. Já Laurenza enfatizou a competência dos profissionais da engenharia e arquitetura consultiva brasileira para atuar no projeto.