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Formar mais e melhores engenheiros ao desenvolvimento

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Jéssica Silva

 

O número de concluintes dos cursos de graduação na área no Brasil está em queda desde 2018 – quando atingiu mais de 128 mil formados. Em 2023, conforme levantamento feito pela Mira Pesquisa para o SEESP com dados do Censo da Educação Superior do mesmo ano, foram apenas 95.607 novos engenheiros. Muito aquém do necessário para a demanda nacional, de acordo com os especialistas ouvidos pelo Jornal do Engenheiro.

 

O País precisa “no mínimo dobrar o número de formados, [saltando para] algo como 200 mil engenheiros por ano”, defende o coordenador do Conselho Tecnológico do SEESP e professor titular da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), José Roberto Cardoso. Para ele, urge, ainda, “ampliar a participação da mulher na profissão”, que representa apenas 27% dos concluintes. 

 

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Na avaliação de Cardoso, a queda no interesse pela profissão acompanhou período de crise econômica e de encolhimento da indústria nacional, o que, consequentemente, reduziu as oportunidades na área. De 2017 a 2019, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro ficou em torno de 1%. A pandemia de Covid-19, iniciada em 2020, aprofundou a crise, mas já no ano anterior o número de empresas industriais no País apresentava queda de 8,5%, reduzindo postos de trabalho principalmente na indústria de transformação, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Passamos a ser um país de serviços, onde não se produz nada, com praticamente tudo vindo de fora; isso tira o emprego do engenheiro”, ele observa.

 

Iniciativas o Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Nova Indústria Brasil (NIB), com investimentos previstos na casa de R$ 1,8 trilhão e R$ 300 bilhões respectivamente, impulsionam a retomada e já apresentam estimativas positivas. Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), em setores como tecnologia, energia renovável e infraestrutura, evidencia-se escassez de profissionais qualificados.

 

Para atender essa demanda, o País precisa de 130 mil engenheiros nos próximos três anos, de acordo com Mapa do Trabalho Industrial 2025-2027, desenvolvido pelo Observatório Nacional da Indústria. O número engloba modalidades como Engenharia Civil, de Produção, Qualidade e Segurança, Elétrica, Eletrônica, Mecânica, Química, Ambiental, de Minas, Metalúrgica, de Materiais, Alimentos, Cartográfica e de Agrimensura.

 

“É urgente agir para garantir os engenheiros necessários ao desenvolvimento nacional”, destaca o presidente do SEESP, Murilo Pinheiro. Em 23 de janeiro último, o sindicato participou de reunião com o diretor da Poli-USP, Reinaldo Giudici, para falar sobre o ensino de engenharia, evasão dos universitários e como impulsionar o interesse pela carreira, entre outros temas.

Cardoso MuriloJosé Roberto Cardoso (à esquerda) e Murilo Pinheiro. Fotos: Beatriz Arruda 

Murilo enfatiza: “A visão na educação em engenharia deve englobar quantidade, qualidade e empregabilidade dos concluintes. A tarefa, que é de interesse de toda a sociedade, cabe às escolas, às empresas, às entidades de classe e ao poder público.”  

 

Cenário global

 

Segundo o secretário geral da Federação Internacional de Sociedades de Educação em Engenharia (International Federation of Engineering Education Societies – IFEES), Hans Jurgen Hoyer, o mundo precisa e exige mais engenheiros devido ao rápido avanço tecnológico, à indústria 4.0, para as necessidades de infraestruturas nos países em desenvolvimento e os desafios que envolve a mitigação da crise climática.

 

Ele observa que países como a China e a Índia “têm formado significativamente mais profissionais na área do que os países ocidentais”. Um estudo do Conselho Nacional de Ciência dos Estados Unidos mostra que no período pós-pandemia houve queda no desempenho de matemática entre os estudantes do ensino regular – o que impacta diretamente no ingresso às áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM, na sigla em inglês de science, technology, engineering, and mathematics).

 

O interesse nos campos mais tradicionais da engenharia, Hoyer avalia, tem migrado para modalidades como engenharia de software e ciência da computação. Para o reitor do Centro Universitário do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT), Marcello Nitz, a profissão precisa recuperar a atratividade. “Não é algo só no Brasil. Espanha, Colômbia e muitos outros países têm o mesmo cenário de desinteresse por parte dos jovens”, aponta.

 

Qualidade do ensino

 

Além de fatores econômicos que impactam o mercado de trabalho, decisivo na hora de escolher uma profissão, Nitz critica a obsolescência da graduação e a competição com outras possibilidades de carreira. “Um curso típico de engenharia é muito exigente. E a carreira, lá na frente, nem sempre é valorizada, o engenheiro não é [contratado como] engenheiro, é analista. Isso causa um rebote na sociedade”, externa o reitor.

 

Tal questão foi crucial nas discussões que resultaram nas novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) do Curso de Graduação em Engenharia, publicadas pelo Ministério da Educação (MEC) em 2019. A nova grade curricular torna o ensino mais dinâmico e conectado ao mundo real, o que é essencial na visão dos especialistas. Mas a avaliação desse novo sistema ainda não foi gerada.

 

Hans Nitz AdrianaDa esquerda para direita: Hans Jurgen Hoyer, Marcello Nitz e Adriana Maria Tonini.
Fotos: acervo pessoal
De acordo com a Associação Brasileira de Educação em Engenharia (Abenge), os critérios de avaliação dos cursos considerando as novas DCN foram definidos em 2024 por uma comissão encabeçada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). “Esses critérios serão abertos para consulta pública ainda no início deste ano e, em seguida, serão submetidos à homologação do MEC”, explica a presidente da Abenge, Adriana Maria Tonini.

 

O professor Cardoso frisa que, sem os critérios de avaliação, não é possível garantir que todas as escolas de engenharia sigam as diretrizes. “Temos uma estimativa de que apenas 25% dos engenheiros que concluem o curso atualmente têm boa formação”, ele diz. Nesse sentido, não basta aumentar o número de ingressantes e concluintes, é preciso igualmente atuar para a melhoria na qualidade dos cursos.

 

“As instituições precisam revisar e atualizar seus currículos, tornando-os mais alinhados com as demandas do mercado de trabalho e as necessidades contemporâneas da profissão. Essa adequação é fundamental para garantir que os futuros engenheiros estejam preparados para enfrentar os desafios do mundo atual”, frisa Tonini.

 

O contato com a prática desde o início do curso de engenharia – presente nas novas DCN – faz a diferença na empregabilidade e capacidade do profissional. “O aluno tem que perceber onde ele aplica o conhecimento dele, reconhecer-se como protagonista das soluções para os problemas”, avalia Roseli de Deus Lopes, professora titular da Poli-USP na área de Educação em Engenharia.

 

Leia também: A prática no cerne do ensino de engenharia

 

Hoyer ainda destaca que, em todo o mundo, o ensino moderno de engenharia deve ter ênfase em competências interdisciplinares, em áreas como economia, psicologia, línguas, arte, ciências sociais e empreendedorismo, para além das demandas atuais dos avanços tecnológicos e emergência climática.

 

“É colocar o engenheiro como um agente importante de transformação da sociedade. A engenharia ganha muito incorporando esse aspecto mais humanizado, pois com isso virão pessoas engajadas, que vão ter um senso de pertencimento maior em relação ao curso, em relação à profissão”, ratifica Nitz.

 

De olho na juventude

 

Para professora Lopes, que é também coordenadora da Feira Brasileira de Ciência e Engenharia (Febrace), é preciso ter “mais movimentos que leve um esclarecimento do que é a engenharia para alunos da educação básica”.

 

Ela afirma que juventude tem “fugido” de carreiras tradicionais, buscando aquelas que trazem retorno financeiro mais rapidamente. “Essa geração é diferente, se você falar para eles que só depois de cinco anos, no mínimo, depois de Cálculo 1, 2 e 3 é que eles vão descobrir o que fazer, eles já perdem o interesse”, revela.

 

Roseli MônicaRoseli de Deus Lopes (à esquerda) e Mônica Vargas.
Fotos: acervo pessoal / Reinaldo Canato
Essa falta de interesse, aponta a superintendente nacional de Operações e Atendimento do Centro de Integração Empresa Escola (Ciee), Mônica Vargas, vem desde a educação básica, “pelas matérias relacionadas às ciências exatas, o que reflete no ingresso no ensino superior”. Segundo ela, o Ciee, que há mais de 60 anos atua na promoção de oportunidades para jovens no mercado de trabalho, diagnosticou um “apagão” de mão de obra nas áreas tecnológicas e de engenharia.

 

Por isso, a entidade promoveu um encontro, em novembro último, com grandes escolas como Universidade Presbiteriana Mackenzie, Centro Universitário FEI, IMT e a Poli-USP, além do Instituto de Engenharia, e colocou o tema em debate, chegando à conclusão da necessária aproximação da academia e empresas com o ensino regular.

 

Ao longo de 2025, a superintendente conta que serão engendradas ações como fóruns e palestras, por meio do grupo de trabalho formado por reitores e professores das instituições de ensino. “Nosso papel é fazer movimentos que possam mudar esse cenário”, ela afima.

 

De acordo com Vargas, é preciso desmistificar que a engenharia se resume a apenas à matemática. “Claro que teremos cálculos, mas a própria matemática, assim como a engenharia, deve ser relacionada à solução de problemas. Escolher a profissão de engenheiro é escolher ser um solucionador de problemas”, ela pontua.

 

Há mais de 20 anos a Febrace atua no estímulo da cultura científica, a inovação e o empreendedorismo em jovens e educadores da educação básica e técnica do Brasil. “Os alunos do ensino médio são provocados a desenvolverem projetos de verdade, que vão gerar conhecimento, que se proponha solucionar um problema de verdade. Ali ele vai aplicar métodos, ter contato com a engenharia. Ele percebe a importância do conhecimento”, ela explica.

 

Reunir esforços para que os jovens vejam o propósito da profissão, que faz diferença na vida das pessoas, é substancial para se formar mais e melhores engenheiros. “A gente precisa se ajudar mais, juntar escolas, sindicato, conselho, empresas. A boa engenharia é fundamental para o desenvolvimento econômico, social de qualquer país”, defende Lopes.

 

 

 

 

 

 

 

 

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