Luis Nassif*
O anúncio de venda da Eletrobras para fazer caixa é uma das iniciativas mais aberrantes do governo Temer. A ideia da “democratização do capital” e a comparação com a Vale e a Embraer é esdrúxula. Ambas estão na economia competitiva enquanto a Eletrobrás é uma concessionária de serviços públicos, estratégica para o país.
A avaliação de R$ 20 bilhões equivale a menos da metade de uma usina como Belo Monte. A Eletrobras tem 47 usinas hidroelétricas, 114 térmicas e 69 eólicas, com capacidade de 47.000MW, o que a faz provavelmente a maior geradora de energia elétrica do planeta. É uma empresa tão estratégica quanto a Petrobras.
A Eletrobras está sendo construída desde 1953 e exigiu investimentos calculados em R$ 400 bilhões do povo brasileiro. Além da capacidade geradora, que equivale a meia Itaipu, a Eletrobras controla linhas de transmissão, seis distribuidoras e a Eletronuclear, empresa estratégica que detém as únicas usinas nucleares brasileiras.
O modelo elétrico brasileiro é uma obra de engenharia fantástica, resultado do pensamento estratégico de especialistas como Octávio Marcondes Ferraz, Mário Thibau, Mário Bhering, um conjunto de técnicos da Cemig – que também corre risco idêntico.
No governo Fernando Henrique Cardoso, o desmonte irresponsável desse modelo promoveu um encarecimento brutal das tarifas, que acabou tirando a competitividade brasileira em vários setores eletrointensivos. Lá, como agora, moviam-se exclusivamente por visão ideológica, sem um pingo de preocupação com a lógica de um sistema integrado.
O comprador, com toda probabilidade, será um grupo chinês que por R$ 20 bilhões assumirá o provavelmente maior parque de geração hidroelétrica do planeta. É realmente inacreditável o nível de improvisação, cegueira estratégica, leviandade suspeita atrás desse tipo de decisão de quebra-galho financeiro.
Nos EUA, o parque hidroelétrico, que corresponde a 15% da matriz energética, é estatal federal, porque lá se acredita que energia elétrica, que recursos hídricos são de interesse nacional e não podem ser privados. Lá há muito cuidado com água, rios e represas e nunca se pensou em privatizar.
A ideia de privatizar estava óbvia quando a rainha das privatizações da era FHC, Elena Landau, foi colocada como presidente do Conselho da empresa. Há um mês pediu demissão para não ficar evidente demais sua presença com o anúncio da privatização, ligando a lembranças de sua atuação no governo tucano.
Para completar o pesadelo, o ministro de Minas e Energia é um rapaz de 33 anos, formado em administração de empresas pela Faap [Fundação Armando Álvares Penteado], sem qualquer especialização na área e representando o histórico Partido Socialista Brasileiro, de ilustres nomes como João Mangabeira, que deve estar se revirando na tumba com tal iniciativa por um “socialista” pernambucano.
* Jornalista. É editor do blog GGN