Soraya Misleh*
Boas práticas de reciclagem de resíduos sólidos, consumo responsável de água, eficiência energética, sustentabilidade no transporte urbano, descobertas na era espacial e sua importância à preservação do meio. Esses foram alguns dos temas abordados durante o V EcoSP (Encontro Ambiental de São Paulo), realizado entre 3 e 5 de novembro, no Parque Anhembi, na Capital paulista. Promovido pelo SEESP e FNE (Federação Nacional dos Engenheiros), contou com o apoio, entre outros, da CNTU (Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados) e do Confea (Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia).
As plenárias técnicas tiveram lugar no auditório Elis Regina, paralelamente a exposição de produtos ecologicamente corretos e serviços. Nos três dias, circularam pelo local cerca de 800 pessoas, entre profissionais, estudantes de diversas partes do Estado e interessados em geral.
À abertura, o vice-presidente do sindicato paulista e coordenador da iniciativa, Carlos Alberto Guimarães Garcez, pontuou que o objetivo central do EcoSP “é levar a mais pessoas as boas práticas ambientais”. Lembrando a origem do evento, que nasceu em Taubaté como Ecovale e depois expandiu-se para a discussão em âmbito estadual, o presidente do SEESP e da FNE, Murilo Pinheiro, enfatizou: “Temos a certeza de estar no caminho correto, trabalhando para reforçar o compromisso dos engenheiros com a qualidade de vida da população.” A iniciativa integra, nesse sentido, o projeto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento” – lançado pela federação, que propugna por uma plataforma nacional de desenvolvimento sustentável.
O diálogo entre a temática do V EcoSP e a Rio + 20, que acontecerá em junho de 2012 no Rio de Janeiro, foi ressaltado pelo presidente do Confea, Marcos Túlio de Melo. “Propostas tiradas aqui devem ser levadas à conferência no ano que vem”, defendeu. Participaram ainda da cerimônia o deputado federal Paulo Teixeira (PT/SP), o secretário adjunto de Saneamento e Recursos Hídricos do Estado de São Paulo, Rogério Menezes, o diretor-geral do Isitec (Instituto Superior de Inovação e Tecnologia), Roberto Lobo, e o presidente da VDI-Brasil (Associação de Engenheiros Brasil-Alemanha), Edgar Horny. O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, também passou pelo local.
Projetos para o Estado e País
A sustentabilidade no transporte urbano foi o tema inaugural do encontro. O palestrante, Ivan Carlos Regina, gerente de planejamento da EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo), apresentou iniciativas ambientais da empresa para diminuir a emissão de poluentes na atmosfera. Entre elas, os projetos dos ônibus movidos a células a combustível de hidrogênio e a etanol.
A preocupação em garantir saneamento ambiental para a melhoria da qualidade de vida da população também esteve na pauta durante o EcoSP. Sobre o assunto, Wanderley da Silva Paganini, da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), discorreu sobre projetos para o Estado, e Márcio Correia Ribeiro, do Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica), falou acerca do Programa Água Limpa. Com investimentos de R$ 616,06 milhões financiados pelo Governo do Estado a cidades a fundo perdido, dos quais R$ 98 milhões já aplicados em obras concluídas, este último deve beneficiar, asseverou o representante do órgão, 3,1 milhões de habitantes quando finalizado, em 2017. O universo corresponde a 280 municípios paulistas não operados pela Sabesp, em que estão projetadas ou em desenvolvimento ações para assegurar sobretudo coleta e tratamento de esgoto. Em sua apresentação, o quadro que o programa tenta reverter, pelo menos localmente: sete crianças morrem diariamente no País, vítimas de diarreia, e mais de 700 mil pessoas são internadas por falta desses serviços. “O acesso ao saneamento reduz em 36% essas incidências”, atestou Ribeiro, para quem os engenheiros são peça-chave para tocar essa iniciativa.
Ainda sobre recursos hídricos, Claudete Canada, doutoranda na área pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), abordou a cobrança pelo uso da água como alternativa para melhor conservação e gestão, bem como para se garantir recursos à preservação do meio. A cobrança, de acordo com a especialista, está prevista nas políticas paulista e nacional de recursos hídricos e vai se expandir no País.
Boas práticas
Água foi também o tema de Letycia Janot, da Iter Consultoria e do Sinesp (Sindicato dos Nutricionistas do Estado de São Paulo). Ela falou sobre o projeto “Água na Jarra”, da ONG Igtiba, da qual é uma das sócias-fundadoras. Estímulo à boa prática de se consumir água filtrada em detrimento da engarrafada, a iniciativa já vem sendo adotada, segundo sua explanação, por 14 restaurantes no Estado.
Na linha de incentivo às boas práticas, o engenheiro Orlando Oliveira, responsável pela área de cosméticos da empresa Henkel, filiada à VDI-Brasil, abordou os projetos da companhia que visam a conscientização e educação ambiental. Entre eles, a promoção há dez anos de um desfile de moda com materiais recicláveis, que envolve colaboradores da empresa e alunos sobretudo de escolas públicas próximas a uma de suas unidades no Brasil.
Sob essa perspectiva, César Faccio, da Anip (Associação Nacional da Indústria Pneumática), destacou que desde 1999 essa entidade possui, em parceria com setores público e privado, um programa para coletar e destinar corretamente os pneus inservíveis, atendendo à Resolução nº 258/99 do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente). Segundo ele, desde seu início até setembro de 2011, foram coletadas e destinadas 1,8 milhão de toneladas do material no País. De acordo com sua apresentação, o pneu pode ser reaproveitado de diversas formas, como por exemplo combustível, na fabricação de asfalto borracha ou ecológico, solados de sapato, em borrachas de vedação, dutos pluviais, pisos para quadras poliesportivas e industriais e tapetes para automóveis. Entre os gargalos do setor, Faccio destacou a falta de incentivo governamental.
Soluções técnicas
Outro tema fundamental quando se fala em preservação ambiental, a eficiência energética foi abordada por Paulo Roberto dos Santos, doutorando pela Unicamp. Destacando sua importância, já que o consumo atual de energia – em constante ascensão – vai dobrar até 2030, ele explanou sobre o assunto a partir de estudo de caso sobre os “impactos do uso solar para o aquecimento de água em novos conjuntos habitacionais populares no Brasil”. A análise foi feita com base em projeção feita caso as 1 milhão de moradias prometidas pelo governo federal na primeira fase do programa “Minha casa, minha vida” utilizassem aquecedor solar em lugar de chuveiro elétrico. Uma das conclusões é que a redução de picos de consumo seria imensa.
O chuveiro elétrico, “uma invenção brasileira”, presente em aproximadamente 73% dos domicílios no País, representa cerca de 25% da conta de energia nas residências. Como faltam incentivos governamentais ao uso de aquecedores solares e seus custos inicial e de instalação não são tão vantajosos – além de a eficiência depender da temperatura ambiente –, a utilização híbrida seria, na sua concepção, a saída.
O EcoSP também trouxe ao debate soluções técnicas que permitam reduzir o volume gerado e valorizar os resíduos da arborização urbana. Esse foi o foco da palestra ministrada pela professora Adriana Nolasco, do Departamento de Ciências Florestais da Esalq/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo), que apontou: “Em São Paulo, a estimativa de geração de resíduos da arborização urbana é de cerca de 4 mil toneladas por mês.” Conforme ela, as prefeituras são responsáveis pela destinação e enfrentam limitações como falta de recursos financeiros e de profissionais capacitados. Nesse contexto, Nolasco concluiu: “É fundamental que a solução seja baseada em ações planejadas, coordenadas e integradas.”
Foram ainda abordados no encontro um novo paradigma nos estudos da ecologia, por Antonio Ferreira de Carvalho Jr., autor da obra “Ecologia profunda ou ambientalismo superficial”; a neutralização de gases do efeito estufa, a recuperação de áreas degradadas e o mercado de crédito de carbono, por Heloisa Candia Hollnagel, da agência ambiental Pick-upau; e “A maior descoberta da era espacial: a Terra”, pelo professor José Bezerra Pessoa Filho, do IAE/CTA (Instituto de Aeronáutica e Espaço/Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial).
Ao encerramento, um show do artista João Bosco, que também é engenheiro, no velho estilo do banquinho e violão. Confira aqui cobertura completa.
* Com a colaboração de Lucélia Barbosa e Rita Casaro