Sob chuva de papel picado e com vivas à democracia, o Congresso Nacional aprovou, na madrugada desta quinta-feira (21/11), o Projeto de Resolução 4/2013, que anula a sessão de 1964 na qual foi declarada vaga a Presidência da República, então ocupada por João Goulart (1919-1976). A sessão anulada, protagonizada pelo então presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, ocorreu na madrugada de 1° para 2 de abril, quando Jango se encontrava no Rio Grande do Sul, e abriu caminho para a instalação do regime militar, que durou até 1985.
Os senadores Pedro Simon (PMDB-RS) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), autores do projeto, argumentaram que a declaração de vacância da Presidência foi inconstitucional, porque a perda do cargo só se daria em caso de viagem internacional sem autorização do Congresso, e o presidente João Goulart se encontrava em local conhecido e dentro do país. “Eu estava com ele, em Porto Alegre”, disse, emocionado, Pedro Simon, ao relatar os acontecimentos dramáticos relacionados à deposição de Jango.
Simon exaltou a coragem e a responsabilidade de Jango ante a possibilidade de uma guerra civil e até de uma intervenção norte-americana. “O momento é histórico. Este Congresso restabeleceu a verdade histórica. Viva o presidente João Goulart! - disse o senador, que classificou a sessão de 1964 de “estúpida”, “ridícula” e “imoral”. Ele sublinhou que aprovação da proposta reconstitui a verdade para o povo brasileiro e permite que a história seja ensinada de maneira diferente nas escolas e universidades.”
Após o início do golpe de Estado, em 31 de março de 1964, o presidente João Goulart decidiu ir a Porto Alegre a fim de encontrar aliados políticos e estudar como poderia resistir ao golpe de Estado. Foi nesse período que o então presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, declarou vaga a Presidência da República.
"Em poucos minutos, sem discussão, Jango foi usurpado do cargo de presidente da República, num ato unilateral do então presidente do Congresso Nacional, Senador Auro de Moura Andrade", argumentam no texto Pedro Simon e Randolfe Rodrigues.
Randolfe Rodrigues lembrou que vários parlamentares, como o então deputado Tancredo Neves (1910-1985), se manifestaram à época contra a decisão, por meio de questões de ordem. Randolfe afirmou que o país precisa reparar as “manchas no passado” para engrandecer a democracia.
A aprovação do projeto, segundo os senadores, mostra que o Congresso, passados 49 anos do Golpe de 1964, não se mantém curvado às circunstâncias que levaram ao regime militar e repudia a contribuição ao golpe dada pela Casa no passado. Para eles, trata-se de um “resgate da história e da verdade”, uma correção, ainda que tardia, de “uma vergonha histórica para o Poder Legislativo brasileiro”.
Isolado
O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) foi o único a se manifestar contrariamente à proposta. Ele tentou derrubar a votação, com questões de ordem, destacou que a destituição de João Goulart teve apoio, não só das Forças Armadas, mas de amplos setores da sociedade, e ainda da Igreja Católica, da Organização dos Advogados do Brasil (OAB), da imprensa e afirmou que a tentativa de apagar o passado é um ato “infantil” e “stalinista”.
A votação da proposta estava prevista para a noite de terça-feira (19), mas foi adiada devido ao pedido de verificação de quórum feito pelo próprio deputado Jair Bolsonaro. Na sessão desta quarta (20), o deputado voltou a pedir a verificação, mas teve o pedido negado pelo presidente do Congresso, Renan Calheiros.
Exumação
A anulação da sessão que tirou Jango da Presidência ocorre no momento em que peritos da Polícia Federal examinam os restos mortais do ex-presidente, na tentativa de descobrir se ele foi ou não assassinado. A suspeita surgiu depois de declarações de um ex-agente da repressão da ditadura uruguaia, segundo o qual Jango teria sido envenenado. A exumação, feita a pedido da família, ocorreu na última quarta-feira (13) e os restos mortais chegaram a Brasília na quinta-feira (14), onde foram recebidos com honras de Estado.
Fonte: Com informação da Agência Senado